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Busca por biocombustíveis é cheia de esperanças e obstáculos

Combinação de fatores levou mais de 40 governos a aprovarem leis de consumo de biocombustível que não só estabelecem metas anuais para a adoção dessa alternativa energética como também fornecem incentivos fiscais e subsídios. Por Holly Hubbard Preston, para o International Herald Tribune, publicado pelo UOL Notícias, Mídia Global, 15/03/2008 – 00h18.

Após quase uma década de esquecimento, o biocombustível, uma tecnologia que já foi defendida por Henry Ford e Rudolph Diesel, está retornando com força total à consciência pública.

Entre os fatores que contribuem para esse retorno estão a disparada do preço do petróleo, preocupações com o clima e ansiedades governamentais devido à redução das reservas petrolíferas.

Essa combinação de fatores levou mais de 40 governos a aprovarem leis de consumo de biocombustível que não só estabelecem metas anuais para a adoção dessa alternativa energética como também fornecem incentivos fiscais e subsídios às companhias que apóiam a tecnologia emergente.

E isso tem funcionado sob vários aspectos. Em 2007, o WorldBioPlant.Com, um serviço de informações criado para acompanhar o desenvolvimento da indústria de biocombustíveis, relatou que havia 954 usinas fabricando o produto – 386 dedicadas ao biodiesel e 565 ao bioetanol – em 56 países, com uma capacidade produtora cumulativa superior a 163 bilhões de litros.

Quem fizer uma pesquisa para saber quem está ajudando a financiar esses projetos irá se deparar com nomes como Royal Dutch Shell, BP e Chevron, bem como os de companhias automobilísticas como a Daimler, a General Motors e a Volkswagen, que obtêm créditos fiscais para produzir veículos que queimam combustível “verde”.

Os vendedores, um elo vital nesta cadeia, também estão começando a embarcar nessa tendência. No mês passado, a VeraSun Energy, uma produtora de biocombustível dos Estados Unidos, fechou um acordo com a Kroger, uma grande rede de supermercados norte-americana, para vender o seu combustível que contém 85% de etanol em 20 dos postos instalados em lojas de conveniência da rede no Texas.

Esse combustível, conhecido como E85, é destinado à pequena, mas crescente, frota de veículos flex-fuel, capazes de rodar tanto com gasolina convencional quanto com misturas contendo alta porcentagem de álcool.

O fato de o acordo ter sido firmado no Texas, a base de muitas das maiores companhias petrolíferas dos Estados Unidos, é um símbolo do interesse cada vez maior pelos biocombustíveis e da legitimidade destes como fonte de energia alternativa. Mas é difícil precisar se e quando esse interesse irá se traduzir em grandes lucros para os fabricantes de biocombustíveis.

Os biocombustíveis respondem por uma parcela minúscula do mercado total de combustíveis. As vendas de biocombustíveis totalizaram US$ 25,4 bilhões em 2007 – ficando apenas atrás da energia eólica, com US$ 30 bilhões, no espaço reservado à energia alternativa -, e espera-se que cheguem a US$ 81,1 bilhões em 2017, de acordo com a Clean Edge, uma firma de pesquisas de Oakland, na Califórnia.

Os combustíveis alternativos de todos os tipos, incluindo o etanol e o biodiesel, bem como petróleo e combustíveis sintéticos, responderam por apenas 2,6% da produção total de combustíveis em 2006, segundo dados divulgados pelo Goldman Sachs International no final do ano passado. Segundo o Goldman, até mesmo com o constante apoio governamental, é improvável que os combustíveis alternativos representem mais de 5% do mercado total até 2015.

“Neste país os biocombustíveis são claramente apoiados por políticas governamentais, não sendo economicamente viáveis por conta própria”, afirma Marc Levinson, um analista de pesquisas de mercadorias do JPMorgan.

Ao usar o termo “apoio governamental” Levinson refere-se ao recém-ampliado U.S. Renewable Fuel Standard (parte referente aos combustíveis renováveis da Lei de Políticas Energéticas dos Estados Unidos de 2005), que aumentou a meta de consumo de biocombustível, incluindo biocombustíveis avançados – definidos como combustíveis celulósicos e diesel derivado de biomassa – para 36 bilhões de galões (136,3 bilhões de litros) até 2022.

Na opinião de Levinson, a indústria de biocombustíveis dos Estados Unidos não conseguirá “de forma alguma” atingir essa meta. Ele diz acreditar que das duas uma: ou a indústria de biocombustíveis dos Estados Unidos precisará encontrar maneiras mais eficientes de converter as existentes matérias-primas de alimentos em biocombustíveis, ou terá que recorrer a fontes externas como o Brasil, que é rico em etanol produzido a partir da cana-de-açúcar, mas que enfrenta pesadas taxas de importação por parte de Washington.

