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Paraíba: Barragens sem o planejamento contribuem com o déficit hídrico

SALGADO DE SAO FELIX - Mesmo com autorização, retirada de areia às margens do rio Paraíba com caminhões, pás mecânicas e draga é analisada. Imagem do Jornal da Paraíba.
SALGADO DE SAO FELIX – Mesmo com autorização, retirada de areia às margens do rio Paraíba com caminhões, pás mecânicas e draga é analisada. Imagem do Jornal da Paraíba.

O geógrafo Paulo Rosa afirma que a falta de planejamento na construção de barragens também tem contribuído para aumento do déficit hídrico, pois afetam a distribuição das águas. Além disso, outro efeito negativo do barramento das águas dos rios é a retenção dos resíduos minerais, como areia, que deveriam formar as praias, e cujo barramento ocasiona o encolhimento das praias costeiras – como vem acontecendo por causa da barragem de Gramame-Mamuaba –, e também a retenção dos nutrientes que são normalmente transportados pelos rios, segundo revela Paulo Rosa, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Isso porque, toda intervenção feita nos rios altera o sistema natural, segundo explicou o geógrafo. Matéria de Aline Lins, no Jornal da Paraiba, 15/02/2009.

“Quando você faz um barramento de um rio, é quebrada a competência hidráulica, erosiva e de transporte do rio”, explicou, alertando para o risco da água “estourar” mais adiante, no percurso do rio. Ele citou os principais barramentos de destaque presentes no rio mais influente do Estado, o rio Paraíba, que são o açude de Boqueirão e Acauã.

“O problema está exatamente na ocupação das margens dos rios. Qualquer tipo de intervenção é poluição, porque altera o sistema natural do rio”, esclareceu Paulo Rosa.

Um exemplo simples de entender é que, as comunidade ribeirinhas, geralmente, despejam no rio os dejetos e, em muitos casos, até mesmo o lixo que produzem. Além disso, os rios recebem toda uma carga de rios tributários, de modo que tudo que acontece nas cabeceiras dos rios tributários vai para o rio principal, prejudicando toda a sequência. Fora isso, ao longo desses cursos de água, as plantações que abusam de corretivos de solo e de agrotóxicos, como tomates e outros produtos agrícolas, também prejudicam os rios, pois as chuvas arrastam essas substâncias consigo.

E não só a poluição ocasionada pela agricultura, mas a expansão da algaroba, especialmente no Cariri paraibano, também têm trazido sérios problemas no que diz respeito à escassez de água na Paraíba. Essa vegetação, que não faz parte do bioma nativo da caatinga, consome muita água, e tem contribuído para amentar o déficit hídrico no Estado.

De acordo com a Agência Executiva de Gestão das Águas da Paraíba (Aesa), a maioria dos rios paraibanos é semiperene e há muitos deles secos no Sertão, apesar das últimas chuvas. “Mais de 80 municípios têm problemas de distribuição de água, no Cariri paraibano. E inclusive no Brejo paraibano, como Esperança, onde há falta de água, e em Remígio, especialmente após o rompimento da barragem de Camará. Mesmo assim, os dados mostram que mais de 80% da população da Paraíba está servida de água.

Além disso, o uso inadequado da encosta imediata aos açudes e rios e os desmatamentos têm contribuído para a retirada da mata ciliar, aumentando o processo erosivo nas margens desses mananciais e diminuindo o índice de precipitação de chuvas nas cabeceiras dos rios (nascentes), diminuinto, assim, o volume de água nos rios, sem falar no clima e em todo ecossistema.

A Aesa vai lançar em julho deste ano um programa para monitorar e melhorar a qualidade da água no Estado, em todos os reservatórios de consumo humano. “Já estamos em fase de implantação de 14 plataformas de coletas eletrônicas de dados, que serão disponibilizados na internet, para saber a qualidade da água acumulada na Paraíba. Serão coletados dados meteorológicos, hidrológicos e da qualidade de água”, anunciou o presidente da Aesa, José Ernesto Bezerra.

Plano vai combater a desertificação

O secretário-executivo de Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente da Paraíba, Edilton Rodrigues Nóbrega, revelou que o secretário titular da pasta, Aguinaldo Ribeiro, assinará convênio com o Ministério do Meio Ambiente, para traçar o Plano Estadual de Combate à Desertificação. Na Paraíba, o fenômeno atinge áreas com pouca precipitação, como Cariri e Sertão. Serão destinados R$ 250 mil do Governo do Estado e o mesmo valor do Ministério do Meio Ambiente para as ações, que consistirão em políticas voltadas para o assunto nas áreas protegidas, tomando como base os anais da 1ª Conferência Anual do Meio Ambiente.

O secretário-executivo citou ainda, entre as ações, a prática do manejo florestal, instalação de atividades econômicas que demandem recursos hídricos e o uso dos recursos naturais de forma manejada.

Outra ação que está sendo objeto de convênio com o Ministério do Meio Ambiente é a respeito da deposição de resíduos sólidos dos Estado, além de construção de aterros sanitários, estação de tratamento e esgotamento sanitário, inclusive para preparar o Estado para a transposição das águas do São Francisco.

