Proposta de dieta da saúde planetária é insuficiente enquanto 3,7 bilhões vivem em insegurança alimentar
Novo Relatório EAT-Lancet: Quase metade da população global não tem acesso confiável a dietas saudáveis, salários justos ou meio ambiente limpo; desigualdade anula potencial de prevenir 15 milhões de mortes prematura
EAT-Lancet 2025: Quase metade da população global (3,7 bilhões) está em situação de insegurança alimentar. Dieta da Saúde Planetária exige justiça social e salários dignos para reverter a crise de desigualdade nos sistemas alimentares
O novo relatório “EAT-Lancet de 2025 sobre Sistemas Alimentares Saudáveis, Sustentáveis e Justos” revela um paradoxo alarmante: enquanto há produção suficiente de calorias para toda a população global, quase metade dos 8 bilhões de pessoas do mundo (cerca de 3,7 bilhões) não tem acesso confiável a alimentos saudáveis, a um ambiente limpo ou a um salário digno. Esta disparidade gritante coloca em cheque a eficácia de padrões alimentares saudáveis, como a Dieta da Saúde Planetária (PHD), se não forem acompanhados por uma transformação urgente na justiça social.
A Dieta da Saúde Planetária (PHD) — que prioriza alimentos minimamente processados e ricos em vegetais, com consumo moderado de carnes e laticínios — é, inegavelmente, um caminho vital para a saúde individual. Sua adoção global está associada a uma redução de 27% no risco de morte prematura e poderia prevenir aproximadamente 15 milhões de mortes prematuras anualmente, reduzindo riscos de doenças crônicas como diabetes tipo 2 e cardiovasculares.
No entanto, o foco apenas na mudança dietética se mostra insuficiente enquanto os sistemas alimentares globais continuam a ser os principais impulsionadores de crescentes desigualdades e da crise de acesso. O relatório destaca que a crise de desigualdade e danos ambientais ameaça tanto a saúde humana quanto a resiliência do planeta.
O peso da desigualdade no sistema alimentar
Embora a PHD represente uma meta importante, a realidade é que bilhões de pessoas estão excluídas de alcançá-la. Quase 3,7 bilhões de indivíduos não conseguem acessar uma dieta saudável e acessível, seja por falta de renda, de acesso à comida, ou por estarem submetidos a condições socioeconômicas degradantes.
O relatório EAT-Lancet de 2025 conclui que essa crise de desigualdade precisa ser abordada de forma urgente como parte dos esforços de transformação dos sistemas alimentares. Isso é reforçado pela conclusão de que, ironicamente, são as dietas dos 30% mais ricos da população global que são responsáveis por aproximadamente 70% das pressões ambientais gerais causadas pelos sistemas alimentares.
Além do acesso à comida, as desigualdades se manifestam nas condições de trabalho. O setor alimentar emprega milhões de pessoas, mas 32% desses trabalhadores recebem salários abaixo do mínimo necessário, frequentemente operando em condições inseguras. Mulheres, em particular, enfrentam disparidades salariais sistêmicas.
Justiça social: O eixo central da mudança
Para que a adoção da PHD em escala global seja possível e justa, ela deve estar intrinsecamente ligada à equidade social. Os sistemas alimentares não são apenas responsáveis por 30% das emissões de gases de efeito estufa e pela transgressão dos limites planetários, mas também impulsionam a desigualdade crescente.
A Comissão EAT-Lancet de 2025 propõe diversas soluções que promovem simultaneamente a saúde, a sustentabilidade e, crucialmente, a equidade social. Dentre as propostas, destacam-se medidas que vão muito além do prato individual:
-
Garantir Remuneração Justa e Segurança: É essencial assegurar que todos os trabalhadores dos sistemas alimentares recebam uma remuneração justa e operem em condições de trabalho seguras.
-
Redes de Segurança Social: A implementação de redes de segurança social, acesso equitativo a recursos e apoio direcionado são vitais para aliviar a pobreza e reduzir as disparidades na segurança alimentar e nutricional.
-
Empoderamento de Marginalizados: Pequenos agricultores, povos indígenas, mulheres e outras comunidades marginalizadas precisam ser capacitados para participar dos processos de tomada de decisão que afetam suas vidas e seus ambientes.
Em resumo, o Relatório EAT-Lancet mostra que, embora a transição para dietas saudáveis alinhadas com a PHD seja uma das oito soluções propostas, ela só pode ter sucesso quando combinada com a interrupção da conversão agrícola de ecossistemas intactos, a redução pela metade da perda e desperdício de alimentos, e, fundamentalmente, com a garantia de acesso equitativo a alimentos saudáveis para os quase 3,7 bilhões de pessoas que hoje estão à margem.
Mudar o que comemos é imperativo, mas garantir que todos possam comer é uma questão urgente de justiça social e sobrevivência planetária.
Figura mostrando o quanto os sistemas alimentares globais contribuem para as pressões sobre todos os nove limites planetários. O círculo verde representa o espaço operacional seguro, a linha vermelha marca os limites seguros para os sistemas alimentares, e as cunhas pretas pontilhadas mostram a participação da pressão de cada limite causada pelos sistemas alimentares. A imagem mostra que os sistemas alimentares são um dos principais impulsionadores de transgressões de fronteira, como mudanças climáticas, perda de biodiversidade, uso de água doce, ciclos de nutrientes e poluição.
Referência: The EAT–Lancet Commission on healthy, sustainable, and just food systems
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
[ Se você gostou desse artigo, deixe um comentário. Além disso, compartilhe esse post em suas redes sociais, assim você ajuda a socializar a informação socioambiental ]