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Eleições 2010: Poucos candidatos aderem à campanha em defesa do Rio São Francisco

Encontrar políticos e candidatos a cargos públicos dispostos a abraçar as causas populares não é uma tarefa nada fácil. A Articulação Popular São Francisco Vivo constatou isto quando decidiu pedir a todos os candidatos ao parlamento, ao governo dos estados da Bacia do São Francisco, assim como aos presidenciáveis, que apoiassem as propostas que afetam a vida do rio e da população que vive em torno da Bacia.

Diante do balanço frustrante realizado ao fim da campanha (17), Ruben Siqueira, sociólogo, membro da Comissão Pastoral da Terra da Bahia e coordenador do Projeto Articulação Popular para a Revitalização do São Francisco, questiona se as propostas da campanha são “radicais demais para esta época de consensos mornos”. Em entrevista à Adital, Ruben falou a falta de apoio e enumerou as principais necessidades do rio e da população que vive dele. Entrevista realizada por Natasha Pitts, da Adital.

[Leia na íntegra]Adital – A Articulação Popular São Francisco Vivo decidiu levar suas propostas aos candidatos de Salvador. Como surgiu a ideia?

Ruben Siqueira – Nem tanto aos candidatos de Salvador, mas a todos os candidatos ao parlamento e ao governo nos estados da Bacia do São Francisco (MG, BA, PE, AL e SE), além dos candidatos à Presidência da República. Trata-se de todos os que poderão se tornar mandatários, cuja ação ou omissão no exercício do mandato terá impacto na vida do rio e do povo que vive na Bacia.

A ideia surgiu, nos encontros e reuniões da Articulação, fruto de duas constatações. A primeira é o esvaziamento da campanha eleitoral, a mercê do marketing publicitário, da ausência do debate de ideias e propostas reais para resolver os graves problemas vividos pela população. A segunda é a necessidade de dar visibilidade aos problemas e desafios da Bacia e às bandeiras e propostas da Articulação. Há cinco anos esta Articulação vem tentando juntar forças em torno dos problemas sociais-ambientais do São Francisco e das experiências e iniciativas populares de revitalização, mas isto tem dificuldade de impactar, pautar, envolver os políticos da região. Há um abismo crescente e angustiante entre a política e a vida.

Adital – Desde o lançamento desta campanha, o que foi feito para divulgá-la e consequentemente para chamar a atenção dos candidatos?

Ruben Siqueira – A própria construção da iniciativa e do documento de propostas foi um processo interessante, pela tomada de consciência entre os participantes da articulação deste quadro político e pela definição do que eram nossas principais reivindicações.

A divulgação se deu pelos meios disponíveis – correio eletrônico, telefone, presencialmente, por exemplo, em debates ou quando topamos os candidatos em campanha. As entidades e militantes que fazem parte da Articulação fizeram este trabalho em suas regiões e estados.

Adital – O prazo para a adesão dos candidatos termina na sexta-feira (17). Já é possível fazer um balando do resultado?

Ruben Siqueira – O balanço que estamos fazendo é frustrante. Os retornos explícitos dos candidatos são bem poucos. Houve mais compromisso “de boca” e promessa de assinar e enviar o documento. Mas isto pouquíssimos fizeram até agora e são os dos pequenos partidos de esquerda. O que nos leva a pensar como realmente é sério o divórcio entre os políticos e os movimentos sociais.

Nos perguntamos se nossas propostas são radicais demais, para esta época de consensos mornos: reforma agrária, limite da propriedade da terra, reconhecimento dos territórios tradicionais, moratória para o Cerrado e Caatinga, defesa do código florestal, suspensão de barragens e da transposição, obras hídricas descentralizadas na região semiárida (Atlas da Agência Nacional de Águas), água como direito humano, revitalização verdadeira, marco regulatório da mineração… Pensamos que sendo de eleitores as numerosas comunidades que enfrentam estes problemas e lutam por estas mudanças, os políticos em geral se interessariam. Parece que hoje eles têm outros meios de conseguir o voto e estes compromissos vão lhes causar problemas…

Adital – Antes desta iniciativa, já havia candidatos/políticos que apoiavam a causa?

Ruben Siqueira – Nos embates em torno do São Francisco, contamos atualmente com poucos políticos de fato comprometidos. Específica e pontualmente, têm alguns poucos ligados à questão, por exemplo, dos quilombolas, da mineração, da convivência com o semiárido, etc. Temos também referência nos parlamentares que pautam a questão ambiental em geral e, mais, nos que se solidarizaram com a luta contra a transposição, na época dos jejuns de Dom Luiz Cappio.

Adital – Quando será feita a divulgação dos resultados de quem apoiou, que não respondem e quem se negou a apoiar a causa?

Ruben Siqueira – Pensamos em imprimir e divulgar massivamente o documento, quando o lançamos, mas optamos por deixar isso para depois, com os nomes dos candidatos que o assumiram. É o que faremos proximamente. Em vista das dificuldades vamos continuar recebendo adesões após o prazo de 17/9 [entrevista realizada no dia 16 de setembro de 2010]. E a partir da semana que vem, vamos divulgar os nomes dos que se comprometeram sugerindo que estes merecem ser votados. Na medida em que outros chegarem, divulgaremos.

Adital – Após as eleições, como pretendem cobrar os político que firmaram compromisso com a situação da Bacia do Rio São Francisco?

Ruben Siqueira – Nossa intenção é estreitar os laços com estes comprometidos, manter permanente contato com eles, continuar pautando-os com nossas denúncias e propostas. Mas sem firmar nenhuma condição de reciprocidade de apoio eleitoral nosso. Claro que, conforme o desempenho deles e a relação que tiverem de respeito à autonomia dos movimentos sociais, serão os políticos que a população sanfranciscana ligada à Articulação deve continuar livremente votando.

Mas, o desafio que está posto é o de recriarmos os espaços e as relações coletivas de poder, superar a inversão operada, de que a sociedade organizada e mobilizada está a serviço do poder de grupos partidários, o que tem significado esvaziamento, controle e neutralização das demandas e lutas. Pior é achar que não carece mais ter movimentos sociais, pois o governo “popular” vai resolver tudo… Temos urgentemente que recuperar a construção do poder popular para além dos políticos profissionais e das estruturas formais da política e do Estado. Esta é a finalidade última – político-educativa – desta campanha da Articulação Popular São Francisco Vivo.

EcoDebate, 01/10/2010

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