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SUS atende 2,5 vezes mais mulheres vítimas de violência do que homens

 

Violência contra mulher: SUS atende 2,5 vezes mais mulheres que homens. Foto de Marcello Casal Jr./ABr
Violência contra mulher: SUS atende 2,5 vezes mais mulheres que homens. Foto de Marcello Casal Jr./ABr

 

A violência contra mulheres no Brasil causou aos cofres públicos, em 2011, um gasto de R$ 5,3 milhões somente com internações. O dado foi calculado pelo Ministério da Saúde a pedido da Agência Brasil. Foram 5.496 mulheres internadas no Sistema Único de Saúde (SUS), no ano passado, em decorrência de agressões.

Além das vítimas internadas, 37,8 mil mulheres, entre 20 e 59 anos, precisaram de atendimento no SUS por terem sido vítimas de algum tipo de violência. O número é quase 2,5 vezes maior do que o de homens na mesma faixa etária que foram atendidos por esse motivo, conforme dados do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde.

A socióloga Wânia Pasinato, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP), destaca que além dos custos financeiros, há “enormes prejuízos sociais” gerados pela violência contra a mulher. Ela citou estudos que indicam, por exemplo, que homens que presenciaram cenas de violência doméstica durante a infância tendem a reproduzir, com mais frequência, características de dominação e agressividade em suas relações afetuosas.

“Os danos para a sociedade são enormes, com perdas em diversas esferas. Além de impactar a forma como os filhos dessas relações vão constituir suas próprias relações no futuro, as mulheres vítimas de violência deixam de produzir e de se desenvolver como poderiam no mercado de trabalho”, explicou, acrescentando que também é comum que as vítimas incorporem a violência e a agressividade em seus relacionamentos e nas formas de comunicação.

A diretora executiva do Instituto Patrícia Galvão, organização não governamental que atua em projetos de defesa dos direitos da mulher, Jacira Vieira de Melo, destacou que os números confirmam que, apesar de a Lei Maria da Penha, criada há seis anos, ser uma referência nacional e conhecida pela maioria da população, a violência contra a mulher ainda é um grave problema social. Ela defende que para enfrentar a questão é preciso fortalecimento das políticas públicas e incremento orçamentário.

“Pesquisas de opinião indicam que mais de 95% da população já ouviram falar na lei, que prevê punições severas para os agressores. Ela tem contribuído para que a violência contra a mulher cada vez mais seja vista como violação de direito fundamental, como crime, mas as estatísticas mostram que a questão continua sendo um grave problema social”, disse, lembrando que a violência é a maior causa de assassinatos de mulheres no Brasil.

Dados do Mapa da Violência 2012, estudo feito pelo sociólogo Julio Jacobo, atualizado em agosto deste ano, revelam que ,de 1980 a 2010, foram assassinadas no país quase 91 mil mulheres, das quais 43,5 mil somente na última década. De 1996 a 2010 as taxas ficaram estabilizadas em torno de 4,5 homicídios para cada 100 mil mulheres.

Disque 180 recebeu 47,5 mil denúncias de violência contra mulher no primeiro semestre

O casamento de mais de 20 anos não resistiu às constantes agressões verbais e físicas. Geralmente motivados por ciúme de “amantes imaginários”, os ataque intensificaram-se ao longo dos últimos sete anos até que, há cerca de um mês, a auxiliar de serviços gerais Marcela*, 39 anos, decidiu “dar um basta à violência”.

Depois de ser ameaçada pelo marido com um facão, ela foi até uma delegacia especializada de atendimento à mulher no Distrito Federal e denunciou o pai de seus três filhos.

“Era uma humilhação muito grande, principalmente quando as agressões ocorriam na frente dos meus filhos. Ele me xingava de tudo, de baleia, égua, capeta. Mas foi quando ele me ameaçou com um facão que eu vi que poderia virar uma tragédia maior. Decidi pedir ajuda”, disse ela, que foi encaminhada a uma casa-abrigo da região. O endereço do local, que faz parte da rede de atendimento do governo do DF é mantido em sigilo.

Casos como o de Marcela são frequentes no Brasil. Segundo dados da Secretaria de Políticas para Mulheres, o Disque 180, que recebe denúncias e oferece orientações às vítimas, registrou no primeiro semestre deste ano, 47,5 mil atendimentos com relatos de violência, sendo a maior parte (26,9 mil) de violência física.

Para vencer o medo, apontado por especialistas como principal razão para que muitas mulheres deixem de denunciar agressores, Marcela disse que pensou nos filhos.

“Por muito tempo, eu aguentei aquela humilhação por causa deles. Tinha medo de que sem o pai por perto, eles se metessem com a criminalidade da área onde morávamos. Mas depois vi que, se eu morresse, seria muito pior”, disse.

“Hoje, apesar de estar presa em um lugar sigiloso, me refazendo, sinto que estou livre. Não vou me esconder por muito tempo. Estou recebendo muito apoio lá dentro e em breve vou retomar minha vida”, acrescentou.

O medo de morrer também foi o que impulsionou a universitária Ana Barbosa*, 25 anos, a procurar uma delegacia para denunciar o homem com quem vivia há dois anos e meio. Cansada dos xingamentos e dos “ataques de ciúmes”, ela fugiu de casa ferida e “quase sem força física” após sofrer tentativa de sufocamento.

“Ele tentou me matar, apertando meu pescoço com muita força. Eu mal conseguia andar, mas fugi praticamente sem roupa e fui até a delegacia. Não aguentava mais aquela situação, mas eu era apaixonada por ele e não queria ficar longe”, disse ela, que também foi encaminhada a uma casa-abrigo no Distrito Federal.

As mãos trêmulas, a voz embargada e as lágrimas nos olhos ao falar do assunto são apenas algumas das consequências que o trauma deixou. Mesmo sem saber como será a vida após deixar o local, ela garante que não se arrepende.

“Não me arrependo porque eu não tinha saída. Ele ia me matar, estava transtornado. Ele costumava inventar histórias de traição e me batia e xingava. Seu eu não confirmasse as fantasias da cabeça dele e criasse outros detalhes, ele me batia mais”, disse.

* Os nomes utilizados na matéria são fictícios para preservar a identidade das vítimas.

Reportagem de Thais Leitão, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 26/11/2012

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