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Leilão do campo de Libra. A maior privatização da história brasileira

 

Rio de Janeiro, 17/10/2013 – Manifestantes protestam em passeata no centro da cidade contra o leilão do Campo de Libra
Rio de Janeiro, 17/10/2013 – Manifestantes protestam em passeata no centro da cidade contra o leilão do Campo de Libra, o primeiro do pré-sal, marcado para a próxima segunda-feira (21). O ato na Avenida Rio Branco tem apoio de petroleiros, integrantes da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), representantes de sindicatos e estudantes. Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil.

 

A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia, publicadas diariamente juntamente com a Entrevista do Dia na página eletrônica do IHU.

Sumário:

Maior privatização da história do Brasil

Riqueza incomensurável
Por que o governo tem pressa?
Soberania e ausência de estratégia
Os chineses vêm aí
O que resta de esquerda no PT?

 

Eis a análise.

Maior privatização da história do Brasil

O leilão do campo petrolífero de Libra marcado para essa segunda-feira, 21 de outubro, já pode ser considerada a maior privatização da história brasileira. A privatização da Vale do Rio Doce, realizada década e meia atrás, é fichinha perto da grandiosidade dos valores e do significado que envolve o poço de Libra.

O leilão se torna ainda mais surpreendente por ser levado a cabo por um governo do PT que sempre criticou duramente a onda privatista dos anos neoliberais. É preciso lembrar que à época da campanha presidencial de 2010, Dilma Rousseff negou veementemente qualquer negociata com o pré-sal. Chegou a afirmar durante a campanha eleitoral que o “pré-sal é o nosso passaporte para o futuro”.

Quando o martelo bater nessa segunda-feira no Windsor Barra Hotel, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro privatizando Libra, um divisor de água se estabelecerá na história do PT. O PT antes de Libra e o PT pós-Libra. O PT repetirá o PSDB que em 06 de maio de 1997 privatizou a Vale contra a indignação de muitos que agora legitimam a privatização de Libra.

Mesmo que governo negue o fato de que estamos diante de uma privatização, é disso que se trata. O regime de concessão partilhada – que condiciona a Petrobras a ser sócia no consórcio vencedor com participação de pelo menos 30% – não esconde o resultado final, a entrega da exploração da maior parte do petróleo brasileiro a empresas de fora.

A justificativa é de que os recursos serão utilizados para a área social, a pressa do governo teria aumentado após as jornadas de junho  que pedem investimentos em saúde e educação, mas há dúvidas. Para muitos, a pressa do governo em torrar Libra está ligada ao ajuste fiscal, particularmente ao acerto do superávit primário.

Libra, entretanto, não é apenas significativa do ponto de vista de valores, também é sob a perspectiva geopolítica mundial.  Em tempos em que soberania rima com energia, o mapa global do petróleo indica que essa fonte de energia fóssil – em que pese o crescimento da exploração de gás – ainda joga papel determinante no cenário internacional. Nesse contexto, entregar Libra e petróleo da mais alta qualidade e de custo mais barato para extração é abrir mão de soberania em área estratégica.

Riqueza incomensurável

O poço de Libra, na Bacia de Santos, é extraordinário. Trata-se do maior campo da reserva do pré-sal comprovado. Como dizem os petroleiros, basta colocar o canudinho e sugar. Pelas estimativas mais modestas calcula-se que estão estocados ali 15 bilhões de barris de petróleo da melhor qualidade. Para se ter uma ideia do que representa este volume de petróleo, Libra sozinho pode representar  65% da produção atual. Heitor Scalambrini Costa, doutor em energia e professor da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE
destaca que Libra “corresponde a tudo que já foi extraído pela Petrobras desde a sua criação, há 60 anos, equivalendo também a todas as reservas do México”.

A riqueza de Libra é avaliada em R$ 3 trilhões, algo que a natureza levou 130 milhões de anos para lapidar e que em menos de trinta minutos poderá ser entregue ao capital de outros países.

Sindicatos, associações, setores acadêmicos e movimentos sociais afirmam que é uma enorme insensatez entregar riqueza tão grande. “Se um campo correspondente a uma Petrobras inteira não é estratégico ao país, o que então será?”, pergunta o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes.

