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Notícia

Nota da CPT-MG sobre as ameaças de morte à Irmã Geraldinha, freira dominicana

Belo Horizonte, 04 de novembro de 2009.

Assunto: Falta de Reforma Agrária em Salto da Divisa, no Vale do Jequitinhonha, MG, causa ameaças de morte à Irmã Geraldinha (Geralda Magela da Fonseca)

Geralda Magela da Fonseca, conhecida carinhosamente como “Irmã Geraldinha, freira dominicana da Congregação Romana de São Domingos – CRSD – por causa da atuação pastoral libertadora de Irmã Geraldinha ela tem sofrido uma série de ameaças de morte, assim como membros do Acampamento Dom Luciano e militantes do MST na região. E, pior: as ameaças estão se intensificando.

Em 07 de novembro de 2008, conforme Boletim de Ocorrência – B.O.P.C. 033/2008 – os Sem Terra do Acampamento Dom Luciano tinham recebido ameaças de morte e por isso fizeram B.O. Neste dia, Irmã Geraldinha estava em Salto da Divisa, devido aos recados de ameaças de morte que já vinha recebendo. Frei Emílio Sant Piro, pároco da Paróquia São Sebastião, de Salto da Divisa, por precaução, não deixou Irmã Geraldinha ir de ônibus para o Acampamento Dom Luciano Mendes; emprestou a ela um automóvel e o Sr. José Carlos levou-a ao acampamento por volta das 17:00h. Por volta das 18:00h, já estando no Acampamento Dom Luciano, Irmã Geraldinha foi avisada por telefone que, caso ainda estivesse na cidade, não deveria voltar ao Acampamento, porque pessoas suspeitas teriam descido do carro da Comerciante Margareth dizendo que ficariam lá na estrada de acesso ao Acampamento esperando Irmã Geraldinha para bater nela e quebrar-lhe o pescoço. Acampados viram dois “jagunços” escondidos próximo ao 2º mata-burro, estrada única de chegada ao Acampamento.

Em 2008 um sujeito que tinha sido expulso do Acampamento pela coordenação por mau comportamento causou vários conflitos no acampamento dom Luciano. Muitas vezes, estava alcoolizado. Ameaçou Irmã Geraldinha dizendo que já havia matado 15 e que poderia chegar a 16 “daqui pra li”. Dona Cleonice, tia de Irmã Marilande, testemunhou esta ameaça.

Durante o 1º semestre de 2009, Irmã Geraldinha continuou recebendo várias ameaças através de recados mandados e por telefone.
Havia uma promessa dos ameaçadores que caso o latifundiário  Ronaldo da Cunha Peixoto – integrante da diretoria da Fundação Tinô da Cunha, que é a proprietária da Fazenda Monte Cristo (a que o MST exige que seja desapropriada, porque não está cumprindo sua função social, é improdutiva.) – ganhasse a eleição Municipal extraordinária dia 26 de julho de 2009, eles iriam lá acabar com o Acampamento Dom Luciano. Ronaldo “ganhou”. Os acampados foram avisados que ficassem preparados.

No dia 27 de julho de 2009, um dia após a eleição para prefeito, houve várias ameaças por telefone dizendo que eles iriam lá queimar o acampamento. Dois agressores soltaram dois foguetes em direção ao Acampamento. O povo do acampamento se juntou. Pegou várias caixas de foguetes que estavam em poder dos agressores junto com um “giranda” (fogueteira).

No dia 28 de julho de 2009, uma terça-feira, por volta das 12:00h, depois de vários telefonemas de ameaças aos acampados do acampamento Dom Luciano Mendes e à Irmã Geraldinha, apareceu na estrada ao lado do acampamento Dom Luciano um carro com quatro pessoas – uma delas já denunciada pelo acampamento em novembro de 2008 – passando pelo acampamento no exato momento em que apareceu um fogo no mato à beira da estrada, próxima às lavouras dos acampados, ao lado do acampamento. O povo já assustado com as ameaças se reuniu e foi para a portaria do Acampamento. O carro foi lá em cima, retornou. O povo reconheceu os suspeitos, parou o carro e chamou a polícia, mas sem conseguir falar com a polícia, depois de várias tentativas, Irmã Geraldinha, ligou para o GADDH, em Salto da Divisa, que tentou entrar em contato pessoalmente com o polícia também sem sucesso, pois não tinha ninguém no “quartel”. Outra pessoa, solidária com o Acampamento, ligou para delegacia da cidade de Jacinto. Mais ou menos 2:15h após chegou a polícia de Salto. O povo pediu aos policiais que dessem busca no carro e nos quatro homens integrantes do carro. Isto não foi feito. Logo após a chegada da viatura outros dois “jagunços” – de repente apareceram no local.

