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Notícia

O aquecimento global já reduz as geleiras dos EUA, afetando o volume de água no oeste do país

O fenômeno do degelo dos glaciares, que se acelera nos Andes, nos Alpes e no Himalaia, também está se acelerando nos EUA. Um exemplo pode ser aferido no Glacier National Park, no estado de Montana. Em 1910, existiam 150 geleiras no parque, agora, restam apenas 25, que perdem 9 % da sua massa por ano, podendo desaparecer entre 2015 e 2020. Por Henrique Cortez, do EcoDebate.


Grinnell Glacier, no Glacier National Park, em 1981

Grinnell Glacier em 2005

Mundialmente, a maior parte dos glaciares estão diminuindo e os norte-americanos, em geral, pensam nisto como acontecendo no Ártico e na Groelandia, mas não como um problema no próprio país. Enquanto isto, uma pesquisa Gallup realizada em abril/2008, descobriu que “61% dos americanos reconhecem os efeitos do aquecimento global, mas apenas 37% estão preocupados com ele, aproximadamente a mesma percentagem de quando Gallup fez a mesma pergunta em 1991.

Há quem acredite que os americanos não se sentem ameaçados pelos desastres naturais deflagrados pelo aquecimento global, simplesmente porque já estão acostumados com furacões, tornados, inundações, grandes incendios florestais, etc, e acreditam que podem enfrentar ciclos mais intensos, sem grandes problemas.

No entanto, o derretimento das geleiras pode trazer uma nova percepção da questão, quando as torneiras estiverem secas. Para a maioria dos norte-americanos a perda de alguns milhares de hectares de gelo em um canto remoto de Montana parece pouco significativo. Mas é. Desaparecendo geleiras é um prenúncio de enormes problemas e o mais óbvio é a seca.

O estado de Montana, no ano de 2007, já enfrentou uma seca prolongada, fato antes impensável em um dos estados com maior oferta de água.

O volume do Rio Owens, no Sierra e do rio Colorado estão diminuindo rapidamente. O rio Colorado é alimentado pelo delelo anual dos glaciares, que tem diminuído drasticamente nos últimos anos. O rio é a principal fonte de abastecimento de água para sete estados (Colorado, Utah, Wyoming, Novo México, Arizona, Nevada e Califórnia) e, até 2012, devido ao aumento da procura e da redução da oferta, o rio Colorado já não será capaz de satisfazer os compromissos de abastecimento.


Bacia do rio Colorado

A redução da oferta de água é uma ameaça real e já estão previstos US$ 2,5 bilhões em projetos hídricos. Entre eles está uma proposta transposição de águas, numa distância superior a 400 KM, com aquedutos transferindo água do norte de Nevada para Las Vegas.

Em Yuma, Arizona, foi retomado um projeto de dessalinização, antes paralizado porque era considerado desnecessário. O projeto irá purificar a água salgada subterrânea para abastecer as cidades vizinhas.

A corrida para a água é impulsionada pelo crescimento da população, as pressões políticas e à dura realidade de que o rio Colorado, do qual dependem mais de 20 milhões de pessoas em sete estados, possui uma oferta de água muito menor do que tinha há 20 anos.

Segundo algumas projeções de longo prazo, a redução das geleiras nas Montanhas Rochosas, que alimentam o rio Colorado, irá se acelerar com o aquecimento global e, em 2008, o volume de água de degelo foi cerca de metade da sua média histórica. Em apenas um dos últimos sete anos o volume foi superior à média.

A redução do volume dos rios da região já reativou velhas rivalidades de alguns estados e iniciou novas batalhas judiciais. O estado de Montana recorreu à Suprema Corte dos Estados Unidos, em ação contra o estado de Wyoming, acusando-o de usar mais do que a sua parte equitativa da água dos rios Pó e Tongue, afluentes do Rio Yellowstone.

Os sete estados usuários do rio Colorado – Colorado, Wyoming, Utah e Novo México, na bacia superior e da Califórnia, Arizona e Nevada na bacia inferior, já estão desenvolvendo planos de emergência, para quando o rio deixar de atender às outorgas contratadas, uma perspectiva que alguns especialistas predizem irá ocorrer em cerca de cinco anos.

Novas provas científicas periódicas sugere que longas e severas secas tornaram-se a norma na bacia do rio Colorado, minando cálculos da quantidade de água do rio pode fornecer e intensificou as pressões para encontrar novas soluções ou fontes.

Os efeitos da seca podem ser vistos no Lago Mead, em Nevada, onde uma diminuição do nível da água deixou penduradas docas de uma marina cercada por terra seca. Rio acima, o lago Powell que está em seu nível mais baixo desde 1973, exposto quilômetros de lama ao lado dos cânions conducentes à Barragem Glen Canyon.


Lago Mead em imagem de abril/2007. Foto do NYT
A hidrovia pode entrar em colapso e especialistas prevêem que o lago Mead irá desaparecer até 2021.

O volume de água nas geleiras da Serra Nevada atingiram o nível mais baixo em cerca de duas décadas.

“Os cientistas dizem que o aquecimento global vai eliminar 25% de nossas geleiras, pela metade deste século,” diz o governador da Califórina, Schwarzenegger, “o que significa que menos neve acumulada nas montanhas, resulta em mais inundações no inverno e menos água potável no verão. “

O que une os estados ocidentais é um crescente consenso entre os cientistas que as futuras alterações climáticas e temperaturas mais quentes, se continuarem, poderá abalar toda a estrutura regional de abastecimento, mais do que em qualquer outra região dos EUA.

As temperaturas mais elevadas já anteciparam o período de degelo em cerca de 10 dias, em média, mais cedo do que no passado. Temperaturas mais elevadas tambem significariam mais chuvas caindo em vez de neve, mudando o planejamento de armazenamento de água e, potencialmente, poderiam causar mais inundações pelo aumento de vazão em menor espaço de tempo.

Estas questões devem ser cuidadosamente avaliadas no Brasil, porque enfrentaremos problemas semelhantes, mesmo na bacia amazônica, onde o rio Solimões (trecho do rio Amazonas compreendido entre as bocas dos rios Javari e Negro) depende do degelo andino.

Preocupações análogas também devem ser consideradas no semi-árido, onde o aumento da temperatura, certamente, aumentará a evaporação nos reservatórios, reduzindo, ainda mais, a disponibilidade hídrica na região, já ameaçada pela desertificação.

[Ecodebate, 20/08/2008]