Na opinião de Ildo Sauer, ex-diretor executivo da Petrobras, em entrevista exclusiva ao IHU, “nenhum país do mundo faz o que o Brasil está fazendo: leiloar aos poucos o acesso da produção de petróleo de campos cujo total é desconhecido”.

Segundo ele, trata-se de um equívoco enorme entregar Libra: “Até agora, a estratégia brasileira está completamente equivocada, e Libra é apenas a cabeça de ponte, é o início de um processo de deterioração e de um papel subalterno que o Brasil está cumprindo nesse embate global entre os países que detêm reservas e recursos e aqueles que querem se apropriar deles pagando o mínimo possível. Petróleo não é pizza, não é boi, não é um negócio qualquer”.

Sauer fala em perplexidade e apreensão com o que está acontecendo: “Parece-me que essa decisão é baseada em problemas da macroeconomia, das contas externas e do déficit público, que tem sofrido uma deterioração considerável nas contas. De modo que essa proposta de pedir 15 milhões de reais de pagamento de bônus para assinatura é uma coisa que não tem sentido, pois só piora o resultado final do leilão, na medida em que alguém precisa, de antemão, pagar um valor tão grande”.

Na opinião de Heitor Scalambrini Costa, “a entrega do petróleo que a ANP está patrocinando fere o princípio da soberania popular e nacional sobre a nossa importante riqueza natural que é o petróleo, chegando a se constituir em crime de lesa pátria”.

Segundo ele, “o Governo Federal estará trocando por 15 bilhões de reais (previsão de arrecadação) as reservas fantásticas que poderiam financiar a educação, saúde e infraestrutura no Brasil em um futuro próximo”. Scalambrini levanta ainda suspeitas sobre o destino final dos recursos. Para o professor da UFPE, “o dinheiro arrecadado com o leilão vai para a conta única da união, e quem sabe não será usado para pagar à eterna divida externa ou ainda para pagar os juros da dívida interna para alguns acionistas de bancos”?

Por que o governo tem pressa?

Tudo indica que a pressa e a insistência do governo em leiloar Libra está relacionadas ao bônus imediato que receberá no ato da privatização. Pelo modelo de partilha, instituído para o pré-sal, vence o leilão quem oferecer a maior quantidade de petróleo extraído ao governo, sendo o lance mínimo 41,5%, mais o “ingresso” de R$ 15 bilhões para entrar no negócio. Os R$ 15 bilhões ajudariam no equilíbrio do orçamento do último trimestre.

O governo não fala sobre isso, mas endossa que uma das razões para a ‘privatização’ é de que a Petrobrás não reúne sozinha as condições para bancar a empreitada, ou seja, o aporte de investimentos necessários que, entre outros, exigirá a ampliação de plataformas refinarias, terminais, navios, etc. Apenas em FPSOs [sigla em inglês para plataforma flutuante de produção, armazenamento e transferência], seriam necessárias para Libra, nas estimativas mais baixas, em torno de 25 plataformas, atualmente o país tem 34 operando. O custo de cada uma dessas plataformas oscila entre três a quatro bilhões de dólares.

O ex-diretor-geral da ANP à época de FHC, David Zylberstajn e o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires pensam dessa forma. Segundo Pires, “a impressão que se tem é que o governo está estendendo a mão para o capital privado não por convicção, mas por pura necessidade, já que não pode explorar essas reservas sozinho e precisa dos investimentos das empresas para reativar a economia”, disse ele.

Em entrevista nesse final de semana, Adriano Pires, argumenta que a Petrobrás não tem capacidade hoje de assumir sozinha os custos e riscos da exploração do pré-sal. “Melhor se apropriar de uma parcela de uma renda petrolífera do que não ter renda nenhuma.” Segundo ele, “ Petrobrás não tem condições de assumir a exploração sozinha. Nem condições financeiras – porque o governo federal descapitalizou a Petrobrás – nem condições operacionais. Estamos falando de uma das maiores reservas do mundo. O governo precisa entender que petróleo é uma commodity. Melhor se apropriar de uma parcela de uma renda petrolífera do que não ter renda nenhuma”.

Na análise de especialistas e movimentos, esse argumento é frágil. Argumentam que se Libra é reserva comprovada, correspondente a uma Petrobras, as ações da estatal disparariam caso a empresa fosse incumbida diretamente de responder pela exploração do campo. Com isso, ainda segundo os opositores do leilão, teria todas as linhas de crédito à disposição para levantar os recursos dos quais o governo afirma não dispor para conseguir “colocar o canudinho” na bacia.

