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Belo Monte: Um Questionamento, artigo de Ricardo Machado


[EcoDebate] Assisto consternado ao que vem acontecendo em nome de um suposto progresso a qualquer custo. Não temos muitos aliados neste momento no país.

Lendo o EIA/RIMA no capítulo de caracterização do Meio Biótico , documento disponível na internet, fiz as seguintes ponderações, principalmente com biólogos.

Os pontos são os seguintes:
– Não há especificações claras quanto as espécies migratórias
– No caso de endemismos, o EIA aponta vários casos, o que por si só bastaria para interromper o processo, mas não se fala mais nada a respeito disso, e as “medidas compensatórias” não apresentam  soluções, veja como está no EIA:

“Igualmente, é feita a abordagem sobre o ambiente de tensões ecológicas, que é uma região de contato entre dois biomas – no caso da bacia do Xingu, o Cerrado e a Amazônia. Esses biótopos são áreas de alta riqueza biológica entre os biomas do Cerrado e da Amazônia e apresentam espécies típicas de ambos e também espécies endêmicas, como os macacos sagüi Mico melanurus e Mico intermedius. Compreende a grande região que abrange o sul do Estado do Pará e norte do Mato Grosso. Os corredores ecológicos protegidos e as unidades de conservação e terras indígenas da AAR constituem, como se vê adiante, ilhas de biodiversidade, com áreas sob regime especial de proteção.” (p.6)

Mais adiante o próprio estudo aponta ainda pesquisas já realizadas sobre dados de endemismo no local:

Estudos biogeográficos de vertebrados terrestres (HAFFER, 1978, 1985, 1987; HAFFER e PRANCE, 2001; CRACRAFT, 1985) identificaram sete áreas de endemismo para as aves de terras baixas, todas contidas nos distritos biogeográficos propostos em 1852 por Wallace. A Guiana permaneceu como uma área de endemismo distinta, o distrito Equador foi dividido em dois (Imeri e Napo), o distrito Peru foi renomeado como Inambari e o distrito Brasil foi separado em três (Rondônia, Pará e Belém). Estudos recentes apóiam essa análise das áreas de endemismo (por exemplo, ÁVILA-PIRES, 1995, lagartos; SILVA e OREN, 1996, primatas; RON, 2000, anfíbios). Mais recentemente, Silva e colaboradores (2002), baseados em novas informações sobre a distribuição e taxonomia de algumas aves, sugeriram que a área de endemismo Pará é, na realidade, composta por duas áreas: Tapajós e Xingu, que correspondem à AAR do AHE Belo Monte. Assim, oito áreas de endemismo principais têm sido reconhecidas para os vertebrados terrestres na Amazônia, conforme pode ser visualizado

na FIGURA 7.2.1- 3.

As áreas de endemismo identificadas para borboletas florestais (BROWN, 1979; TYLER et al., 1994; HALL e HARVEY, 2002) e plantas vasculares (PRANCE, 1982) geralmente coincidem ou estão dentro das áreas propostas para os vertebrados terrestres, indicando uma boa congruência espacial para os padrões desses diferentes grupos taxonômicos. Para os invertebrados, com base em estudos de borboletas, Brown (1987) indica a presença de uma área de endemismo na região entre os rios Xingu e Tapajós (vide também MORRONE, 2004). No entanto, existem poucos inventários nessa região e é provável a existência de espécies endêmicas de outros grupos taxonômicos.”

Eles citam como fonte: ELETROBRÁS. Atualização do Inventário Hidrelétrico da Bacia Hidrográfica do Rio Xingu. Apêndice A. Volume I – Diagnóstico Ambiental. Tomo I – Físico-Biótico. São Paulo: Consórcio Engevix/Themag/Intertechne/Arcadis Tetraplan. Setembro de 2007.

