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Belo Monte: Esqueceram do custo socioambiental, artigo de André Villas-Bôas

 

[O Globo] A mais polêmica obra do PAC, a Hidrelétrica de Belo Monte, é parte de um projeto antigo do governo brasileiro, cujas modificações ao longo dos anos geram desinformação. A iniciativa do grupo de artistas que compõe o movimento gota d”água surge no momento em que o início da construção da obra suscita questionamentos. O vídeo dos artistas está provocando um debate amplo e necessário sobre a política energética do país.

Belo Monte é tida como a terceira maior usina hidrelétrica do mundo. No entanto, a energia firme de Belo Monte é de 4.571MW dos 11.233MW instalados. Sua eficiência energética é de aproximadamente 39% enquanto a média brasileira está entre 50% e 60%. Isso ocorre porque é necessário, ao desviar a água do Xingu para um lago artificial, garantir a manutenção de uma vazão mínima para os cerca de cem quilômetros da região da Volta Grande do Xingu, onde vivem índios e ribeirinhos que, apesar de não terem suas áreas alagadas, serão afetados.

O valor total da obra é incerto. De acordo com Norte Energia será de 27,46 bilhões de reais, porém já foram feitas estimativas muito diferentes disso. Historicamente grandes obras na Amazônia custam até duas vezes mais do que o anunciado inicialmente.

O tamanho da área alagada, de acordo com o edital do leilão de Belo Monte, é de 668km2, mas em 2009 registravam-se 440km2 e em 2010, 516km2. A destruição da floresta associada à Belo Monte, entretanto, será muito maior do que a área do lago, podendo chegar, nos próximos 20 anos, a 5.316km2.

Uma hidrelétrica é, geralmente, considerada geradora de “energia limpa”. Porém, os impactos socioambientais diretos e indiretos da construção de uma usina da magnitude de Belo Monte na Amazônia geram consequências que vão além da emissão de gases causadores de efeito estufa e das áreas afetadas diretamente com as construções. Deslocamento de milhares de pessoas, desmatamentos, acirramento de conflitos de terra em função da atração de pelo menos 96 mil pessoas para uma região com situação fundiária instável e sem infraestrutura.

Todos esses impactos poderiam ser previstos, compensados ou mitigados, caso os estudos tivessem sido feitos prévia e conclusivamente, e o processo de licenciamento previsto por lei respeitado. O tratamento da obra na lógica de fato consumado, sob o fantasma do apagão, fez com que direitos constitucionais dos diversos povos não fossem respeitados e investimentos preventivos não fossem realizados. O Estado se vê na contingência de remendar ações mitigatórias cuja conta não é agregada ao valor real da obra.

O Brasil deveria investir na diminuição da perda gerada nas linhas de transmissão, estimada atualmente em 20%, quantidade correspondente à geração de Belo Monte por ano e em outras fontes. A geração de eletricidade por biomassa tem potencial de 28 mil MW e o potencial eólico é de 143 mil MW. Com a média anual de radiação no Brasil entre 1.742 e 2.300 KWh/m2, apenas 5% da energia atenderia toda a demanda brasileira atual por eletricidade. O Brasil deve ainda considerar no planejamento energético a construção de hidrelétricas, porém de forma seletiva e considerando os custos socioambientais associados.

Falta vontade política para fazer investimentos em energias alternativas de forma a torná-las viáveis em curto prazo e para discutir de fato a política energética do país.

Artigo originalmente publicado em O Globo e socializado pelo ClippingMP

EcoDebate, 30/12/2011

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Alexa

One thought on “Belo Monte: Esqueceram do custo socioambiental, artigo de André Villas-Bôas

  • O articulista faz sérias críticas à questão sócio-ambiental da Usina Belo Monte. Tem razão, pois é impossível construir-se uma obra desse porte sem haver interferência no ambiente e na vida das populações próximas.
    Acontece que, se não for feita uma usina hidroelétrica desse porte, o Brasil terá dois caminhos a seguir: abandonar o progresso e se estacionar ou optar por outras fontes de energia.
    O articulista cita a diminuição da perda gerada nas linhas de transmissão, que ele estima em 20%, como alternativa a Belo Monte. Lembrando de nossas aulas de física, dizemos que é impossível o transporte de eletricidade sem perda. Em se tratando de um sistema elétrico do porte do brasileiro, em que se interligam fontes produtoras de eletricidade no Rio Grande do Sul e no Amazonas, essas perdas, necessariamente, são maiores. Portanto, é preciso reduzir as perdas, mas não nos iludamos que venhamos a conseguir perda zero.
    O articulista cita a produção de eletricidade por biomassa. O programa brasileiro de produção de álcool é elogiado em todo o mundo. No entanto, não devemos nos esquecer de que cada metro quadrado na produção de cana representa um metro quadrado a menos na produção de comida. Abandonar a energia hidráulica em benefício da energia de biomassa pode representar um aumento assustador no preço dos alimentos e colocar em retrocesso programas governamentais de combate à fome.
    Por tudo isso e considerando o enorme potencial hidráulico de que dispomos, não acredito que devamos abandoná-lo em virtude de impactos que, embora não sejam os mesmos, as outras fontes produtoras de energia também possuem.

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