Na opinião de Ildo Sauer, “caso a Petrobras fosse contratada para explorar o Campo de Libra, seria possível pagar o investimento da exploração em no máximo três anos, garantindo uma produção de petróleo por 30 anos, com uma produção um pouco superior a 1 milhão, 1,5 milhão de barris por dia, que daria um excedente proporcionalmente menor, mas mesmo assim chegaria a algo entre 35, 40 bilhões”. Segundo ele, “o problema financeiro é um mito que inventaram; não falta dinheiro para quem tem reserva de petróleo certificada”.

Argumenta ainda Sauer na entrevista ao IHU: “Vamos falar a verdade. Isso é tudo jogo de cena para criar confusão! Não falta dinheiro para quem tem reserva de petróleo e tem capacidade tecnológica. Nenhuma empresa tem dinheiro diretamente. Quem tem dinheiro são os bancos, o sistema financeiro e a China, que hoje detém reservas da maior monta do mundo em função do seu processo de produção, exportação e acumulação, que financia grande parte da dívida americana, por exemplo. Então, não falta dinheiro no mundo”.

O argumento, porém, mais forte do governo para privatizar Libra é que conseguirá arrecadar rapidamente recursos para investir na área social e assim dar uma resposta concreta às jornadas de junho que sacudiram o país.

As manifestações das ruas pediram pressa na melhoria dos serviços públicos de saúde, educação e transporte. Foi esse o recado dado pela presidenta Dilma Rousseff no mês passado, ao sancionar a lei que destina recursos dos royalties do petróleo para a saúde. Disse ela: “Isso significa R$ 112 bilhões nos próximos dez anos, e do Fundo Social só do Campo de Libra a gente calcula algo em torno de R$ 368 bilhões nos próximos 35 anos”, destacou a presidenta. “Com essa opção que nós fazemos pela educação de qualidade, nós vamos tornar irreversível o processo de redução das desigualdades em nosso país”, afirmou.

Na opinião dos movimentos sociais a pressa da presidente é um erro grave, porque dá com uma mão, mas tira muito mais com a outra. Ganha-se no curto prazo, mas perde-se muito no longo prazo. A decisão seria ainda mais equivocada sob a perspectiva estratégica quando o país sequer sabe ainda o tamanho de suas reservas. Segundo Sauer, “é um absurdo que um país, sem saber quanto tem de petróleo, coloque em leilão um campo com essa gigantesca dimensão de petróleo”.

Na avaliação de Francisco José de Oliveira, diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), os recursos prometidas pelo governo com o leilão “são uma gorjeta”. Segundo ele, “é um absurdo vender isso. O governo afirma que vai investir em educação e saúde, e que vai arrecadar R$ 15 bilhões com o leilão. Mas isso é uma gorjeta perto da riqueza que existe no campo. A sociedade não participou do debate sobre o tema”.

A conclusão é de que se entregando Libra a terceiros o governo já arrecadará muito, explorando sozinho poderia arrecadar muito mais, na ordem de 70% a mais. Portanto, os recursos para a área social seriam infinitamente maiores. Na opinião dos movimentos a pressa além da míope é ainda inimiga da soberania.

Soberania e ausência de estratégia

A interpretação dos movimentos sociais é de que ao invés de buscar o caminho de fortalecimento da Petrobras e da consolidação de um setor nacional numa área estratégica como a energética, o governo opta em abrir flancos para a exploração do capital multinacional que nada deixa por aqui, uma vez que remete os seus ganhos para o exterior.

A questão da soberania é abordada por Ildo Sauer na entrevista ao IHU. Segundo ele, “até 1960, grande parte dos recursos de petróleo do mundo estava na mão das companhias de petróleo multinacionais, comandadas pelas conhecidas sete irmãs: 84% do petróleo estavam na mão delas; 14%, da União Soviética; e 2%, das empresas nacionais. Em 1960 foi criada a Organização dos Países Exportadores de Petróleo – OPEP, que fez duas tentativas e transferiu o excedente econômico que ia para as empresas em direção aos países que detinham as reservas. Hoje, no mundo, mais de 90% das reservas de petróleo conhecidas estão em mãos de Estados nacionais, que têm ou empresas 100% estatais, ou empresas híbridas, como é o caso da Petrobras”.

