EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

Vírus da podridão radicular coloca em risco segurança econômica e alimentar de africanos

 

Não há mais dúvida. Salvator Kaboneka confirmou com seus próprios olhos. “Estávamos fazendo uma visita de trabalho em diversos campos de mandioca no Burundi, e lá vi essa cor amarelada ao longo das nervuras da maioria das folhas”, conta esse agrônomo da FAO, a organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura. Há três anos, pairavam suspeitas da presença do vírus da podridão radicular sobre esse pequeno país da África Oriental. “Na terra, os tubérculos ainda não apodreceram, mas daqui a dois anos, isso acontecerá. Precisamos reagir!”, alerta o especialista.

Na vizinha Ruanda, a doença, ali também descoberta este ano, é mais sorrateira. “As plantas aparentavam estar em boa saúde, mas quando as tiramos da terra, descobrimos que os tubérculos estavam destruídos por dentro”, lembra Innocent Musabyimana, do Conselho de Agricultura de Ruanda (RAB). Reportagem de Sébastien Hervieu, Le Monde.

Junto com a República Democrática do Congo (a maior parte no Kivu, no leste do país), Burundi e Ruanda vieram se juntar oficialmente, em 2011, à longa lista dos países da região dos Grandes Lagos atingidos pelo vírus da podridão radicular. Por enquanto, nem 20% ou 30% dos campos parecem ter sido afetados nesses três países, mas nas regiões de Uganda, Tanzânia e Quênia próximas do lago Victoria, às vezes o índice é de 80%. “A doença está a ponto de se tornar uma epidemia”, alertou a FAO em um comunicado publicado em meados de novembro.

A segurança econômica e alimentar de dezenas de milhões de africanos está em risco. “Aqui no Burundi, a massa de mandioca, acompanhada de feijões, é um dos pratos nacionais”, lembra Salvator Kaboneka. “Os tubérculos são ricos em carboidratos, e as folhas em minerais”. Quase metade da população do Burundi cultiva algumas dezenas de ares desse arbusto cujas vantagens são preciosas. Ele cresce em solos pouco férteis, resiste à seca e produz o ano inteiro.

Surgido nos anos 1930, o vírus da podridão radicular era até então limitado às zonas costeiras desses países que beiram o oceano Índico ou à beira do lago Malawi. “Em mais de 70 anos, essa doença nunca havia se desenvolvido acima de 1.000 metros de altitude. Imagine minha surpresa quando, em 2004, eu a descobri nos campos em Uganda, a mais de 1.200 metros de altitude!”, se espanta James Legg, virologista no Instituto Internacional de Agricultura Tropical (IIAT), residente na Tanzânia. Como explicar essa súbita propagação? Os cientistas apontam um culpado: uma mosca branca, portadora do vírus, cuja população aumentou consideravelmente nos últimos anos na África Oriental.

Essa nova doença surge agora que os pequenos agricultores da região ainda estão se recuperando do mosaico, outro vírus que surgiu nos anos 1990 nas plantas de mandioca. “Quase todos os camponeses burundineses haviam sido afetados, mas, graças ao cultivo de novas variedades resistentes, estávamos saindo dessa”, explica Sébastien Ndikumagenge, diretor-geral de agricultura no Burundi, antes de maldizer: “Agora precisamos recomeçar tudo, pois essas variedades são vulneráveis à podridão radicular.” Ao contrário do mosaico, que prejudicava somente os rendimentos, o novo vírus torna a planta inteira (folhas, tubérculos) inconsumível tanto para humanos quanto para animais.

Para combater a podridão radicular, os governos dos países envolvidos estão preparando programas de conscientização de suas populações, para que elas possam reconhecer os sinais premonitórios da doença e arrancar as plantas contaminadas o mais rápido possível. As autoridades também querem limitar o trânsito de partes da planta, que passam de mão em mão, entre vizinhos, amigos ou membros de uma mesma família, para serem em seguida replantadas. Isso porque elas podem já estar contaminadas, tendo saído das raízes de outras plantas.

Mas, assim como no caso do mosaico, o declínio da podridão radicular dependerá da difusão em massa de variedades específicas. Residente em Dar-Es-Salam, na Tanzânia, o pesquisador do IITA Edward Kanju selecionou, entre aquelas que já são cultivadas, uma dezena de variedades mais tolerantes ao vírus. “Nessas plantas, os sintomas são fracos”, ele explica. “Mas são necessários ainda pelo menos dois anos de pesquisas, e um ou dois anos a mais para os outros países, pois uma variedade tolerante na Tanzânia não o será necessariamente em Uganda ou no Burundi”.

Daqui a cinco anos, e sujeitos a financiamentos, os pesquisadores também esperam poder fornecer variedades resistentes, notadas entre plantas selvagens de mandioca. Há também trabalhos em andamento para modificar geneticamente plantas de mandioca. Eles poderão ter resultados daqui a cerca de dez anos.

De Le Monde, no UOL Notícias.

EcoDebate, 12/12/2011

[ O conteúdo do EcoDebate é “Copyleft”, podendo ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário do Portal EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta clicar no LINK e preencher o formulário de inscrição. O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

Alexa