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Revisão dos índices de produtividade. Cavalo de batalha para a Reforma Agrária

Comecemos pelo que atinge mais diretamente os trabalhadores do campo. Os índices de produtividade transformaram-se no cavalo de batalha para a Reforma Agrária. Opõem em trincheiras diferentes o movimento social e os ruralistas. E também o Governo: de um lado está o Ministério do Desenvolvimento Agrário, na pessoa do seu ministro, Guilherme Cassel, e do outro o Ministério da Agricultura, também na pessoa do seu ministro, Reinhold Stephanes, e seu partido, o PMDB. E no meio, o presidente Lula.

Em um país com dimensões continentais, a possibilidade da Reforma Agrária está estreitamente ligada à produtividade das terras. Ela tornou-se o critério por excelência para a desapropriação e a partilha das terras no Brasil. Nem mesmo outros critérios – como a justiça social e a extensão das terras – são levados em consideração.

O índice de produtividade indica se determinada propriedade rural é ou não considerada produtiva e, portanto, passível de ser desapropriada para fins de reforma agrária. O artigo 11 da Lei 8.629/93, determina que os “parâmetros, índices e indicadores que informam o conceito de produtividade serão ajustados, periodicamente, de modo a levar em conta o progresso científico e tecnológico da agricultura e do desenvolvimento regional”. No entanto, a última atualização ocorreu em 1980 com base no censo agropecuário de 1975.

De lá para cá, o campo foi palco de uma verdadeira revolução. Na safra de 1985/1986, foram colhidos pouco menos de 54 milhões de toneladas de grãos. Atualmente, as safras ultrapassam os 140 milhões de toneladas. As áreas plantadas não foram proporcionais. As novas tecnologias encontraram campo fértil na agricultura. Portanto, o que se vê é que o aumento de produção está diretamente vinculado com o aumento da produtividade das lavouras. Ou seja, hoje, produzir mais não está relacionado ao aumento da área cultivável.

Neste contexto, a revisão dos índices de produtividade é uma antiga bandeira do movimento social, especialmente do Movimento Sem Terra, e uma promessa do Governo Lula. O assunto veio à baila em 2005, entrou 2006 adentro e depois foi abandonado pelo Governo. Em 2006, provocou o conflito entre Miguel Rosseto, na época ministro do Desenvolvimento Agrário na época, e Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura.

O tema mexe com fortes interesses econômicos e políticos. A iniciativa teve a expressa oposição dos ruralistas. Ao mesmo tempo, 2006 foi ano eleitoral. Assim, o presidente Lula achou melhor esperar um – na época – possível segundo mandato para aprovar a nova tabela dos índices de produtividade das propriedades rurais, mesmo que os estudos já estivessem prontos. Mesmo sem terem sido implementados, tem-se como certo que os novos índices de produtividade teriam causado a demissão de Roberto Rodrigues, contrário à revisão dos índices, em julho de 2006.

No dia 17 de agosto passado, depois das mobilizações realizadas pelo Movimento Sem Terra e a seu pedido, o Governo anunciou que, por determinação do presidente Lula, uma portaria com os novos índices agropecuários, seria publicada num prazo máximo de 15 dias. Convém destacar que esse anúncio representa uma importante conquista do MST.

Mas, tão logo o anúncio foi feito, os setores contrários começaram a fazer barulho e pressionar o governo. O Governo começou a sofrer pressões dos ruralistas, mas também do PMDB. Além disso, a atualização dos índices agropecuários sofre a expressa oposição do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. Na mobilização contra a revisão dos índices de produtividade o PMDB e os fazendeiros defendem os mesmos argumentos: de que o momento (de crise) não seria o mais apropriado, de que o modelo adotado é simplista, de que a medida seria atender a um pedido do MST, e de que geraria novos conflitos no campo.

Para fazer a nova tabela de produtividade no campo, foi pesquisada a produção em 554 microrregiões do País, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e dos municípios. Os novos índices serão calculados pela média da produtividade dessas microrregiões entre 1996 e 2007.

Os fazendeiros argumentam que com os novos índices teriam que produzir mais para não verem suas terras desapropriadas para reforma agrária. Dados dão conta de que a produtividade atual estaria bem acima dos novos índices. Entre os índices mais elevados, os produtores de soja de Sorriso (MT), por exemplo, terão de produzir pelo menos 2,4 toneladas por hectare, ao invés da 1,2 tonelada do índice atual. Mas, observe-se que a produtividade na região na safra 2006/2007 foi de 3.062 kg por hectare.

O ministro Stephanes reconheceu que “a reação” dos ruralistas “foi muito forte. Acima de qualquer expectativa”. Diante das pressões desses setores contrários, o ministro Stephanes já admitiu que “o presidente Lula não estipulou prazo algum, apenas determinou que terminássemos os estudos”. Ou seja, do certo está se regredindo para o incerto, o que não descarta que o presidente Lula mais uma vez volte atrás e desista do novo índice de produtividade.

A tramitação para a aprovação nos novos índices seria simples. A única formalidade exigida antes da assinatura seria a convocação do Conselho de Política Agrícola, órgão consultivo presidido por Stephanes. Isso, segundo a Agricultura, deve ocorrer esta semana.

(Ecodebate, 03/09/2009) publicado pelo IHU On-line, 02/09/2009 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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