O Brasil, diz ele, “não sabe se tem 50 bilhões, 100 bilhões ou 300 bilhões de barris. Se o país tiver 100 bilhões, estará no grupo de países de grandes reservas, se tiver 300 bilhões, será o dono da maior reserva do mundo, porque 264 bilhões é o volume de barris da Arábia Saudita. A Venezuela passa disso, se formos considerar o petróleo ultrapesado. De petróleo convencional normal, a Venezuela se encontra no patamar de 80 a 120 bilhões de barris, onde se encontra a Líbia, o Iraque, o Irã, os Emirados Árabes, que são os países do segundo bloco”.

Para Sauer, como destacado anteriormente, “Libra é apenas a cabeça de ponte, é o início de um processo de deterioração e de um papel subalterno que o Brasil está cumprindo nesse embate global entre os países que detêm reservas e recursos e aqueles que querem se apropriar deles pagando o mínimo possível. Petróleo não é pizza, não é boi, não é um negócio qualquer”.

Para ele, “o governo brasileiro parece não entender a dimensão do problema, ou, por ingenuidade, por incompetência, está cometendo algo que chamo de crime de responsabilidade contra o interesse nacional ao iniciar o processo de leilão; ou seja, a maior privatização da história do país, muito superior a todas as privatarias dos governos anteriores, em um lance só”.

Há ainda outro aspecto relacionado ao tema da soberania. A geração e distribuição de riqueza na forma de empregos. Com a privatização de Libra, empregos deixarão de ser gerados. Segundo o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes, “o petróleo deve ser entendido como riqueza, como alavanca do desenvolvimento, gerador de empregos nas plataformas, refinarias, terminais, na fabricação de navios e de derivados. Não podemos permitir sua exploração como foi a de outros recursos naturais, como o pau-brasil e o ouro, e o ferro, hoje”, diz ele.

Essas empresas, além de exportar tudo o que produzem, não geram empregos aqui, nem movimentam a indústria nacional, como faz a Petrobras, destaca a FUP. Segundo o Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), dos 62 navios feitos pela indústria de petróleo, 59 são da Petrobras e três da PDVSA (estatal venezuelana). Ou seja, nenhuma petrolífera privada encomendou navios no Brasil.

Além disso, diz a FUP, “a privatização do petróleo é quase um sinônimo para a terceirização do trabalho, já que empresas como Statoil, Shell, OGX, Chevron, entre tantas outras que abocanharam jazidas de petróleo ao longo dos 11 leilões realizados desde o governo FHC, quando foi quebrado o monopólio estatal da Petrobras, não contratam trabalhadores próprios e, ainda praticam absurdos, como a falta de treinamento necessário para que estes trabalhadores exerçam suas atividades nas plataformas e, em outras unidades operacionais, de forma digna e segura”.

A FUP cita como exemplo de precarização do trabalho a OGX: “Os leilões de petróleo estão rebaixando as condições de trabalho no Brasil. Na OGX, por exemplo, dos 6.500 trabalhadores contratados, 6.200 são terceirizados. Os 300 que são próprios só atuam praticamente em áreas administrativas”.

Em entrevista ao IHU, o conselheiro do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, Paulo Metri afirma: “entregar 70% da reserva conhecida deste campo a empresas estrangeiras, que sempre exportarão suas produções sem adicionar valor algum, nunca contribuirão para o abastecimento do país, dificilmente contratarão plataformas no Brasil, o item de maior peso nos investimentos, não gerarão muitos empregos aqui, não pagarão impostos, graças à lei Kandir, e só pagarão os royalties e uma parcela combinada do lucro é o exemplo máximo da desfaçatez”.

Os chineses vêm aí

Quem está de olho em Libra são os chineses. Eles se apresentaram em peso para o leilão. A China, locomotiva do crescimento mundial é insaciável na busca por energia para atender os padrões do seu crescimento.

11 empresas vão disputar o leilão organizado pela Agência Nacional do Petróleo (ANP): as chinesas Cnooc International Limited e China National Petroleum Corporation (CNPC), a colombiana Ecopetrol, a japonesa Mitsui & CO, a indiana ONGC Videsh, a portuguesa Petrogal, a malaia Petronas, a hispano-chinesa Repsol/Sinopec, a anglo-holandesa Shell e a francesa Total, além da própria Petrobras. As gigantes norte-americanas Chevron e Exxon – as maiores do mundo – e as britânicas BP e BG desistiram da concorrência.

