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Artigo

A população da Grécia em 2100, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

A população da Grécia em 2100

 

[EcoDebate] A Grécia já foi um exemplo pioneiro de democracia e filosofia no mundo. Porém, a tão decantada democracia de Atenas estava restrita aos homens livres nascidos na cidade e excluia as mulheres, os trabalhadores (escravos) e os metecos (imigrantes). Portanto, o conceito de democracia era muito restritivo e deixava a maioria da população de fora dos direitos políticos e sociais.

Nesta concepção limitada de democracia, os tempos de glória da Grécia aconteceram há 2.500 anos, quando a civilização helênica incluia Grécia, Egito, Mediterrâneo e boa parte do Oriente Médio. A guerra do Peloponeso (431 a 404 a.C.), por exemplo, foi um conflito armado entre Atenas e Esparta que enfraqueceu o país, sendo que os tempos de glória terminaram em conflitos, na condenação de Sócrates, no fim da democracia e no aumento da pobreza.

Nos dois milênios seguintes, a Grécia perdeu sua identidade e tem sido dominada ou ameaçada por diversas potências estrangeiras. No ano de 197 a.C. os Romanos conquistaram as primeiras vitórias sobre a Grécia. A partir de 168 a.C. Roma conquistou o território grego, embora tenham recebido a influencia da cultura helênica. Com a divisão do Império Romano, a Grécia ficou sobre o dominío do Império Bizantino. Depois sofreu vários ataques dos Persas, Lombardos, Ávaros e Eslavos. Durante séculos a Grécia ficou dividida entre distintas dinastias. O ano de 1.453 marca o início da hegemonia do Império Otomano na região.

Com a chegada dos Otomanos (liderados pela atual Turquia), parte da população mais intelectualizada migrou para a Europa e parte saiu das planícies migrando para as montanhas. A Igreja Ortodoxa Grega foi uma instituição de ajuda e dominação da população. Em 1824 houve uma brutal repressão promovida pelos Otomanos contra a população grega. Entre 1821 e 1829, houve uma insurreição popular até a conquista da Independência. Durante os séculos XIX e XX, a Grécia lutou para defender suas fronteiras até alcançar sua configuração atual em 1947. Durante a Primeira Guerra Mundial a Grécia ficou junto aos aliados e contra a Alemanhã, a Itália e os Turcos-Otomanos.

Após o fim da 2ª Guerra, a Grécia passou por um período de guerra civil (entre comunistas e realistas/ monarquistas), que durou três anos (1946-1949), ocasionando milhares de mortes. Nas décadas seguintes a Grécia viveu um período de baixo crescimento econômico, ficando cada vez mais distante do padrão de vida europeu. Em 1967, houve um golpe militar e o início da ditadura grega. Em 1973, a monarquia grega foi abolida. Somente em 1975 houve o processo de redemocratização (Portugal, Espanha e Grécia venceram as ditaduras). Daí em diante o cenário político foi dominado pelo partido socialista – PASOK – que ganhou as eleições em 1981, promoveu a entrada da Grécia na União Europeia (1981) e adotou o Euro como moeda única em 2001.

Em 2004, Atenas sediou as primeiras Olimpíadas do terceiro milênio. Com a moeda única e o acesso ao crédito farto e barato a Grécia experimentou o maior aumento do padrão de vida de toda a sua tumultuada história. A renda média per capita da Grécia ultrapassou em três vezes a renda per capita da Turquia. Nunca a distância entre gregos e turcos foi tão grande e a favor dos gregos. A Grécia, vivendo de turismo, chegou a ter uma renda per capita quatro vezes maior do que a da China – pais de rica história e “fábrica do mundo” atualmente.

Portanto, a entrada da Grécia na União Européia e no Euro foi um impulsionador do padrão de vida da população e aumentou a importância do país no mundo. Porém, houve erro dos dois lados neste processo de integração da Grécia na União Européia. Os gregos erraram ao promoverem um padrão de vida acima das suas capacidades e os europeus erraram em financiar déficits crescentes nos primeiros 10 anos do século XXI. A Grécia acumulou déficits orçamentários e déficits comerciais crescentes. O montante da dívida pública ultrapassou 2 vezes o tamanho do PIB. O governo grego promoveu uma orgia de gastos para favorecer as grandes empresas, os setores religiosos e os funcionários públicos. Existem relatórios que mostram que um deputado grego ganhava mais do que um deputado alemão e cada representante legislativo da Grécia tinha dezenas de funcionários à disposição, além de empréstimos ilimitados e sem juros nos bancos oficiais.