Brent Erickson, um ex-lobista da indústria petrolífera que atualmente é vice-presidente-executivo da Biotechnology Industry Organization, acredita que a diretriz dos Estados Unidos para o setor não é irrealista: “Ela garante um mercado para os biocombustíveis e constitui-se em um grande redutor de riscos para as corporações e acionistas que desejam investir na área”.

Erickson cita como exemplo o governo brasileiro, que adotou uma política agressiva de biocombustíveis 30 anos atrás: “Atualmente, cerca de 40% do combustível para transporte vêm da cana-de-açúcar plantada no próprio país, e que é transformada em combustível para 75% da frota automobilística brasileira”.

Os biocombustíveis dividem-se em duas categorias básicas: o etanol derivado de açúcares e amidos fermentados e o biodiesel produzido com óleos vegetais e animais.

Os críticos dos biocombustíveis alegam que eles contribuem para o aumento dos preços das mercadorias e para o avanço sobre as reservas alimentícias, e que os processos para a sua produção agridem o meio ambiente.

Devido ao aumento das críticas, os elaboradores de políticas para o setor passaram a estabelecer mais condições para o apoio aos biocombustíveis. Em fevereiro deste ano, vários membros da União Européia solicitaram uma revisão da Diretriz de Qualidade de Combustíveis de 1998, como forma de impor padrões ambientais e de sustentabilidade rígidos para a aquisição e o uso dos biocombustíveis pelos países do bloco.

Para Martina Otto, chefe da unidade de políticas de energia e transportes do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas, a reação contrária à atual geração de biocombustíveis não é nem surpreendente nem totalmente desfavorável.

“Os biocombustíveis têm aspectos positivos e negativos”, afirma Otto. “Ainda é necessário que se façam muitas pesquisas”.

Grande parte do debate sobre os perigos ambientais poderão tornar-se irrelevantes caso materializem-se avanços promissores para a próxima geração de biocombustíveis, que se baseia bastante em biomassa não alimentícia e em detritos orgânicos.

“Entre esses avanços, um dos mais promissores é a tecnologia celulósica”, diz Michael Tian, analista da firma de investimentos Morningstar. A celulose é um polissacarídeo gerador de glicose encontrado nas paredes celulares das plantas. Tecnologias elaboradas para a extração da celulose de biomassa de polpa de madeira, caule de trigo e algas fazem parte da vanguarda do desenvolvimento dessa indústria.

A Novozyme, uma empresa privada dinamarquesa, descobriu e atualmente está replicando uma bactéria consumidora de biomassa capaz de quebrar rapidamente a molécula de celulose. A sua tecnologia já está sendo utilizada por várias empresas produtoras de etanol, incluindo a Abengoa Bioenergy, uma empresa biorefinadora de capital público subsidiária da Abengoa da Espanha.

A Xethanol, uma companhia de pequeno porte com sede nos Estados Unidos, está transformando lixo em etanol, usando enzimas e fungos para promover fermentação. No mês passado, ela inaugurou uma usina piloto na Flórida com capacidade de converter resíduos de frutas cítricas em 500 mil galões (1,9 milhão de litros) de etanol celulósico por ano.

Mas o desenvolvimento de combustíveis avançados não se resume à tecnologia celulósica. A Choren Industries, uma companhia privada alemã, recentemente uniu esforços à Royal Dutch Shell para construir aquilo que ela chama de a primeira usina comercial dedicada à produção de biocombustível a partir de biomassa pelo processo biomass-to-liquid (BTL).

A Choren, que conta com a Volkswagen e a Daimler entre os seus acionistas, produz uma segunda geração de combustível diesel sintético, conhecido comercialmente como SunDiesel. Este combustível é derivado de fontes diversas de biomassa, como polpa de madeira e lixo. O combustível é compatível tanto com os atuais motores dieseis quanto com aqueles baseados em futuras tecnologias.

Enquanto isso, a International Energy, uma companhia dos Estados Unidos, está produzindo biocombustíveis derivados diretamente do processo de fotossíntese que ocorre em algas microscópicas. Segundo a empresa, esses microorganismos podem acumular até 30% de sua biomassa na forma de biocombustíveis valiosos.

A maior parte das companhias de capital público do setor, incluindo a International Energy, é do tipo “penny stocks” (empresas de ações de menos de US$ 5). Entre elas estão a Alegro Biodiesel, a Kreido Biofuels, a Earth Biofuels, a Pure Biofuels e a Green Star Products.

E, assim como ocorre com a maioria das empresas penny stocks, os riscos são conhecidos. Recentemente, a International Energy, uma companhia criada a dez anos, admitiu durante uma recente apresentação à U.S. Securities and Exchange Comission (Comissão de Títulos e Câmbio dos Estados Unidos): “O nosso estágio inicial de desenvolvimento faz com que seja difícil avaliar o nosso negócio e as suas perspectivas”.
Tradução: UOL