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Artigo

Esgoto no ventilador: ETE do Sambaqui, artigo de Ana Echevenguá

“Nihil Obstat”! – Dom James Pizarrus III

[EcoDebate] Em meados de 2007, a famigerada CASAN – Companhia Catarinense de Águas e Saneamento – informou que estava de olho nos recursos para o saneamento básico previstos no PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. Também de olho, na época, na renovação do contrato de concessão de serviços com Florianópolis, Walmor de Luca, eterno presidente da estatal, prometeu investimento de R$ 112 milhões no saneamento básico da Ilha da Magia.

A proposta foi ampliar a rede de esgoto das áreas da ilha envolvidas com a maricultura. Para quem não ainda sabe, nossos elogiados frutos do mar são alimentados, também, com dejetos humanos devido à falta de tratamento de esgoto aqui reinante. Tapera, Ribeirão da Ilha e Santo Antônio de Lisboa, Canasvieiras e Cachoeira do Bom Jesus foram alvo das promessas sobre a implantação dos projetos. Promessas boas às vésperas de eleição municipal.

Em 2008, a CASAN não fez nada do que prometeu. Mas renovou o contrato com Florianópolis, o que ajudou política e financeiramente a reeleição do prefeito.

Estamos no final de fevereiro de 2009. Cadê as obras de saneamento com verbas do PAC?? Não tem nada além das promessas.

Peraí, e aquela história de uma Estação de Tratamento de Esgoto na Barra do Sambaqui?

É mesmo! A ETE do bairro Sambaqui! Claro, lá tem maricultura (e esgoto não tratado jogado nas águas). Aquela região é, hoje, um ponto gastronômico importante da Ilha da Magia.

Mas esta história está mal contada… muito mal contada. O vereador Ricardo Vieira – uma das poucos representantes do povo que se interessou pelo assunto – disse que esta ETE vai beneficiar as comunidades de Sambaqui, Cacupé e Santo Antonio. Mas – atenção! – a Barra do Sambaqui não vai ser beneficiada com a coleta de esgoto.

E mais: o esgoto vai ser tratado e jogado no mangue. Por quê? Porque não vai sobrar dinheiro para implantar um emissor submarino que jogue os dejetos em alto mar.

Gente, não é piada!! Isso é Ilha da Magia!!

O gerente de construção da CASAN, Fabio Kruger, foi entrevistado pelo repórter Mario Motta, na rádio CBN, em 25/02/2009, sobre esse ‘samba-enredo’:

– “Mario, a gente tem apenas um projeto para uma ETE que foi aprovado em Brasília”;

– “não temos a verba do PAC para esta ETE nas mãos”;

– “não temos o local certo para implantação. o terreno é de terceiros (estão tentando desapropriá-lo)”;

– “não temos o licenciamento ambiental para o empreendimento. O processo está andando na FATMA; não podemos iniciar a obra sem a licença” (…) “mas na área escolhida não há, por conta do planejamento urbano, qualquer objeção”;

– “não tem análise do aspecto ambiental” – após o radialista ter insistido neste ponto. “Estas questões serão resolvidas no meio do caminho”;

“Mas aquela é a única alternativa locacional: o que decide isso é a topografia do terreno”;

E mais: “saneamento básico é um anseio da comunidade. Há 10 anos a CASAN não tinha recurso federal pra fazer obras. Agora há 130 milhões disponíveis”.

Entenderam bem?? A prioridade da CASAN é não perder recursos; é meter a mão no dinheiro que está disponível em Brasília! Fornecer saneamento básico, atendendo aos anseios da comunidade – que é sua obrigação contratual remunerada – é blábláblá…

Os absurdos trazidos pelo gerente da CASAN geraram algumas dúvidas:

– se a topografia indicasse que a ETE deveria ser construída no terreno da Igreja Nossa Senhora das Necessidades, em Santo Antonio de Lisboa, a CASAN derrubaria o prédio dessa??? E desde quando a topografia decide a melhor alternativa locacional??? Qual é a formação deste gerente que fala este besteirol???;

– como o PAC aprova um projeto para uma estação de tratamento de esgotos – impactante – sem qualquer análise ambiental da área de implantação deste empreendimento???;

– como o PAC aprova um projeto para uma estação de tratamento de esgotos que só vai recolher o esgoto e jogá-lo numa área de preservação permanente – mangue???;

– como o PAC aprova um projeto para uma estação de tratamento de esgotos que vai recolher o esgoto em outras comunidades (Sambaqui, Cacupé e Santo Antonio) e jogá-lo nas APPs já impactadas pelo tratamento de esgoto que ela não faz (Barra do Sambaqui)???;

– como eles resolvem a questão ambiental “no meio do caminho”? Descobrem que a ETE está impactando o solo, as águas, a população do entorno e assinam um TAC – Termo de Ajuste de Conduta – junto ao Ministério Público que vai prever a entrega de um veículo para a FATMA ou o plantio de árvores??;

Bom, nada disso é inusitado: Santa Catarina não tem qualquer proposta política de saneamento básico. Há mais de 30 anos, a CASAN age assim, de forma predatória e criminosa. Relegou o saneamento básico, cobra por um tratamento de esgoto que não existe; fornece água contaminada com alumínio e não cuida dos mananciais de água. Por isso, contamos com um dos piores indicadores sociais de Santa Catarina, com apenas 8,6% de cobertura de tratamento de esgoto no nosso território.

No Diário Catarinense de 31 de janeiro de 2009, a reportagem como o título “Capital da praia suja”, tratou do último laudo de balneabilidade da FATMA que encontrou, em Florianópolis, 21 pontos impróprios para banho. Vejam a obviedade do depoimento do responsável técnico pelo laboratório da FATMA, Marlon Daniel da Silva: “Onde não existe saneamento se está sujeito a esse problema. Alguns até contam (com saneamento), mas não em sua totalidade” (http://www.clicrbs.com.br/diariocatarinense/jsp/default2.jsp?).

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, presidente da ong Ambiental Acqua Bios e da Academia Livre das Águas, e-mail: ana@ecoeacao.com.br, website: www.ecoeacao.com.br

[EcoDebate, 02/03/2009]

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