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Sustentabilidade no Sistema Financeiro do Brasil, artigo de José Rodrigues Filho

 

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Sustentabilidade no Sistema Financeiro do Brasil

[EcoDebate] Argumenta-se que temos sistemas financeiros que causam instabilidades e, além de terem custos elevados, exigem custos diretos e indiretos atribuídos aos contribuintes do presente e do futuro. Consequentemente, os sistemas monetários atuais são as principais causas de crises múltiplas, com débitos soberanos, destruição ambiental, desemprego e desigualdades acentuadas.

O discurso neoliberal nos dias de hoje, no Brasil, enfatiza a destruição do bem estar social, ataca os sindicatos, e fortalece a desregulamentação, em que a liberdade é transferida da liberdade humana para a liberdade do mercado, através de ações coercitivas do Estado. Ao longo dos anos, o regime financeiro dominante no Brasil conseguiu produzir a concentração econômica, de capital e de poder nas mãos de poucos que lucraram muito, enquanto a maioria dos cidadãos são incapazes de confrontar as classes dominantes levantando a voz. Temos o exemplo, no momento, quando os banqueiros estão defendendo uma reforma da previdência em favor dos bancos, enquanto os trabalhadores poderão ser condenados, sem serem ouvidos, ao sofrimento para o resto da vida. O país precisa de uma reforma da previdência para cortar privilégios e acabar com as desigualdades gritantes, e não esta que está aí destinada a fortalecer o sistema financeiro privado.

Diante das várias catástrofes financeiras, ocorridas em vários países do mundo, danos e decadência das condições sócio-econômicas são socializados na forma de salários e pensões reduzidos. Além disto, aumento de impostos, redução dos gastos em educação e saúde, perdão de dívidas de fazendeiros e banqueiros levam ao aumento do desemprego e pobreza, segregação social e aumento de grupos extremistas, como no caso da Europa, e da criminalidade, como no caso do Brasil.

Há muito tempo foi dito que o sistema financeiro predominante é incompatível com a sustentabilidade e, nos últimos anos, isto foi reforçado pelos discursos de Sustentabilidade Corporativa e Sustentabilidade Social Corporativa. Portanto, enquanto no campo da Ecologia se tenta fortalecer teoricamente o discurso de sustentabilidade, nas áreas acima citadas, o discurso de sustentabilidade é reduzido às práticas de negócios (business-as-usual). Este tipo de sustentabilidade, denominado de sustentabilidade fraca, é o discurso dominante no mundo corporativo, razão pela qual em muitas corporações, incluindo os grandes bancos brasileiros, a sustentabilidade, na visão deles, é perfeitamente praticada. Em resumo, sustentabilidade para estas corporações significa business-as-usual, ou seja, negócios como sempre.

Felizmente, o discurso de finanças sustentáveis, que exige um pensamento profundo, advindo de áreas como Ecologia e Ciências Sociais, começa a surgir, preocupado com a humanidade e o planeta Terra. Alguns pesquisadores na área de finanças sustentáveis reconhecem que os investimentos tem sido concebidos e executados através dos esquemas da governança existente, que são incongruentes com os problemas de sustentabilidade. Todavia, mais recentemente, esquemas corporativos financeiros estão sendo propostos nos Estados Unidos e Europa enfatizando uma significante participação que pode ser aplicada às finanças sustentáveis.

O futuro da governança corporativa vai permanecer obscuro, mas as recentes iniciativas podem acarretar uma profunda mudança sobre as suposições básicas da governança corporativa dominante. Na União Européia, por exemplo, as finanças sustentáveis são enfatizadas, levando-se em conta as considerações sociais e ambientais que apoiam o crescimento econômico de uma forma sustentável, a longo prazo, reduzindo as pressões sobre o meio ambiente, atacando a poluição e aumentando a transparência, através de uma governança apropriada. Recentemente um grupo foi estabelecido, composto de especialistas da sociedade civil, do setor bancário, acadêmicos e observadores internacionais, para propor recomendações de finanças sustentáveis. Acadêmicos já reconheceram que a teoria de finanças tradicional e suas práticas são limitadas e direcionadas por um conjunto de valores inapropriados, que são insustentáveis, propondo uma mudança paradigmática que enfatiza um esquema sustentável, que considera o social e ambiental. Em resumo, uma teoria geral de finanças deve valorizar a sustentabilidade e punir a poluição, por exemplo.

Pensar em finanças sustentáveis no Brasil ainda é um sonho, diante da concentração de meia dúzia de bancos dominando o sistema financeiro do país. Vale lembrar aqui o que disse o grande jurista da Suprema Corte americana, Louis Brandeis, reconhecido como o advogado do povo. Referindo-se aos Estados Unidos, Brandeis disse:  “Podemos ter democracia, ou podemos ter riqueza concentrada nas mãos de poucos, mas não podemos ter os dois”. Há muito que sabemos como são eleitos nossos políticos com o dinheiro sujo das empresas. A Lava Jato veio comprovar tudo isto. As recentes denuncias de devastação da Amazônia, envolvendo a participação de membros do Congresso e dezenas de empresas, deixam qualquer um entristecido. As denúncias e pedido de impeachment de alguns membros da mais alta Corte de justiça do país que, ao contrário do Louis Brandeis, não defende o povo, mas os poderosos, nos entristece mais ainda, sobretudo por que nada acontece com eles.

Com a concentração de meia dúzia de bancos e a riqueza nas mãos de poucos, sabemos que estamos longe de se pensar em sustentabilidade e finanças sustentáveis no setor financeiro. Mas, será que ainda podemos fazer uma escolha e pensar em democracia?

  • José Rodrigues Filho é professor da Universidade Federal da Paraíba. Foi pesquisador na Universidade de Harvard e, mais recentemente, professor visistante na DeGroote School of Business, McMaster University, Canada, na área de sustentabilidade.
    https://jrodriguesfilho.blogspot.com/

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 09/05/2019

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