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Em 2009 a mobilização indígena será a maior da história do Fórum Social Mundial

Indígena da etnia Caiapó faz pintura em participante do Fórum Social Mundial Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr
Indígena da etnia Caiapó faz pintura em participante do Fórum Social Mundial Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr

Belém será o destino de cerca de 3 mil índios e índias de todo o mundo que irão debater sobre a realidade dos indigenas do mundo e pedir apoio de toda humanidade para lançar uma campanha em defesa do planeta

Cerca de 27% do território amazônico, formado pelos nove países da Pan Amazônia, é ocupado por terras indígenas e 10% de toda a população da América Latina, o equivalente a 44 milhões de pessoas, é composta por 522 povos tradicionais de diferentes etnias. São crianças e adultos protagonistas de uma luta de resistência e que sofrem perdas irreversíveis provocadas pelo capitalismo neoliberal predatório, impulsionado pela expansão das atividades de empresas multinacionais – mineradoras, petrolíferas, hidrelétricas, madeireiras, sojeiras, entre outras – , sobre as reservas indígenas.

Essa realidade, assim com a campanha mundial em defesa do planeta, está na agenda dos indígenas durante a 9a edição do Fórum Social Mundial, que será realizado de 27 de janeiro a 1º fevereiro, na Universidade Federal do Pará (UFPA) e Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), em Belém, Pará, Brasil.

No Peru, das seis mil comunidades que habitam a Amazônia Andina, três mil estão ameaçadas pela exploração mineral realizada por empresas como a multinacional brasileira Vale. O alerta é da liderança indígena Nancy Iza, integrante da Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (COICA), que reúne movimentos indígenas de toda Pan Amazônia. “A mineração é atualmente o maior e mais grave problema enfrentado pelos povos da região Andina, que além de perder seus territórios já desertificados e improdutivos, onde os leitos de muitos rios foram desviados de seu curso normal, ainda convivem com as doenças provocadas pela substancia tóxica do mercúrio (utilizado na atividade mineral) que contamina o solo e as águas”, conta.

Diante desta trágica realidade vivenciada pelos indígenas, muita gente ainda não foi capaz de perceber que, ao contrário do que se imagina, a luta destes povos não se restringe à sua soberania e sobrevivência, mas a de todo o planeta. “O problema indígena afeta a humanidade, o Brasil e toda a população amazônica”. A afirmação é de Roberto Espinoza, uma das lideranças que coordena a participação dos povos indígenas no Fórum Social Mundial 2009, que acontece em Belém do Pará de 27 de janeiro a 1° de fevereiro.

Como membro da Coordenadora Andina das Organizações Indígenas (CAOI), entidade que desde 2006 encabeça a luta pelos direitos indígenas, Espinoza explica que o FSM 2009 permitirá trazer a público uma realidade que para as comunidades indígenas não é mais novidade. “Com o respaldo do Estado, assegurado por incentivos fiscais e ausência de projetos de preservação ambiental, estas multinacionais se apropriam de forma desenfreada das riquezas naturais da Amazônia e colocam os povos tradicionais a mercê do capital “neocolonialista”. Transformam as terras indígenas em meras depositárias e exportadoras de matéria prima. No povoado de Oroya, no Peru, 40 crianças foram diagnosticadas com doenças tóxicas, provocadas pelo contato com mercúrio, utilizado na extração mineral”, denuncia.

Às vésperas do maior encontro da sociedade civil organizada e movimentos sociais, entidades e organizações não governamentais de mais de 150 países, a capital paraense assume, estrategicamente, seu posto de porta voz de toda a Pan Amazônia para reunir durante seis dias a maior representatividade global dos povos tradicionais de toda a história do FSM, já no seu 9° ano de realização. A expectativa é receber aproximadamente três mil participantes indígenas de diferentes etnias de todo o globo, tanto da Pan Amazônia, quanto de outras partes do mundo como América do Norte, África e Índia.

