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Energia eólica em larga-escala precisará de mais territórios e causará maior impacto climático do que previsto

 

Energia eólica em larga-escala precisará de mais territórios e causará maior impacto climático do que previsto

Quando se trata de produção de energia, infelizmente tudo tem seu preço.

Por Leah Burrows*,
Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas John A. Paulson, de Harvard

 

Primeira observação direta em larga-escala da densidade de potência eólica é coerente com modelos fisicamente baseados, porém incoerente com estimativas de recursos eólicos que ignoram as interações entre os aerogeradores e a atmosfera. CRÉDITO: Imagem cortesia de Lee Miller/David Keith
Primeira observação direta em larga-escala da densidade de potência eólica é coerente com modelos fisicamente baseados, porém incoerente com estimativas de recursos eólicos que ignoram as interações entre os aerogeradores e a atmosfera. CRÉDITO: Imagem cortesia de Lee Miller/David Keith

 

Conforme o mundo inicia sua ampla transição para energias de baixo carbono, é vital compreender os prós e contras de cada uma delas e considerar os impactos ambientais da energia renovável, mesmo sendo menores que os do carvão e do gás.

Em dois artigos, publicados na Environmental Research Letters e na Joule, pesquisadores da Universidade de Harvard estimam que a transição para as energias eólica ou solar nos Estados Unidos exigirá de cinco a vinte vezes mais territórios do que se imaginava.

E se tais parques eólicos fossem construídos em grande escala, a temperatura superficial média nos Estados Unidos Continentais subiria 0.24 graus Celsius.

“O vento ganha do carvão em qualquer medição ambiental, mas isso não significa que seus impactos sejam insignificantes,” disse David Keith, o Professor Gordon McKay de Físicas Aplicadas na Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas John A. Paulson (SEAS), de Harvard, e autor sênior destes artigos. “Precisamos abandonar os combustíveis fósseis para acabar com as emissões de carbono. Para isso, precisamos escolher entre várias tecnologias de baixo carbono, todas elas possuindo impactos sociais e ambientais.

David é também Professor de Políticas Públicas na Escola Kennedy, de Harvard.

Um dos primeiros passos para entender o impacto ambiental de tecnologias renováveis é avaliar quanto território seria necessário para atender futuras demandas de energia dos Estados Unidos. Até mesmo ao analisar as demandas atuais de energia, o território e as densidades de potência associadas requeridas tem sido tema de debate pelos especialistas em energia.

Em pesquisa prévia, David e seus co-autores modelaram a capacidade geradora de parques eólicos em grande escala e concluíram que a geração de energia eólica no mundo real foi superestimada, porque não levou-se em conta as interações entre os aerogeradores e a atmosfera. Em uma pesquisa de 2013, David descreveu como cada aerogerador cria uma “sombra” atrás de si, onde o ar é desacelerado pelas pás da turbina. Os atuais parques eólicos de escala comercial cuidadosamente espaçam os aerogeradores para reduzir o impacto destas “sombras”. Mas devido à expectativa de crescimento dos parques eólicos à medida que a demanda por eletricidade produzida pelo vento aumenta, interações e impactos climáticos associados não poderão ser evitados.

O que estava faltando na pesquisa anterior, no entanto, eram observações para corroborar o modelo. Então, alguns meses atrás, o Serviço Geológico dos Estados Unidos divulgou a localização de 57.636 aerogeradores em solo americano. Unindo essa informação e outras, provindas de vários bancos de dados do governo americano, David e o bolseiro de pós-doutorado Lee Miller conseguiram quantificar a densidade de potência de 411 parques eólicos e 1.150 usinas solares fotovoltaicas em funcionamento nos Estados Unidos em 2016.

“Descobrimos que a densidade de potência média do vento, ou seja, a média de geração de energia dividida pela área da instalação eólica, era mais de cem vezes menor do que a estimada por alguns especialistas em energia,” disse Lee, autor principal de ambos os artigos. “A maioria destas estimativas não levaram em conta a interação entre a turbina e a atmosfera. Para uma turbina eólica isolada, as interações não são nada importantes, mas quando os parques eólicos tem profundidade maior que de 5 a 10 quilômetros, essas interações tem grande impacto na densidade de potência.”

