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Florestas densas são mais resistentes a secas sazonais, entrevista com Paulo Brando, IPAM

Recente pesquisa realizada na Amazônia constatou que houve diminuição da precipitação durante a estação chuvosa, enquanto a disponibilidade de luz na estação seca aumentou, com importantes consequências para a ciclagem de carbono na região. De acordo com o estudo, que reuniu cientistas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), da Universidade da Flórida (UF) e do Woods Hole Research Center (EUA), a capacidade das florestas da Amazônia de ciclar carbono durante períodos de estiagem foi maior onde a cobertura vegetal era mais densa.

Principal autor do trabalho, Paulo Brando, coordenador do projeto Savanização do IPAM, avalia que, devido ao processo de degradação florestal na Amazônia e as previsões de um clima mais seco em algumas partes da Bacia Amazônica, é necessário uma melhor integração de dados de campo e estudos de sensoriamento remoto para que se possa realmente entender como secas previstas num futuro próximo afetarão essas florestas.

Clima e Floresta – O que é a produtividade da floresta e a ciclagem de carbono?

Paulo Brando – A produtividade da floresta é a capacidade de árvores, cipós e outras plantas de assimilar carbono através do processo de fotossíntese. Normalmente, quando falamos em produtividade de florestas, fazemos uma distinção entre produtividade bruta e líquida. A produtividade bruta representa o total de carbono assimilado pelas plantas, enquanto a produtividade líquida representa a quantidade de carbono fixada pela planta. Ou seja, a produtividade líquida é calculada com base na produtividade bruta menos o carbono liberado pelas plantas durante a respiração, o que a floresta realmente armazenou de carbono.

Clima e Floresta – Como essa produtividade varia na Amazônia?

Brando – Apesar de muitas vezes enxergarmos a Amazônia como um tapete verde uniforme, há diversos tipos de vegetação na região, um resultado de milhares de anos de evolução. Assim, a produtividade das florestas da Amazônia varia bastante de uma região para outra – assim como ao longo do tempo. Os principais fatores que influenciam a produtividade das florestas da Amazônia são características do solo, variações de clima, composição de espécies e frequência de distúrbios. Por exemplo, durante um ano muito seco é comum se observar uma diminuição no crescimento e um aumento na mortalidade de árvores. Em outras palavras, em anos muito secos, normalmente as florestas da Amazônia sofrem e reduzem a sua capacidade de ciclar e armazenar carbono (ex. menor produtividade líquida), principalmente quando o fogo ocorre.

Clima e Floresta – Quais são as consequências práticas para a floresta dessa diminuição das chuvas na estação chuvosa e maior disponibilidade de luz na estação seca na Amazônia?

Brando – O estudo mostrou que florestas relativamente intocadas são mais tolerantes à seca sazonal do que aquelas altamente degradadas. Porém, mesmo com maior capacidade de tolerar as secas, há um limite suportável além do qual a produtividade da floresta intacta se reduz. Também verificamos que as respostas das florestas da Amazônia à seca envolvem processos bastante complexos que podem afetar as conclusões sobre a vulnerabilidade dessas florestas às mudanças climáticas.

Clima e Floresta – Como foi realizada a pesquisa?

Brando – O estudo utilizou análises de campo e dados obtidos por sensoriamento remoto, incluindo dados de índices de vegetação (EVI) das estações secas de 2000 a 2008, do satélite MODIS. Foram combinados dados climáticos de 1996 a 2005 registrados em 280 estações meteorológicas. Relações estatísticas entre os índices de vegetação e outras variáveis também foram analisadas para toda a Bacia Amazônica e, mais intensamente, a Bacia do rio Tapajós.

Clima e Floresta – Por que é importante estudar esses fenômenos? O que eles têm a dizer sobre a saúde e sobrevivência da floresta e sobre as mudanças climáticas?

Brando – Como dissemos, a produtividade de florestas da Amazônia está relacionada à capacidade do ecossistema em ciclar carbono. Discutimos também que a produtividade de florestas varia de acordo com oscilações climáticas. Assim, ao estudarmos variações da produtividade florestal em função do clima, estamos dando um passo importante para entender como florestas tropicais poderão responder a mudanças climáticas.

Clima e Floresta – Como as secas poderão afetar as florestas no futuro?

Brando – Atualmente, vários modelos climáticos preveem um aumento de temperatura e uma diminuição na precipitação em partes da Amazônia. Como resultado, pode haver uma redução na cobertura vegetal e na quantidade de carbono armazenado nessas florestas. Visto que quase 40% das chuvas na Amazônia são dependentes das próprias florestas, qualquer alteração na saúde das florestas irá influenciar os padrões de chuva na região e vice-versa. Apesar de algumas previsões serem bastante sombrias, com substituição de florestas por uma vegetação empobrecida, mais parecida como uma savana, ainda há muita incerteza sobre os limiares em mudanças climáticas que causariam substituição de florestas Amazônicas por outros tipos de vegetação. E é por isso que o nosso grupo, liderado pelo Dr. Daniel Nepstad, tem realizado grandes experimentos na região. Os nossos últimos resultados mostram que grandes áreas da Amazônia poderão ser afetadas por secas num futuro próximo. Além disso, grandes áreas poderão se tornar vulneráveis ao fogo. Essa combinação de seca e fogo, além do próprio desmatamento, pode ter sérias consequências para a saúde das florestas da Amazônia. No entanto, há várias soluções que podem ser tomadas para se diminuir os efeitos de seca e fogo na Amazônia.

Entrevista realizada por Maura Campanili e publicada na Clima e Floresta, n° 24, agosto de 2010 (Clima e Floresta é uma publicação mensal on-line do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM))

EcoDebate, 03/09/2010

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