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Países do sudeste asiático culpam a China, e não a natureza, pela seca

Aldeão caminha em que um lago secou em Luliang, na província de Yunnan, na China
Aldeão caminha em que um lago secou em Luliang, na província de Yunnan, na China. Foto NYT

No sul da China, a pior estiagem dos últimos 50 anos secou as plantações dos agricultores e deixou dezenas de milhões de pessoas sem água. Mas a seca também criou um grande problema de relações públicas para o governo chinês nos países vizinhos, onde nos anos recentes a China vem tentando projetar uma imagem de benevolência e fraternidade.

Agricultores e pescadores de países que compartilham o rio Mekong com a China, especialmente da Tailândia, atacaram a China por causa de quatro represas que aumentaram a porção chinesa do rio de 4.830 quilômetros, embora evidências científicas aparentemente sólidas indiquem que a falta de chuvas é a responsável pelos baixos níveis do rio, e não as estações hidrelétricas chinesas. Reportagem de Thomas Fuller, de Bancoc (Tailândia), The New York Times.

Este fim de semana, quatro países afetados – Mianmar, Laos, Camboja e Vietnã – se encontraram na Tailândia para discutir a seca, entre outros assuntos. A Tailândia irá requisitar “mais informações, mais cooperação e mais coordenação” da China, diz Panitan Wattanaygorn, porta-voz do governo.

A China começou uma campanha para tentar combater a percepção de que suas represas estejam sequestrando a água do Mekong no trajeto do rio, do Platô Tibetano ao Mar do Sul da China. Autoridades chinesas, normalmente avessas à mídia, recentemente fizeram uma coletiva de imprensa e apareceram em seminários, incluindo um na quinta-feira, para defender sua visão de que a seca é um fenômeno puramente natural.

“Mais informações podem ajudar a reduzir os equívocos”, diz Yao Wen, o chefe da seção política da da Embaixada chinesa em Bancoc.

Ele apresentou fotos de margens do rio banhadas pelo sol e poços secos no seminário, incluindo uma de um homem sentado próximo às rachaduras no leito seco do rio. “Este velho era um barqueiro, mas agora ele não tem nada para fazer”, disse Yao aos participantes.

A última imagem foi a de uma criança olhando fixamente para um balde. “Você pode ver como a seca é séria”, disse ele. “É uma situação muito, muito terrível.” Ainda assim, muitos na sala continuaram a falar sobre as hidrelétricas chinesas. Yao ouviu os pedidos comovidos de moradores do norte da Tailândia para impedir novas construções no rio.

“É lá que pescamos, que conseguimos comida”, diz Pianporn Deetes, tailandesa que faz campanha para o grupo ambientalista International Rivers. “É lá que alimentamos nossas famílias.”

Ela culpou as represas chinesas e a aceleração das correntezas para tornar o rio mais navegável pela redução dos peixes, e criticou os planos de construção de mais represas sem consultas públicas transparentes.

De acordo com uma contagem recente, há mais de 80 projetos de represas em vários estágios de planejamento e construção no Mekong e seus tributários.
“Como vocês podem decidir sem nos ouvir?”, perguntou Pianporn, nativa da província de Chiang Rai, no norte da Tailândia.

E em várias outras partes do mundo, a política de divisão de águas está repleta de tensão. Dentro da Tailândia, onde a seca afetou pelo menos 14 mil vilarejos, um oficial descreveu “guerras de água” entre os agricultores para manter suas plantações vivas.

Mas as discussões entre os países que compartilham o Mekong são mais complicadas. Uma abordagem comum em relação ao planejamento futuro do rio implica acomodar a sociedade vívida e sem restrições da Tailândia, a ditadura militar de Mianmar, a democracia autoritária do Camboja e os sistemas comunistas do Laos e do Vietnã. Muitos tailandeses continuam particularmente desconfiados dos planos chineses para o Mekong, chamado de Lancang em chinês.

Um professor no seminário na quinta-feira introduziu uma pergunta a Yao, o diplomata chinês, assim: “Percebo que é difícil para você falar livremente – você seria assassinado depois dessa conferência se falasse livremente.”

Alguns conservacionistas atribuíram os baixos níveis do rio em parte à construção da quarta hidrelétrica chinesa no Mekong, em Xiaowan. A hidrelétrica começou a encher sua represa em julho, durante a estação das chuvas, disseram oficiais chineses, num processo que foi interrompido com a chegada da estação seca.

Nas últimas semanas, à medida que a falta d’água se tornou aguda e a navegação em alguns pontos do Mekong se tornou impossível, a China soltou água de suas represas, aumentando o nível do rio, de acordo com Jeremy Bird, diretor-executivo da Comissão para o Rio Mekong, um conselho montado em 1995 pelos governos do Camboja, Laos, Tailândia e Vietnã. A China e Mianmar não são membros mas têm alguns acordos para compartilhar informações.

No geral, Bird diz que a China tem uma “capacidade limitada” de reverter os efeitos da seca para os países ao longo do rio. O Mekong, diz ele, sempre foi volátil. “Secas e inundações intensas sempre aconteceram desde há muito tempo”, diz ele.
Bird e outros especialistas dizem que as hidrelétricas na parte baixa do rio, incluindo uma planejada no Laos, poderiam ter um efeito prejudicial sobre os peixes migratórios e causar outros problemas.

Mas no geral, Bird disse que acredita que mais hidrelétricas na China poderiam equilibrar as variações sazonais do Mekong guardando água quando o rio está cheio e liberando quando ele está vazio.

Para Pianporn, que diz que aprecia a beleza natural do rio e sua abundância de peixes, esse argumento não é persuasivo.

“Não precisamos de mais água durante a estação seca, e não precisamos de menos água durante a estação chuvosa”, diz ela. “Gostaríamos de ver a água tal como ela é.”

Tradução: Eloise De Vylder

Reportagem [Countries Blame China, Not Nature, for Water Shortage] do New York Times, no UOL Notícias.

EcoDebate, 06/04/2010

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