As densidades de potência eólicas baseadas na observação são também bem mais baixas do que estimadas pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos (DOE) e pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

Quanto à energia solar, a densidade de potência média (medida em watts por metro quadrado) é 10 vezes maior do que a da energia eólica, mas ainda sim bem mais baixa do que a estimada pelos principais especialistas em energia.

Esta pesquisa sugere que não só os parques eólicos exigirão mais territórios para atingir os alvos de energia renovável propostos, mas também terá, em uma escala tão grande, um papel ativo no sistema climático.

A próxima questão, conforme abordada na revista Joule, era como os parques eólicos em grande escala impactariam o sistema climático.

Para estimar os impactos da energia eólica, David e Lee estabeleceram um parâmetro para o clima nos Estados Unidos de 2012 a 2014, usando um modelo padrão de previsão do tempo. Então, eles cobriram um terço da porção continental dos Estados Unidos com aerogeradores suficientes para suprir a demanda atual de eletricidade do país. Os pesquisadores descobriram que este cenário elevaria a temperatura superficial dos Estados Unidos Continentais em 0.24 graus Celsius, com as maiores mudanças ocorrendo à noite, quando a temperatura superficial aumentou até 1.5ºC. Este aquecimento é o resultado dos aerogeradores ativamente misturarem a atmosfera perto do chão e no alto enquanto simultaneamente extraem da circulação atmosférica.

Esta pesquisa financia mais de outros dez estudos que detectaram aquecimento perto de parques eólicos em funcionamento nos Estados Unidos. David e Lee compararam suas simulações com estudos observacionais baseados em satélite no norte do Texas e encontraram aumentos consistentes de temperatura.

Eles prontamente admitem que é improvável que os Estados Unidos gerem tanta energia eólica quanto foi simulado em sua hipótese, mas ocorre aquecimento localizado mesmo em projeções menores. A subseqüente questão é, então, entender em que ponto os crescentes benefícios de reduzir a emissão de gases equalizam-se aos impactos quase instantâneos da energia eólica.

Os pesquisadores de Harvard descobriram que o efeito de aquecimento nos Estados Unidos Continentais, causado pelos aerogeradores, é na verdade maior do que o efeito de emissões reduzidas durante o primeiro século de seu funcionamento. Isto porque o efeito de aquecimento ocorre restritamente na região dos parques eólicos, enquanto as concentrações de gases de efeito estufa precisam ser reduzidas em todo o planeta antes que os benefícios sejam notados.

Lee e David repetiram os cálculos para a energia solar e descobriram que seus impactos ambientais são por volta de dez vezes menores que os do vento.

“Os impactos climáticos diretos da energia eólica são instantâneos, enquanto os benefícios das emissões reduzidas acumulam-se lentamente,” conta David. “Se sua perspectiva for em relação aos próximos 10 anos, a energia eólica na verdade tem, em certos aspectos, mais impacto climático que o carvão ou o gás. Se sua perspectiva for concernente aos próximos mil anos, a energia eólica tem um impacto climático imensamente menor do que o carvão ou o gás.

“A obra não deve ser vista como uma crítica fundamental à energia eólica,” diz David. “Alguns dos impactos climáticos do vento serão benéficos: vários estudos globais mostram que a energia eólica resfria regiões polares. Em vez disso, a obra deve ser vista como o primeiro passo em direção à uma avaliação mais séria esses impactos para todas as fontes renováveis. Esperamos que nosso estudo, em junção com observações diretas recentes, marque um momento decisivo onde os impactos climáticos da energia eólica comecem a receber séria atenção nas decisões estratégicas sobre descarbonizar o sistema de energia.”

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Referência:

Observation-based solar and wind power capacity factors and power densities
Lee M Miller and David W Keith
Published 4 October 2018 • © 2018 The Author(s). Published by IOP Publishing Ltd
Environmental Research Letters, Volume 13, Number 10
DOI https://doi.org/10.1088/1748-9326/aae102

 

* Tradução de Ivy do Carmo, Magma Translation (magmatranslation.com)

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 11/10/2018

[cite]

 

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