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Tragédia de Brumadinho poderia ter sido evitada, segundo ANM, que emitiu 24 autuações à Vale

 

Parecer diz que Vale prestou informação errada sobre dreno da barragem da Mina do Córrego do Feijão em Brumadinho

 

Lama em Brumadinho
Lama em Brumadinho. Foto: Presidência da República/Divulgação

 

O rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão em Brumadinho (MG), ocorrido em 25 de janeiro, poderia ter tido outro desfecho caso a mineradora Vale tivesse prestado informações corretas sobre a situação da barragem à Agência Nacional de Mineração (ANM).

ABr

O rompimento da barragem causou inundação de lama e rejeitos de minério de ferro que resultou na morte de 252 pessoas. Dezoito pessoas continuam desaparecidas nove meses após o acidente.

“Algumas informações fornecidas pela empresa Vale S.A. à ANM não condizem com as que constam nos documentos internos da mineradora. Se a ANM tivesse sido informada corretamente, poderia ter tomado medidas cautelares e cobrado ações emergenciais da empresa, o que poderia evitar o desastre”, descreve nota da agência reguladora distribuída a empresa.

Na semana passada, a ANM finalizou parecer técnico sobre o desastre onde aponta “omissões” da Vale, “inconsistências” e “discrepâncias” de informações que deveriam ter sido reportadas ao Sistema de Integrado de Gestão de Segurança de Barragens de Mineração (SIGBM).

Informação não reportada

Um dos pontos enfatizados pela ANM foi a decisão da Vale de usar em junho de 2018 drenos horizontais profundos (DHP) para controlar o nível de água que pressionava a barragem. “Consta de relatório interno da Vale que, durante a instalação de um dos DHPs, foi detectada a presença de sólidos, o que é considerado anormal”, assinala nota da ANM.

“Quando se constatou que havia sedimento na água drenada imediatamente teria de ser reportado ao órgão regulador. A partir dessa constatação são tomadas as providencias técnicas”, destaca o geólogo Victor Hugo Froner Bicca, diretor-geral da ANM, o mesmo posto que ocupava no extinto Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

De acordo com o diretor, “o primeiro ato [da Vale] deveria ser comunicar a agência, o órgão regulador, e depois adotar providências que a técnica recomenda”. Segundo ele, a informação teria determinado a “instauração de um regime de inspeção diária” na barragem.

Em outro DHP, a ficha de inspeção em campo da Vale minimizou o “problema de percolação”, passagem de água pelo dreno. No reporte quinzenal que as normas minerais exigem, a Vale deveria ter assinalado nível 10 e não nível 6, quanto maior a pontuação maior a gravidade e “potencial comprometimento da segurança da estrutura”, conforme nota da agência reguladora.

A ANM aponta que “se a Vale tivesse marcado nível 10, automaticamente a barragem subiria de categoria de risco e seria prioridade de inspeção. Além disso, exigiria que a mineradora fizesse inspeção diária, com envio de reporte à ANM todos os dias. A mineradora nunca reportou nada sobre a falha.”

Se a Vale tivesse reportado o nível 10 automaticamente a ANM receberia e-mail disparado pelo SIGBM através do algoritmo de inteligência. Apesar de assinalar o erro, Froner Bicca evita dizer que a mineradora mentiu.

“Existe uma categórica temporal com a qual a gente não pode dizer se houve mentira ou não”, pondera. “O que é verificável é que: em havendo sedimento na água imediatamente deveria ter sido comunicado ao órgão regulador”, ressalta. “A gente precisa detalhar, refinar as informações para chegar efetivamente a uma conclusão desta natureza. Coisa que talvez a Polícia [Federal] e o próprio Ministério Publico tenham mais elementos para afirmar isso”. O parecer será encaminhado à Polícia Federal, à Controladoria-Geral da União (CGU), ao Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério Público Federal (MPF).

A Polícia Federal indiciou por falsidade ideológica e uso de documentos falsos sete funcionários da mineradora Vale e seis da consultoria alemã Tüv Süd, consultora responsável por laudos de segurança.

Por e-mail, a mineradora Vale informou à reportagem que “vai analisar a íntegra do relatório” e que “no momento, não tem como comentar as decisões técnicas tomadas pela equipe de geotécnicos à época”. A companhia também afirma que no momento do acidente “tinha uma equipe de geotécnicos composta por profissionais altamente experientes e de reconhecida capacitação para tratar de questões referentes à manutenção da barragem”.

Na mensagem encaminhada, a mineradora enfatiza que “todas as informações disponíveis sobre o histórico do estado de conservação da barragem foram fornecidas às autoridades que apuram o caso”; reforça que “aguardará a conclusão pericial, técnica e científica sobre as causas da ruptura da barragem; e promete que “continuará colaborando plenamente com as investigações, assim como prestando total apoio aos atingidos.”

ANM faz 24 autuações à Vale por tragédia em Mina em Brumadinho

Relatório encontrou inconsistências em dados prestados pela empresa

Relatório técnico final elaborado pela Agência Nacional de Mineração (ANM) com 194 páginas e divulgado na terça-feira (5) aponta ao menos cinco inconsistências entre as informações prestadas pela empresa Vale ao longo de 2018 e a situação verificada pela agência após o acidente em 25 de janeiro na barragem Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG). A ANM emitiu 24 autuações à Vale e vai encaminhar o relatório à Polícia Federal, à Controladoria-Geral da União (CGU), ao Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério Público Federal (MPF).

Entre as “discrepâncias“, técnicos da ANM indicam que “algumas informações importantes que constavam no sistema interno e nas fichas de inspeção no campo da Vale na hora as mesmas inseridas no SIGBM [Sistema Integrado de Gestão de Segurança de Barragens de Mineração], o que impediu que o sistema alertasse os técnicos de situação com potencial comprometimento da segurança da estrutura”, indica nota da ANM.

Conforme a nota da agência, “no penúltimo reporte [relatório] feito pela Vale antes do rompimento, dia 08/01/2019 e enviado à ANM de 30/01, ou seja, após o rompimento, ainda constava que a barragem não possuía nenhuma anomalia. Porém, no dia 15/02, a empresa entregou um reporte de uma vistoria realizada no dia 22/01 (três dias antes do rompimento) em que todas as irregularidades foram apontadas”.

Segundo último balanço do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, foram contabilizadas 252 mortes em decorrência da tragédia. Oficialmente, 18 pessoas permanecem desaparecidas.

 

Por Gilberto Costa, da Agência Brasil , in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 06/11/2019

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