A crise econômica que atingiu o mundo em 2008 foi particularmente danosa para a Grécia, pois afetou o turismo e provocou uma recessão (e redução da arrecadação de impostos) num momento em que as dívidas gregas continuavam aumentando. Atualmente a Grécia já está em seu quinto ano de recessão. Embora tenha conseguido vários pacotes de resgate financeiro, a crise continua. É grande o número de analistas que consideram que a Grécia precisa sair da Zona do Euro para poder desvalorizar sua moeda, desinflar a dívida e voltar a crescer.
Um lado perverso desta história é que, enquanto o país tem uma taxa geral de desemprego em torno de 25%, e o desemprego de jovens está na casa de 50%, as classes dominantes da economia estão retirando o dinheiro dos bancos gregos e depositando nos bancos suiços. A lógica deste comportamento é que as elites gregas esperam faturar muito quando acontecer a saída do Euro e a desvalorização da moeda grega. Ou seja, a recessão econômica vai continuar porque ninguém quer investir na Grécia na situação atual, nem mesmos os capitalistas gregos.

Portanto, além de toda a política econômica draconiana promovida pela troica: FMI, BCE e UE, a população da Grécia continua sofrendo com os seus políticos, suas elites econômicas e até a classe média que está retirando o dinheiro do país ou emigrando. Para agravar as políticas de austeridade da troica, os políticos gregos possuem fama de serem altamente corruptos e corruptíveis. A Grécia que entrou recentemente no bloco dos países desenvolvidos vai ter que voltar à condição anterior de país de renda média e de importância secundária no cenário internacional.

O fato é que o sonho de uma Europa próspera, pacífica, democrática, sustentável e harmoniosa está indo por água abaixo. São crescentes as divisões entre os países e as desigualdades sociais. O sistema do welfare state está sob ameaça de ruir. A crise européia é ruim para o mundo, para a Europa e para os países mais pobres da Zona do Euro. Segundo Alex Tsipras, líder da coligação da esquerda grega Syriza, 2013 será “o pior ano da recessão” na Grécia, dado a alarmante taxa de desemprego e o aumento do número de suicídios.

Este quadro de crise econômica e política afeta a dinâmica demográfica da Grécia. A população grega era de 7,6 milhões de habitantes em 1950 e passou para 11,4 milhões em 2010. Segundo a projeção média da ONU (feita antes do agravamento da crise), a população da Grécia deve chegar a 11,6 milhões em 2050 e 11,1 milhões em 2100. Na projeção baixa a população grega pode ficar em 7 milhões de habitantes em 2100.

A Taxa de Fecundidade Total (TFT) era de 2,3 filhos por mulher no quinquênio 1950-55 e caiu para o recorde de baixa de 1,3 filho por mulher no quinquênio 2000-05. No quinquênio seguinte a TFT subiu um pouco para 1,5 filho por mulher. Esta ligeira recuperação, entretanto, pode ser comprometida pela crise econômica atual. Se a fecundidade continuar muito baixa a população grega pode diminuir rapidamente nas próximas décadas, se aproximando da projeção baixa da ONU, pois a imigração está cedendo lugar à emigração.

Contudo, mesmo com toda a crise econômica, as taxas de mortalidade infantil continuam caindo, pois estava em 60 mortes para cada mil nascimentos em 1950, caiu para 4,6 mortes por mil e deve ficar abaixo de 3 por mil na segunda metade do século XXI. A esperança de vida ao nascer que era de 66 anos em 1950, chegou a 80 anos em 2010 e pode chegar a 88 anos em 2100, isto se a crise não reverter as tendências de ganhos nos anos de vida. Porém, o aumento da razão de dependência de idosos vai adicionar novas dificuldades para o país.

Por tudo isto, a Grécia precisa encontrar seu lugar no mundo e precisa de uma revolução interna e externa, para que o povo grego possa seguir o caminho do bem-estar em um mundo cada vez mais competitivo e com problemas ambientais cada vez mais graves. Para evitar a rota rumo a um “Estado falido”, acima de tudo, a Grécia precisa reinventar a sua democracia e aproveitar as vantagens da sua demografia.

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

EcoDebate, 08/02/2013


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