Alguém da coordenação do Acampamento Dom Luciano falou à Polícia da cidade de Jacinto de todas as ameaças e difamações ao Acampamento e à pessoa de Irmã Geraldinha, veiculadas pela Rádio Aracuã (de Salto da Divisa), no programa Jornal do meio dia.

Após este acontecimento, outras ameaças foram feitas. Um acampado, ao chegar na cidade de Salto, deparou com um ameaçador que disse que estava juntando um grupo de pessoas do Baianão (distrito da Bahia) para ir ao acampamento e acabar com tudo. “A primeira cabeça que quero ver rolar é a da tal de Geraldinha. Ela só irá ficar quieta quando acontecer com ela o que aconteceu com Irmã Dorothy Stang”, teria tido o ameaçador.

Ao ser questionada por um policial, Irmã Geraldinha disse:
“Fico uma parte de meu tempo lá no Acampamento Dom Luciano junto com o povo ajudando eles a se organizarem em projetos e atividades produtivas, educativas, religiosas. Convivo com eles, pois são meus irmãos em Cristo. Não poço deixá-los desamparados. Tem que ter alguém por eles/com eles. Ajudo no que posso para que eles tenham mais conhecimentos para defenderem seus direitos. São pessoas simples que sempre sobreviveram nas fazendas, foram empurradas para a cidade e hoje, no Acampamento Dom Luciano, estão tendo oportunidade e esperança para continuar sua profissão de agricultor. Não tiveram oportunidade de estudar, muitas vezes não sabem dos direitos que têm. Juntos aprendemos a viver melhor, eles com a sabedoria do campo e eu fazendo o que poço.”

No dia 28 de julho de 2009, foram feitos dois Boletins de Ocorrência. A polícia de Salto da Divisa fez o B.O. n. 0775/2009 criminalizando Irmã Geraldinha e Regis (que não tem nada a ver com o acampamento). Esse B.O. gerou muita indignação no Acampamento Dom Luciano e fomentou a insegurança reinante. Por outra perspectiva, a polícia de Jacinto, através do “comandante” Homero, fez outro B.O., no qual reconhece como vítimas os acampados e aponta Paulo Roberto, Ilton Guimarães, Ademilson e Renato Soares como agressores.

O sr. Adriano, José dos Santos, Edilânia, sr. Manoel e dona Gildênia, do Acampamento Dom Luciano, também têm recebido várias ameaças de morte.

Dia 29 de outubro de 2009, pela manhã, uma mulher telefonou para a Irmã Geraldinha, no celular dela, e disse: “Irmã Geraldinha, você vai nos pagar por tudo que você está nos fazendo.” À tarde, um homem telefonou para Irmã Geraldinha dizendo: “Quando você passar na frente da minha casa, você vai levar um tiro na cara.” Na mesma tarde, outro homem telefonou para Irmã Geraldinha e disse: “Qualquer dia você vai levar um tiro na cara e não vai saber quem deu.” Como Irmã Geraldinha estava no meio de pessoas que ela não queria alarmar com o que estava acontecendo, preferiu desligar o celular, não ouvir mais e nem tentar discutir com as pessoas ameaçadoras. Irmã Geraldinha não reconheceu a voz dos que telefonaram ameaçando. Eram pessoas estranhas.

No Sábado, dia 31 de outubro de 2009, um jovem viu um corsa preto (com vidros escuros, com 4 pessoas) na cancela, junto do mata-burro, próximo ao Acampamento Dom Luciano. O motorista (homem moreno, 1,72 metros mais ou menos) perguntou ao jovem se ele conhecia Irmã Geraldinha. Ele disse que não conhecia Irmã Geraldinha, que ela já tinha ido embora.

No dia seguinte, dia 01 de novembro de 2009, um domingo, quando dona Gildênia, chegava em sua casa, em Salto da Divisa, um homem bateu na porta da sua casa perguntando: “Onde está Irmã Geraldinha?” Ela disse que não estava ali. Perguntou se estava no Acampamento Dom Luciano. Gildênia respondeu que Irmã Geraldinha estava viajando. Dona Gildênia viu que o homem que lhe perguntara sobre Irmã Geraldinha era um dos quatro que estavam em um corsa preto, com vidros escuros (estavam meio-abaixado na hora). O homem que perguntava tinha uma tatuagem no braço direito, era branco, baixo, cabelo anelado, de óculos preto, com sapato preto.

Por que tantas e graves ameaças de morte à Irmã Geraldinha?