Para ele, entre as áreas mais preocupantes, no que se refere à poluição dos rios, estão o Vale do rio Piancó e Vale do rio Paraíba. Mas garantiu que o Estado vem fiscalizando, através da Sudema.

Para diminuir a poluição dos rios, Edilton Rodrigues informou que o Governo tem procurado liberar recursos para esgotamento sanitário. (AL)

MP investiga impacto de extração

Em Salgado de São Félix, o Ministério Público Estadual (MPE) está apurando, através da Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, da comarca de Itabaina, denúncias de impacto ambiental na extração mecanizada de areia, cascalho e outros minérios, na propriedade Três Irmãs e adjacências, naquele município, às margens do rio Paraíba. Conforme a representação no MP, a atividade vem ocorrendo há cerca de dois anos e meio, com autorização da Prefeitura e licença da Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema). O problema é que a extração vem sendo feita com a utilização de caminhões, pás mecânicas e draga.

A representação, no MP, partiu de um vereador de Salgado de São Félix. Um dos membros da Associação Paraibana dos Amigos da Natureza (Apan), João Batista, disse que, em Itabaiana, várias empresas querem fazer a retirada mecanizada de areia do rio, mas a Prefeitura não permite. Em Salgado de São Félix, onde há a retirada de areia em grande volume, segundo João Batista, a atual gestão estaria querendo intervir na atividade.

“São retirados cerca de 40 a 50 caminhões por dia, e isso vem acontecendo nos últimos dois anos e meio. Nós defendemos a extração manual, em defesa do desenvolvimento sustentável.

Mas mecanizada, com dragas, pás mecânicas, em grandes volumes, 50 caminhões, por dia não tem manancial que se segure, é insustentável. A nossa ideia é fazer com que os responsáveis pela degradação recuperem o local degradado”, disse João Batista.

Para avaliar a situação, a Promotoria de Itabaiana solicitou, inclusive, um diagnóstico técnico a especialistas em Geografia, da UFPB. A promotora-curadora do Meio Ambiente, Ilcléia Cruz de Souza Neves, entretanto, preferiu não se pronunciar até avaliar o laudo e apurar o caso. Para o geógrafo Paulo Rosa, a atividade pode estar prejudicando o microssistema de vida do rio.

“Uma das coisas mais poluentes é a retirada da areia dos rios para abastecer o mercado da construção civil”, disse o professor Paulo Rosa. “Quando a draga puxa a areia, vem todo o microssistema de vida junto, alterando a vida local”, explicou o professor Paulo Rosa.

Para ele, pode haver, ainda, efeitos a longo prazo. “O meio ambiente é um sistema espontâneo, e na cadeia de causa e efeito, ele apresenta sempre um elo frágil, que a gente não sabe efetivamente o problema sério que pode ocorrer”, alertou o geógrafo. “É possível trabalhar com a extração de areia. É possível atuar de forma que a intervenção não seja muito forte, agressiva, mas a partir do momento em que você estabelece uma moto-mecanização, você quebra todo o sistema ambiental. Você retira mais areia do que se forma. A areia vem da desagregação das rochas. Se as rochas levam determinado tempo para formar um pacote de sedimentos, e a draga retira isso em muito menos tempo, significa que haverá sempre um saldo negativo em relação ao suporte”, explicou Paulo Rosa, defendendo a extração manual do mineral, e não de forma mecânica.

“A destinação dos efluentes da agroindústria e da indústria tem que estar dentro dos instrumentos de regulação ambiental”, disse Paulo Rosa.

O analista ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Ronilson José da Paz, informou que fiscalizou a situação da estação de areia e verificou que ela tem licença da Sudema. A Sudema confirmou que há uma licença em Salgado de São Félix, mas não confirmou se seria a mesma propriedade. “O que está faltando é um estudo chamado capacidade de suporte, que determina a capacidade do rio receber efluentes e retirar areia”, disse Romilson.

Ele disse que o lançamento de efluentes dentro da água provoca perda da bio-diversidade, podendo provocar extinção de espécies, comprometer a qualidade da água para o consumo humano e animal.

“A Paraíba tem um déficit hídrico muito grande, e a gente perder água por causa de poluição, é muito grave”, disse o analista ambiental.

Outros tipos de poluição que geralmente agridem os rios são os rejeitos da criação de peixe e camarão (aquicultura), e a poluição térmica. “Essa é a poluição que ninguém vê, na indústria.

Os rejeitos podem não ter nenhum tipo de contaminação, mas sãolançados quentes no ambiente, interferindo nas comunidades biológicas do ambiente”, disse Romilson.

O secretário-executivo de Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente da Paraíba, Edilton Rodrigues Nóbrega, disse que após a apuração do MP, se for comprovado que a empresa extrapolou os limites de exploração da área, está passível de multa da obrigação de recuperar a área degradada. (AL)

[EcoDebate, 18/02/2009]

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