EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Artigo

O combustível e o desenvolvimento humano, por Arthur Conceição

Adital – O lançamento de gás carbônico mundo a fora começa a surtir efeitos devastadores no planeta Terra. O pior problema é a emissão dos chamados gases domésticos, como a queima de combustível de veículos automotores. Primeiro passo para diminuir o efeito estufa é cortar pela metade o lançamento desses gases. Os Estados Unidos atualmente são o maior poluidor do mundo, consumindo hoje 30% do petróleo do planeta, dos quais 65% são importados. O tema-chave que está na pauta nas principais discussões da política estadunidense são as fontes de energia. A democrata Nancy Pelosi, que foi a primeira mulher eleita para a presidência do Congresso norte-americano, anunciou no final de janeiro a formação de um comitê especial para debater e criação de alternativas sobre a independência energética e aquecimento global.

Para amenizar a poluição os norte-americanos têm uma perspectiva de refinar até 2012 um total de 28,5 bilhões de litros de combustível renovável. E para 2030 há uma previsão de produção de 228 bilhões de litros, pois pretendem reduzir em 20% o consumo de gasolina nos próximos dez anos. Só nos últimos seis anos eles aumentaram em 155% a produção de etanol a partir do milho, usando para isso, em 2006, 41 milhões de toneladas de grãos que correspondiam apenas a 60% da produção interna, sendo que o restante veio do México.

Pela previsão de consumo, as áreas cultiváveis suprirão nos próximos anos apenas 30% do mercado interno. Para isso já estão recorrendo às lavouras dos países da América Central e do México. O milho usado para a produção de etanol, o chamado amarelo, não serve para alimentação. O mais adequado para a produção de alimentos é o milho branco, que vem perdendo espaço para o amarelo. Devido à pressão de mercado, os produtos à base de milho tiveram aumentos consideráveis. A tortilha, que é a base da alimentação dos mexicanos, com consumo de seis quilos ao mês por habitante, chegou a ter variação de até 60% para o consumidor. Portanto, o grão passou a ter uma grande especulação não só no México,mas também em outros países latino-americanos. Muitos cientistas estão apostando que o etanol será a saída para a redução de gases poluentes na atmosfera, e os estadunidenses já viram que a alternativa será produzir etanol por meio da cana-de-açúcar, que é 40% mais barato. Para isso estão negociando com os países que têm potencialidade de produzir a cana. O Brasil agora passa a ser o próximo alvo e a parceria para transferência de cooperação de tecnologia já está adiantada. No dia 8 de março deste ano, o presidente George W. Bush vem ao País para tratar desse tema com o presidente Lula.

A principal negociação entre os dois presidentes e o lançamento de projetos pilotos para difundir em outros países o consumo de etanol, para que se transforme numa commodity e passe a ter uma cotação mundial. Pelo fato de o Brasil ter o know-how tanto no comércio como na produção de cana-de-açúcar e na tecnologia de refino, os norte-americanos se aproximam do governo brasileiro. Os brasileiros têm uma grande carta na mão que não pode deixar escapar, pela ganância de tentar conquistar mercados externos. As grandes empresas petrolíferas já estão negociando a compra de empresas brasileiras no setor.

Antes de negociarmos qualquer coisa devemos proteger nosso mercado e o futuro do País. A segurança alimentar está em jogo nesse contexto. Se o consumo de etanol será bilhões de litros somente nos Estado Unidos, como será na Ásia e Oriente? Agora terão áreas cultiváveis suficiente para a demanda mundial? Novamente os países menos favorecidos serão explorados de forma drástica. Temos bons exemplos de nossos bóias-frias nas lavouras de cana em condições de semiescravidão. Discute-se poluição, expansão, produção, tecnologia, mas não estão na pauta as condições humanas. Podemos diminuir a poluição, mas não situações degradantes contra o ser humano. Fala-se em cotação da cana no mercado global, mas não se fala em cotação dos salários dos trabalhadores da cana. Agora o governo brasileiro terá um grande poder de negociação. Veremos como trará essa expansão de mercado, pois não pode cometer os mesmos erros que fez no seu desenvolvimento social. Trocar um problema pelo outro não será a solução. A biodiversidade vem sofrendo conseqüências drásticas pela aceleração de consumo. Devemos criar alternativas socialmente justas e ecologicamente sustentável, para que a humanidade não sofra a degradação por uma minoria em nome do desenvolvimento.

Arthur Conceição, Cientista político

(www.ecodebate.com.br) artigo originalmente publicado pela Agência de Informação Frei Tito para a América Latina