Desde 1993, Irmã Geraldinha, em Salto da Divisa, se dedicou ao acompanhamento dos Grupos de Reflexão Bíblica, organização de Cebs – Comunidades Eclesiais de Base – e de Associações Comunitárias que resultaram na criação das Associações de pescadores, das lavadeiras, dos pedreiros, de moradores… Coordenou a Pastoral da Juventude – PJ – e sucessivamente  a Pastoral da Criança; ambas, em nível Paroquial e Diocesano; ela coordenou, também, em Salto da Divisa, as atividades da Associação Asas da Esperança, cuja finalidade era dar suplementação educacional para as crianças carentes; além de dar assistência à Rádio Comunitária (criada sob liderança das Irmãs Dominicanas) e em especial ao Grupo de Apoio e Defesa dos Direito Humanos – GADDH – de Salto da Divisa, do qual, hoje, Irmã Geraldinha é vice-presidente.

Todo esse trabalho pastoral libertador desaguou na luta pela Reforma Agrária em Salto da Divisa. O MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – chegou também a Salto da Divisa e com o apoio e participação ativa de Irmã Geraldinha, na madrugada do dia 26 de agosto de 2006, com cerca de 185 famílias Sem Terra ocuparam a Fazenda Manga do Gustavo para pressionar a desapropriação da Fazenda Monte Cristo, que é improdutiva e não está cumprindo função social. Ai se instalou o Acampamento Dom Luciano Mendes que vem sendo acompanhado por Irmã Geraldinha desde o início. A ocupação foi feita porque o processo de desapropriação no INCRA-MG (Processo n.º 54170003519/2005-30) não avançava. É sabido na região que a atuação pastoral de Irmã Geraldinha sido crucial para angariar apoio popular à causa do Acampamento Dom Luciano Mendes.

Em janeiro de 2009, Irmã Geraldinha se dedicou também à organização de 11 famílias de posseiros da fazenda Monte Cristo. E, é claro, iniciou a defendê-los lutando ao lado deles pelos seus sagrados e justos direitos. Irmã Geraldinha como vice-presidente do Grupo de Apoio e Defesa dos Direitos Humanos – GADDH -, foi convidada pelos posseiros da Fazenda Monte Cristo/Fundação Tinô da Cunha para ajudá-los a superar uma situação de injustiça com seus direitos sendo violados.
Além do dito acima, hoje, Irmã Geraldinha é integrante da Comissão Pastoral da Terra – CPT –, no Vale do Jequitinhonha, integra o Conselho provincial e a Comissão de Justiça e Paz da Irmãs Romanas de São Domingos.

O trabalho pastoral de Irmã Geraldinha conta com o total apoio da Diocese de Almenara, do bispo Dom Hugo Steekelenburg, das Irmãs Dominicanas, da CPT, dos frades franciscanos Capuchinhos e das organizações de Direitos Humanos e sociais, em nível nacional e internacional.

Enfim, a causa maior das graves ameaças de morte à Irmã Geraldinha e a outras lideranças do MST no Vale do Jequitinhonha é porque a Reforma agrária está parada, não sai do papel. Exigimos que o INCRA, Governo Federal e Poder Judiciário consumam o processo de desapropriação da Fazenda Monte Cristo, em Salto da Divisa, MG, e assente as 85 famílias Sem Terra que estão debaixo da lona preta há três anos e sendo submetidas a ataques freqüentes de jagunços e inimigos da Reforma Agrária.
Por reforma agrária no Vale do Jequitinhonha e em todo o Brasil. Pelo fim do latifúndio.

Em tempo, o Programa Nacional de Proteção aos defensores dos Direitos Humanos, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, já fez inspeção em Salto da Divisa, dia 17/09/2009, produziu um PARECER que recomenda a diversos órgãos públicos proteção à Irmã Geraldinha e a outros integrantes do MST ameaçados de Morte.

Irmã Geraldinha e a CPT-MG já fizeram REPRESENTAÇÃO junto à Procuradoria de Justiça – CAO de conflitos Agrários – Dr. Afonso Henrique de Miranda Teixeira -, que por sua vez encaminhou a Denúncia-REPRESENTAÇÃO:
a)Ao Chefe da Polícia Civil de Minas Gerais, Dr. Marco Antônio;
b)Ao Coronel Renato, comandante Geral da Polícia Militar de Minas Gerais;
c)Ao Promotor de Justiça da Comarca de Jacinto, Dr. Bruno César Medeiros Jardim;
d)Ao Deputado Durval Ângelo, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

Comissão Pastoral da Terra – MG

* Colaboração do Frei Gilvander Moreira para o EcoDebate, 05/11/2009

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