E Apresentam a FIGURA 7.2.1- 3 – Áreas de Endemismo na Amazônia”

Este assunto está nas páginas p.7 e 8

Adiante apresenta-se algo mais chocante ainda as espécies ameaçadas de extinção que ocorrem no local

“7.2.5.3 Espécies Ameaçadas de Extinção Entre as espécies de vertebrados terrestres consideradas prioritárias para conservação destacam-se, entre as aves: a arara-azul-grande (Anodorhynchus hyacinthinus), a ararajuba

(Guaruba guarouba) e a choca-d’água (Sakesphorus luctuosus), 3 espécies consideradas vulneráveis no Pará; também o beija-flor-de-cinta (Thereneutes leucurus), a choca-lisa (Thamnophilus aethiops) e o bico-chato-da-copa (Tolmomyias assimilis), outras 3 espécies associadas à floresta ombrófila densa, classificadas como “em perigo” para o Estado, sendo todas já confirmadas para a área de influência da AHE Belo Monte; além de 3 espécies típicas de formações abertas do bioma Cerrado: mineirinho (Charitospiza eucosma), maria-corruíra (Euscarthmus rufomarginatus) e a águia-cinzenta (Harpyhaliaetus coronatus), tidas como vulneráveis no Pará, cujas distribuições abrangem as cabeceiras e nascentes da bacia hidrográfica do rio Xingu. Destacam-se também o macaco-aranha (Ateles marginatus) e o cuxiú-preto (Chiropotes satanas), ambos considerados em perigo pelo IBAMA e ameaçados pela IUCN, entre os mamíferos; e as tartarugas Podocnemis unifilis e Chelonoidis denticulata

são consideradas vulneráveis pela IUCN, entre os répteis. As tartarugas Podocnemis unifilis e Chelonoidis denticulata, consideradas amazônicas, sofrem pela perda de hábitat, mas, principalmente, em razão da pressão de caça sobre suas populações. Apenas uma espécie de anfíbio foi registrada como ameaçada para a região pela lista da SECTAM-PA.

Ressalta-se,entretanto, que, em razão da deficiência de dados, pouco se sabe a respeito do estado de conservação da maioria das espécies de anfíbios, principalmente das amazônicas.”

Na página 63 apresenta-se um quadro com as Unidades de Conservação que sofrerão impacto do empreendimento.
Baseado nisto exposto acima, tentando fazer um recorte biótico, pois a questão indígena é mais séria ainda, sugiro consultar o seu quadro jurídico na Lei de Crimes Ambientais  que em seu caput diz:

Lei 9605 de 12 de fevereiro de 1998.

“Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências”

Art. 2º Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.”

Numa interpretação lato sensu, não seria possível questionar judicialmente neste quesito legal?

Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Neste caso a sociedade civil não poderia interpelar?

Ainda nesta legislação encontramos como descrição de crime:

Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras:

Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção.

Art. 40. Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o art. 27 do Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização.

Belo Monte não é crime? Expliquem.

Ricardo Machado, Ambientalista, Administrador de empresas, Pos graduado em Planejamento e gestão ambiental

EcoDebate, 19/04/2011

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3 thoughts on “Belo Monte: Um Questionamento, artigo de Ricardo Machado

  • Parabéns Ricardo.

    Pelas excelentes observações a respeito do EIA de Belo Monte.

  • José Alberto Alvim

    Congratulações Prof. Ricardo.
    Vamos conseguir frear os criminosos.
    Excelentes apontamentos.
    UHBM, crime sócio-ambiental contra a humanidade e crime econômico aos cofres públicos.

  • É crime sim!!! Aqui no sul RS até mexer, mudar de lugar oudestruir um ninho do passarinho pardal, dá 6 meses até 2 anos de reclusão mais multa, imagine então tudo isso que o governo quer fazer!! Teria como fazer uma petção, alguma coisa mais legalizada contra Belo Monte? Por enquanto Avaaz estão c petições c várias assinaturas, greenpeace, mas seria o suficiente? A líder indígena disse que pode haver derramamento de sangue.

Fechado para comentários.