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(MP 458) Lula e a MP da grilagem

[O Estado de S.Paulo] Grileiros e outros espertalhões poderão apropriar-se de milhões de hectares de terras públicas, a custo muito baixo ou até sem custo, se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não vetar os artigos mais nocivos da Medida Provisória (MP) 458. Essa MP, aprovada na quarta-feira pelo Senado, foi editada com o objetivo oficial de promover a regularização fundiária na Amazônia. Deveria facilitar a legalização da posse de 67,4 milhões de hectares, avaliados em cerca de R$ 70 bilhões. Falhas foram apontadas já no texto original, por facilitar a venda sem licitação de áreas de até 1.500 hectares. Para início de conversa, que tipo de “posseiro” tem capacidade econômica para ocupar produtivamente um terreno dessa extensão?

O projeto poderia ser bem intencionado. A regularização de cerca de 400 mil posses facilitaria a formulação e a execução de políticas de desenvolvimento econômico e de preservação ambiental para uma ampla região. Mas era cheio de falhas e deixava espaço para a ação de especuladores e grileiros sem o mínimo interesse na solução combinada de graves problemas sociais, econômicos e ambientais da Região Amazônica.

A discussão aberta desde o início da tramitação da MP no Congresso foi politicamente inútil. Parlamentares conseguiram piorar o projeto, ampliando o espaço para vários tipos de distorções. O documento finalmente aprovado, e agora dependente da sanção presidencial, é uma versão disforme de um texto original defeituoso. Pelo menos nisso, nenhuma novidade. Congressistas brasileiros são conhecidos por seu talento para estragar bons projetos e piorar mesmo os textos muito ruins.

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e sua antecessora, a senadora Marina Silva, apontaram alguns defeitos muito graves no documento aprovado pelos congressistas, todos derivados de emendas.

Pelo texto aprovado, poderão requerer posse legal pessoas não residentes no município onde se localiza a terra sujeita a regularização. Segundo a senadora Marina Silva, o benefício deveria ser limitado a ocupantes diretos de cada área e sem possibilidade de extensão a pessoas jurídicas. A autorização para pessoas jurídicas participarem do processo também foi acrescentada ao texto por meio de emenda parlamentar.

Segundo a MP original, ocupantes beneficiados com a posse legalizada poderiam vender as terras somente depois de dez anos. Pela versão aprovada, o prazo será reduzido para três anos, no caso das áreas grandes e médias. Com isso, a regularização da posse, por meio de vendas sem licitação, poderá tornar-se um excelente negócio para especuladores fundiários.

Se levar em conta as observações do ministro Carlos Minc e da ex-ministra Marina Silva, o presidente Lula poderá pelo menos eliminar alguns dos piores aspectos da MP convertida em lei. Para isso, teria de assumir uma posição mais clara a favor da conciliação entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental, abandonando a inclinação, demonstrada até agora, a favor do primeiro objetivo. O veto aos piores artigos seria o primeiro passo para se retomar um tratamento sério do assunto. Depois disso ainda faltaria executar a tarefa imensamente complexa de legalizar 400 mil posses. Mesmo com uma base melhor que o texto sacramentado pelo Congresso, as autoridades terão muito trabalho para avaliar as pretensões dos candidatos à posse regularizada e para evitar fraudes.

As distorções criadas pelas emendas são claras. O presidente não teria de escolher entre opiniões de ambientalistas, invocadas pelo ministro do Meio Ambiente, e interesses defendidos por grupos de fazendeiros.

Se examinasse o assunto de acordo com essa perspectiva, correria o risco de equivocar-se. Não se trata, agora, de resolver conflitos entre ministros, mas de levar em conta o objetivo inicialmente atribuído à MP. Os próprios ministros, ao estabelecer alianças com diferentes grupos de interesses, fragmentam as ações do governo e dificultam a articulação de seus fins. Mas neste caso não parece haver margem para dúvida. Embora o texto original fosse mal formulado e desse espaço a alguns abusos, a intenção, deve-se presumir, não era beneficiar grileiros nem promover a especulação. Se a meta é levar a legalidade à Amazônia, para promover o desenvolvimento equilibrado, o presidente não deve ter dificuldade para decidir os vetos na hora de sancionar a lei.

Do O Estado de S.Paulo, Notas e Informações.

[EcoDebate, 10/06/2009]

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