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Menosprezo à Ciência: Provocação ou ignorância ? artigo de de Efraim Rodrigues

 

[EcoDebate] Esta semana fui provocado pela frase “a ditadura de especialistas é um pesadelo que não queremos sonhar” impressa em mídia nacional.

Há tempos venho colecionando evidências que vivemos uma nova época medieval e a desvalorização do conhecimento é mais um item para minha lista.

Especialistas não são boa matéria prima para ditadores porque seguem o conhecimento científico, que nada mais é do que bom senso assentado em camadas por milênios. Especialistas seguem a evidência dos fatos e se permitem mudanças de rota, de pensamento. Lidam bem com a contradição e oposição.

Bons ditadores têm que ter um verniz fino de conhecimento bem enviesado, aplicado em tenra idade, e têm que conviver por longo tempo com seus iguais para que quando crescerem sejam capazes de seguir obsessivamente uma única verdade.

O exemplo mais próximo de especialista é o médico. Para os que acham que é “ditadura” seguir o que o médico diz, que experimentem a ignorância de não seguir.

Desde criança resistimos a seguir o caminho melhor, geralmente também o mais difícil. Meus alunos resistem ler, meu filho resiste segurar a mamadeira sozinho. Não os recrimino muito por isso, a preguiça é inerente à condição humana, mas os tento colocar no caminho que traga o melhor resultado, ainda que com um pouco mais de trabalho hoje. A expressão “ditadura dos especialistas” soa a ressentimento juvenil com o trabalho ou estudo, enfim, aquele caminho que todos sabemos que é certo, mas que é menos atraente no curto prazo.

A expressão ecoa também em nível internacional, onde muitos julgam que a ciência compete com a fé religiosa. A fé só compete com a ciência na cabeça dos cientificamente mal treinados, que olham para conclusões cientificas sem entendimento das camadas que as antecederam e por isso as igualam aos dogmas religiosos, com origem totalmente diversa, mas não menos valiosa.

Se queremos avançar em todas áreas do conhecimento humano, incluindo o ambiente, precisamos ouvir o que os especialistas têm a dizer. Não porque eles sejam ditadores que irão nos obrigar a um caminho inadequado, mas porque eles pensaram em determinada questão por mais tempo que nós. Nem tampouco devemos ouvi-los porque eles trazem dogmas indiscutíveis, mas principalmente porque vêm aprimorando suas idéias ao longo de milênios, tirando o joio e pondo o trigo geração após geração.

No paraíso, o manobrista é inglês, o garçom é francês, e o cozinheiro italiano. Cada especialista com sua função. No inferno, o manobrista é francês, o garçom italiano e o cozinheiro é inglês.

Trocando em miúdos, o sonho que a Senadora Kátia Abreu quer sonhar é com os especialistas quietos nas Universidades, os ruralistas mandando no país e a população pagando quieta a conta.

Há algo de muito errado quando um Senador da República menospreza a ciência em um jornal de circulação nacional.

Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim@efraim.com.br), colunista do EcoDebate, é Doutor pela Universidade de Harvard, Professor Associado de Recursos Naturais da Universidade Estadual de Londrina, consultor do programa FODEPAL da FAO-ONU, autor dos livros Biologia da Conservação e Histórias Impublicáveis sobre trabalhos acadêmicos e seus autores. Também ajuda escolas do Vale do Paraíba-SP, Brasília-DF, Curitiba e Londrina-PR a transformar lixo de cozinha em adubo orgânico e a coletar água da chuva. É professor visitante da UFPR, PUC-PR, UNEB – Paulo Afonso e Duke – EUA

EcoDebate, 19/12/2011

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One thought on “Menosprezo à Ciência: Provocação ou ignorância ? artigo de de Efraim Rodrigues

  • Debora Wanderley

    Estamos vivendo sim a Idade Média. Tanto na cidade como nos campos, vemos feudos cercados por comunidades, quando não miseráveis, de uma pobreza de dar dó, batendo ás portas dos castelos, digo condomínio e prédios de luxo, cercados por muros, grades e seguranças. Não me admiro se muito em breve virmos fossos cercando as propriedades da “nobreza”. E as grandes propriedades rurais, estas são grandes mesmo verdadeiros feudos do agronegócio. Não temos duques e barões, ou será que temos? E as indulgências? -Será que tambem não as temos com outra roupagem?

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