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Consciência Negra: Zumbi e Palmares, a resistência negra contra a escravidão

Consciência Negra: Zumbi e Palmares, a resistência negra contra a escravidão

O negro é uma folia/ de dores e sentimentos/ é corpo velho salgado/ é jovem querendo vento/ é busca de liberdade/ em canto, guerra e lamento” (Como negro – Paulo Ricardo de Moraes)

Os descendentes de Zumbi, como o poeta e jornalista Paulo Ricardo de Moraes, autor do poema Como Negro, publicado no livro O Garçom e o cliente – no Balcão do Naval, carregam o DNA libertário do último rei do quilombo dos Palmares. A luta de Zumbi pela liberdade absoluta atravessa mais de três séculos como uma das principais bandeiras de resistência à escravatura, à subjugação e à exploração da mão-de-obra. Por isso, Zumbi e o quilombo dos Palmares continuam inspirando poetas e servindo de exemplo para novas frentes de batalha em busca da plena cidadania.

O quilombo dos Palmares não foi apenas uma “sociedade guerreira”. Foi também um tipo de organização social que se contrapôs ao modelo colonial imposto por Portugal ao Brasil.

Essa república negra dentro do estado escravagista brasileiro nasceu com a fuga de 40 escravos de um engenho de Porto Calvo, no sul de Pernambuco. Depois de massacrar a população livre do engenho, eles se afastaram da Zona da Mata, e chegaram à Serra da Barriga, região hoje pertencente a Alagoas, onde começaram a erguer Palmares.

No seu auge, o quilombo ocupou cerca de 27 mil quilômetros quadrados e teve 20 mil pessoas, que trabalhavam de forma coletiva. Estava localizada numa área fértil, banhada por rios, com flora e fauna variada. Sua população vivia em casas cobertas de madeira ou palha, espalhadas em vários núcleos habitacionais (mocambos). Os quilombolas de Palmares produziam milho, batata-doce, mandioca, feijão e banana e também se dedicarem à caça, à pesca e à criação de galinhas e suínos. Além disso, dominavam a técnica da metalurgia e alguns eram artesãos.

Zumbi nasceu em um dos mocambos que formavam Palmares. Segundo historiadores, ele foi capturado recém-nascido por uma das diversas expedições militares feitas para dominar o quilombo. Em 1655, de acordo com livros que reconstituem a história do quilombo, Zumbi foi dado ao padre Antonio de Melo, do distrito de Porto Calvo. Passou a ser chamado de Francisco, foi alfabetizado e chegou a estudar latim. Embora fosse bem tratado pelo religioso, que o fez coroinha aos dez anos, Zumbi fugiu com um grupo de escravos e retornou a Palmares em 1670.

De volta ao quilombo, narram os historiadores, Francisco se desfaz do nome cristão – símbolo de sua condição escrava – e passou a se chamar Zumbi – palavra de origem africana que significa “Deus da Guerra”, “Fantasma Imortal” ou “Morto Vivo”. Embora tivesse apenas 15 anos, ele começou a se destacar como chefe militar, o que o levou depois ao mais alto posto: o de rei de Palmares. Zumbi substituiu Ganga Zumba, deposto por ter assinado um acordo de paz com a Coroa portuguesa. O jovem guerreiro foi contra esse pacto, por entender que os brancos não iriam cumpri-lo.

Sob o comando de Zumbi, Palmares também rejeitou o acordo de paz proposto pelo rei português Pedro II, em 1685. O monarca chegou a enviar carta ao líder negro, na qual reconhecia as maldades praticadas por alguns senhores em desobediência às suas ordens.

Enquanto isso, permanecia o cerco permanente a Palmares e a caça a Zumbi. Os senhores de engenho da região jamais se conformaram com a existência do quilombo, com sua prosperidade e sua organização social. Em 1693, o paulista Jorge Velho, conhecido pela brutalidade com que caçou índios durante o movimento das bandeiras, organizou uma expedição para atacar Palmares, que foi dominado em 1694.

Zumbi conseguiu sobreviver ao ataque e se escondeu na mata. Em 20 de novembro, ele foi atingido com uma punhalada desferida pelo mulato Antônio Soares, que até então era de sua inteira confiança. Soares foi capturado pelos expedicionários, torturado e recebeu a promessa de ganhar a liberdade se levasse o grupo de paulistas até o esconderijo do líder negro. Ferido, Zumbi acabou morto pelos expedicionários. Seu corpo foi levado para Porto Calvo e decapitado por ordem do governador da capitania de Pernambuco, Melo e Castro.

A cabeça de Zumbi foi salgada e espetada num pedaço de pau na principal rua de Porto Calvo, onde ficou até se decompor por inteiro. A luta do líder negro e de Palmares, entretanto, atravessou o tempo e foi definitivamente resgatada a partir de 1971, no Rio Grande do Sul, pelo poeta negro Oliveira Silveira. Herói da luta contra a escravidão, Zumbi segue habitando o imaginário de seus descendentes e levando-os a louvar a resistência negra no Brasil:

“O negro é como uma folha/ que responde a ventania/ balança, dança e não morre/ tem a briga por mania/ é lindo que só o tempo/ é feito de poesia…” (Como negro – Paulo Ricardo de Moraes)

Reportagem de João Carlos Rodrigues, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 21/11/2009

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