A China disputa com os Estados Unidos a posição de maior importador de petróleo do mundo. Com pouca viabilidade para explorar as reservas que possui em seu território, o país tende a estar ainda mais presente nos países com os maiores potenciais de produção.

A participação das estatais chinesas na disputa pelo campo de Libra, no pré-sal de Santos, é prova do apetite gigante dos chineses pelo setor energético brasileiro. A presença maciça na competição por um contrato no pré-sal também demonstra que ainda há espaço para a chegada de mais investimento no país, mesmo após as estatais chinesas já terem investido US$ 18,3 bilhões nos setores de petróleo e energia do Brasil entre 2005 e 2012, segundo dados da Agência Internacional de Energia (AIE).

Ao partilharem da produção de Libra, caso alguma delas participe do consórcio vencedor, será diferente. A China terá acesso direto a uma parte do petróleo produzido no maior campo descoberto na área até agora e provavelmente acesso  a tecnologia da Petrobras – embora isso não esteja claro.

Na opinião de Alexandre Szklo, especialista em planejamento energético e doutor pela Coppe-UFRJ a participação de petroleiras asiáticas no leilão do campo de Libra deve demandar atenção da parte do governo brasileiro. Segundo ele estamos diante de uma espécie de “jogo de xadrez”, em que, de um lado, as petroleiras asiáticas têm a capacidade financeira necessária para investir, e, do outro, o Brasil tem o conhecimento tecnológico e o recurso energético. Para Alexandre Szklo, o Brasil tem que “dormir com o inimigo, mas de olho aberto”. Entre as “armadilhas” a serem evitadas estão apressar a produção e ficar à mercê da indústria chinesa, e perder o know-how tecnológico.

“A questão é como ter acesso a esse dinheiro, sem transferir conhecimento, sem a perda do domínio do recurso”, afirmou o pesquisador, que colaborou com a Agência Internacional de Energia (AIE) em um recente estudo sobre investimentos e transferência de tecnologia entre o Brasil e a China. “A Petrobras é muito ciosa disso também, corretamente eu diria. As empresas chinesas estão muito agressivas nessa questão de aquisição de tecnologia. A primeira plataforma semisubmersível na China só foi lançada no fim de 2011. As chinesas ainda estão lutando por dois objetivos: ter petróleo e adquirir capacitação tecnológica”.

Chama a atenção, entretanto, a ausência no leilão das gigantes americanas e britânicas na disputa. Segundo Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), se “Libra é a joia da coroa, como o governo afirma e eu concordo, faz todo o sentido as grandes petroleiras privadas ou públicas estarem aqui. O sucesso de um leilão se mede pela concorrência. Com uma joia da coroa desse tamanho, o governo só atraiu 11 empresas, sendo a maioria delas estatais. É preciso fazer uma reflexão sobre isso”, afirma ele.

O que resta de esquerda no PT?

Surpreendente nessa história toda é que seja o PT quem comanda a maior privatização da história brasileira. Comenta Ildo Sauer: “O governo do PT, que foi eleito se contrapondo às privatizações e à privataria anterior, está agora promovendo o maior leilão da história”.

Quando bater o martelo nessa segunda-feira no hotel Windsor Barra Hotel, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro privatizando Libra, um divisor de água se estabelecerá na história do partido. O PT antes de Libra e o PT pós-Libra. O PT repetirá o PSDB que em 06 de maio de 1997 privatizou a Vale contra a indignação de muitos que agora legitimam a privatização de Libra.

Ficará daqui para frente mais difícil para o PT carimbar a pecha de privatistas apenas noutras forças políticas. Passará o partido ao clube dos privatistas. Com Libra, o PT entra no grupo das forças políticas que aderem cada vez mais aos princípios liberais de organização do mercado. O partido abre mão de pensar estrategicamente e opta pela imediatez, apequena-se em seu papel de formulador de um projeto nacional que pense o país no longo prazo.

Depois do desmedido aliancismo, depois da flexibilização do Código Florestal, depois da destruição da política de demarcação de terras indígenas, depois do esvaziamento da Reforma Agrária, agora a privatização de Libra. Fica a pergunta: O que resta de esquerda no PT?

(Ecodebate, 21/10/2013) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.

[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]


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