O desafio dos líderes, artigo de Montserrat Martins

[EcoDebate] A presidenta Dilma causou boa impressão mudando (em relação ao governo Lula) a política externa do Brasil quanto ao Irã, na defesa dos Direitos Humanos. Não sabemos que pressões internas ela possa ter sofrido em suas posições, mas o novo rumo nessa questão específica corresponde, sem dúvida, ao que a maioria da população espera de seus governantes. Também foi elogiada sua postura na visita de Obama, como boa anfitriã sem cair na subserviência mas também não provocando farpas desnecessárias, como alguns de seus partidários gostariam. É em episódios singulares como estes (em que demonstra não ser uma simples sombra de Lula ou do seu partido) que se vislumbra o seu próprio estilo de liderança.

Obama, por sua vez, precisa demonstrar que é capaz de corresponder às esperanças em torno dele. Enfrenta um jogo duríssimo com a oposição conservadora de seu país, que não aceita sequer que a população tenha direito ao plano de saúde pública que ele lançou. Motivo pelo qual o seu carisma internacional não tem sido suficiente, ainda, para aplacar o boicote que sofre dos republicanos, os quais ainda lhe impuseram uma derrota nas eleições parlamentares. Para se sustentar, terá de ser capaz de desenvolver habilidades que o tornem tão bem sucedido “em casa” como é fora, em termos de popularidade. Que também está sendo testada nas relações do seu país com o mundo, agora, tendo de provar que não quer transformar o que seria um “apoio humanitário contra o genocídio”, na Líbia, em uma guerra que se compare à do Iraque, caracterizada pela ocupação do país.

Também está em época de provações a presidenciável Marina Silva, por motivos diferentes, pois seus dilemas são internos ao seu próprio partido. A começar pelos estatutos desatualizados, concentradores de poder na burocracia partidária, o que não tem como ser “sustentável”, para quem durante a campanha apregoou políticas “do século XXI”. Daí a especulação de que ela saia para fundar um novo partido, no qual seria acompanhada por Gabeira e outros líderes verdes dentre os com maior votação popular. A situação, se formos examinar bem, não é tão diferente das instituições do nosso país como um todo, que precisam ser reformadas em seus burocratismos. Por isso, o seu verdadeiro desafio não é criar um partido novo e sim demonstrar a capacidade de transformar realidades burocráticas, análogas às que teria de enfrentar caso tivesse sido eleita.

Nesses exemplos práticos, podemos constatar que a “liderança” requer habilidades que vão além do senso comum, do modo habitual que temos de classificar as outras pessoas como aliadas ou adversárias, como quem nos “ajuda ou atrapalha” em nossas vidas. O “maniqueísmo” consiste em dividir as pessoas em “boas” ou “más” de acordo com as necessidades pessoais de cada um de nós, a cada momento. Liderar, ao contrário, é ter a habilidade de lidar com situações nas quais não se tem a maioria formal nas instituições e mesmo assim conquistar o apoio da opinião pública para as mudanças necessárias.

O desafio dos líderes não é derrotar adversários, é transformar possíveis “inimigos” em eventuais “aliados” da evolução social. No melhor conceito de política, ela é mais que a arte do embate ou da estratégia, ela é a arte do debate e do convencimento. As pessoas e os fatos aqui citados são meros exemplos ilustrativos porque, como diz um célebre pensamento, “mentes pequenas discutem pessoas, mentes médias discutem fatos, grandes mentes discutem idéias”. No caso, o conceito de liderança.

Montserrat Martins, colunista do EcoDebate, é Psiquiatra.

EcoDebate, 04/04/2011

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