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São as Águas de Março: Dez anos da ASA, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

A cisterna de placas é uma construção de baixo custo e técnica simples, feita de placas de cimento pré-moldadas, construídas na própria comunidade, com formato cilíndrico, coberta e semienterrada. Seu funcionamento prevê a captação de água da chuva, aproveitando o telhado da casa, escoando através de calhas (bicas) até o reservatório. Cada cisterna tem capacidade de armazenar 16 mil litros de água, quantidade suficiente para uma família de 5 pessoas beber, cozinhar e escovar os dentes, por um período de 6 a 8 meses – época da estiagem na região. Foto: Roberta Guimarães/ASA
A cisterna de placas é uma construção de baixo custo e técnica simples, feita de placas de cimento pré-moldadas, construídas na própria comunidade, com formato cilíndrico, coberta e semienterrada. Seu funcionamento prevê a captação de água da chuva, aproveitando o telhado da casa, escoando através de calhas (bicas) até o reservatório. Cada cisterna tem capacidade de armazenar 16 mil litros de água, quantidade suficiente para uma família de 5 pessoas beber, cozinhar e escovar os dentes, por um período de 6 a 8 meses – época da estiagem na região. Foto: Roberta Guimarães/ASA

[EcoDebate] Enquanto as obras da transposição do São Francisco avançam, pondo em evidência suas contradições, a Articulação no Semi-árido Brasileiro (ASA), completa dez anos. De 22 a 26 acontecerá o ENCONASA (Encontro Nacional da ASA), em Juazeiro, Bahia.

A ASA trouxe para o cenário nordestino o que alguns estudiosos, inclusive Celso Furtado, já indicaram há muitos anos atrás. É possível “conviver com o clima semi-árido”. E o próprio Celso Furtado, na criação da SUDENE em 1959, já dizia que “as populações mais vulneráveis ao clima eram as dispersas pelo sertão nordestino”. Portanto, ele sabia que o industrial, fazendeiro, pessoas de posse, não sofriam os impactos do clima, porque tinham condição de enfrentá-lo adequadamente.

O que a ASA fez, numa articulação de aproximadamente setecentas entidades, foi pôr em prática – com uma série de tecnologias apropriadas à região, acompanhado por um trabalho educacional -, a lógica de convivência com a região e não de combate à seca. Promoveu dois programas básicos que vão à raiz do problema fundamental dessas populações, isto é, a fome e a sede.

O programa P1MC (Projeto um milhão de cisternas) e P1+2 (Projeto uma terra e duas águas) tem por foco exatamente abastecer essas populações com segurança hídrica e segurança alimentar. As tecnologias de captação de água de chuva, tanto para beber como para pequenos cultivos ou para dessedentar pequenos animais, tem dado um resultado fantástico, mesmo estando longe de serem concluídos. Hoje, segundo dados oficiais, foram construídas aproximadamente 340 mil cisternas para abastecimento humano e outras para cultivar pequenas hortas ou dessedentar animais. O impacto na melhoria da saúde dessas populações, no alívio do trabalho feminino de buscar água, como uma certa estabilidade hídrica – tão simples! – fez com que não ouvíssemos mais falar em “saques, migrações intensas, frentes de emergência”, realidades tão tenebrosas até poucos anos atrás. A positividade dessas tecnologias foi testada e comprovada inclusive pela FIOCRUZ.

Para uma real convivência com o semi-árido seria ainda necessário implementar as adutoras para os centros urbanos, como prevê o Atlas do Nordeste da Agência Nacional de Águas (ANA) e fazer uma reforma agrária adequada ao semi-árido. Porém, o governo Lula priorizou a Transposição de Águas do São Francisco, também retirou poder da sociedade civil – dois projetos citados – para redirecioná-los para prefeituras e governadores. Essa deveria ser a lógica, se não houvesse a indústria da seca até hoje.

Entretanto, há que se caminhar em frente. Diante de novos desafios, como a mudança climática, o “ovo de Colombo” da região semi-árida já foi posto de pé. Apesar de muitas falhas, a ASA tem feito história e tem muito a comemorar, juntamente com cerca de 1,5 milhões de pessoas da região beneficiadas por esse trabalho.

Roberto Malvezzi (Gogó) é Assessor da Comissão Pastoral da Terra – CPT, colaborador e articulista do EcoDebate.

EcoDebate, 23/03/2010

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