“Vai ser a nossa oportunidade de falar da Amazônia, região para onde o mundo inteiro foca suas atenções, a partir dos povos da Amazônia. Por isso, o nosso grande empenho em garantir que a representação destas comunidades tradicionais seja qualitativa e quantitativa”, ressalta Aldalice Otterloo, membro do Grupo de Facilitação do FSM.

Sem dúvida a participação indígena será um marco de toda a mobilização em defesa da vida, da Amazônia e do planeta, conforme orienta a carta de princípios e os 10 objetivos do FSM 2009. Vale ressaltar o fato de que neste cenário altermundista de discussões sociais e ambientais os indígenas se destacam não como oprimidos ou minoria, mas como povo constituído de direitos coletivos, com poder de mobilização e capaz de ir à luta por aquilo que acredita. Embora desrespeitados, estes direitos foram assegurado em 1980 pela Organização Internacional do Trabalho, por meio da Convenio 169 e ainda pela Declaração da Organização das Nações Unidas (ONU), os quais reconhecem as demandas destes povos e a necessidade de serem consultados sobre qualquer projeto que envolva seus territórios.

O lema das lideranças indígenas é vencer a passividade e não mais se calar diante das injustiças e desmandos impostos pelo capitalismo praticado pelos governos e empresas. Mas, para discutir e denunciar os agressores e apontar as alternativas diferentes de sustentabilidade, os movimentos indígenas também lutam contra a descriminalização social que ainda recai sobre sua causa. Motivo pelo qual o FSM será um espaço uníssono para mostrar que a mobilização indígena deve ser abraçada por toda a sociedade e povos do planeta, do contrário, adverte Spinoza, as conseqüências serão catastróficas.

“Queremos dar início a uma campanha a favor da vida e da terra. O mundo está em perigo e se a ação das multinacionais, que destroem a Amazônia e outros ecossistemas, vitais para a humanidade, não forem freadas, em dez anos as alterações climáticas e desastres ambientais vão ser inevitáveis”, prevê Spinoza.

IIRSA – Hoje o grande algoz e alvo da resistência indígena é a chamada IIRSA (Iniciativa para a Integração de Infra-estrutura Regional da América do Sul), um acordo multilateral firmado em 2000, em Brasília, por 12 países da América do Sul
com o objetivo de unir e realizar grandes obras de infra-estrutura nas áreas de transporte, telecomunicações e energia na região.

São ao todo 507 megaprojetos – hidrovias, oleodutos, hidrelétricas e estradas – que vão abranger as áreas indígenas e irão provocar graves impactos sociais e ambientais na Amazônia, como desmatamento, empobrecimento das comunidades locais, incluindo os ribeirinhos, e a migração em massa milhares de pessoas para locais que ainda são reserva natural.

Os investimentos da ordem de 69 milhões de dólares, serão financiados pela Coorporación Andina de Fomento (CAF), Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Fondo Financeiro para el Desarrollo Del Cuenca Del Plata (Fonplata). “O projeto foi idealizado sem a participação das lideranças indígenas e ao contrário de melhorar a vida da população irá multiplicar a ganância das empresas que visam apenas exportar a nossa riqueza para os países desenvolvidos”, protesta a CAOI, por meio de vários manifestos publicados.

A conseqüência de tudo isso já é realidade. A presença das multinacionais mineradoras, das indústrias do agronegócio e até mesmo do agrocombustível defendido com veemência pelo governo brasileiro na Pan Amazônia, têm provocado conseqüências catastróficas como aquecimento global que provoca o degelo dos pólos árticos e dos Andes, a seca na Amazônia, a violência no campo, as migrações humanas, o desaparecimento de populações tradicionais, o desmatamento, poluição e o aumento do buraco na camada de ozônio.

Problemas que coincidentemente ou não, começam nas áreas habitadas por povos indígenas. “É por isso que o destino da humanidade esta nas mãos da luta dos índios”, alerta Spinoza.

* Nota do FSM

[EcoDebate, 28/01/2009]

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