Degelo acelerado da Antártida pode ter consequências catastróficas por gerações, alertam cientistas

Novo estudo reforça a urgência do corte de emissões, mostrando como o degelo na Antártida pode desencadear um efeito dominó sem volta, elevando o nível do mar em vários metros.
Um estudo da Australian National University (ANU) adverte que a Antártida está perigosamente próxima de pontos de ruptura irreversíveis.
De acordo com a pesquisa, mudanças abruptas no manto de gelo do continente podem desencadear consequências catastróficas que se estenderão por milênios, comprometendo o futuro de gerações, se as emissões de gases de efeito estufa não forem drasticamente reduzidas.
A pesquisa vai além de projeções de curto prazo e traça um panorama de como as ações humanas nas próximas décadas serão decisivas para o destino de cidades costeiras e populações inteiras nos próximos séculos.
O conceito: “Committed Sea-Level Rise” (Aumento Comprometido do Nível do Mar)
A chave para entender a gravidade do estudo está no conceito de “comprometimento”. Isso significa que mesmo após pararmos de emitir gases de efeito estufa, certos processos climáticos continuarão em movimento por séculos, como um superpetroleiro que não pode parar instantaneamente.
O professor Nerilie Abram, coautor do estudo, explica: “Cada vez que tomamos uma ação – ou não tomamos uma ação – estamos fazendo uma escolha sobre onde colocar os limites do aumento do nível do mar. É um legado de longo prazo”. Em outras palavras, o que emitimos hoje “compromete” o planeta a um aumento inevitável do nível do mar no futuro.
Os pontos de ruptura da Antártida
O estudo foca em dois dos maiores e mais vulneráveis manto de gelo da Antártida:
-
Manto de Gelo da Antártida Ocidental: Grande parte deste manto de gelo está assentado sobre um leito rochoso abaixo do nível do mar, tornando-o extremamente vulnerável ao aquecimento das águas oceânicas. Se esse gelo entrar em colapso, seu potencial de elevação do mar é medido em metros.
-
Manto de Gelo da Antártida Oriental (Bacia de Aurora): Por muito tempo considerado estável, os cientistas agora sabem que esta vasta região também é vulnerável. Seu colapso representaria outra elevação catastrófica do nível do mar global.
O grande perigo, segundo a pesquisa, é que o aquecimento atual pode estar prestes a cruzar os limiares críticos que desestabilizam essas massas de gelo. Uma vez iniciado, esse processo de degelo se torna autossustentável e praticamente impossível de parar por milhares de anos.
Os cenários:
A pesquisa da ANU modelou dois caminhos possíveis:
-
Cenário de Altas Emissões (o pior caso): Se continuarmos a queimar combustíveis fósseis de forma descontrolada, arriscamos desencadear um colapso rápido e generalizado das camadas de gelo. O resultado seria um aumento do nível do mar de metros, não centímetros, remodelando completamente o litoral global. Cidades como Rio de Janeiro, Recife, Santos e Nova York enfrentariam inundações permanentes e teriam que ser abandonadas ou protegidas por diques monumentais.
-
Cenário de Cortes Profundos de Emissões (o caminho da esperança): Se agirmos com extrema urgência para reduzir as emissões a zero, podemos estabilizar a temperatura global e, consequentemente, a Antártida. Isso não impediria todo o aumento do nível do mar, mas daria à humanidade e aos ecossistemas um tempo crucial para se adaptarem a mudanças mais graduais e menos catastróficas.
Uma janela de ação que se fecha rapidamente
A mensagem central do estudo é clara: a janela para evitar as consequências mais devastadoras ainda está aberta, mas está se fechando rapidamente. As decisões tomadas por governos e líderes industriais hoje, e a pressão da sociedade por ações concretas, definirão qual dos dois cenários se tornará realidade.
Não se trata mais de salvar o planeta para nós mesmos, mas de garantir um futuro habitável para as gerações que ainda estão por vir. A estabilidade da Antártida é, portanto, não apenas uma questão científica, mas uma das questões éticas e políticas mais definidoras do nosso tempo.
A catástrofe não é inevitável, mas evitá-la requer uma mudança de curso imediata e decisiva.
Referência:
Abram, N.J., Purich, A., England, M.H. et al. Emerging evidence of abrupt changes in the Antarctic environment. Nature 644, 621–633 (2025). https://doi.org/10.1038/s41586-025-09349-5
Nota da Redação – Sobre o tema “Degelo” recomendamos que leia, também:
Colapso da camada de gelo da Antártica Ocidental terá efeitos devastadores
Derretimento de gelo acelera e nível do mar ameaça cidades costeiras
Derretimento do gelo Ártico pode impactar corrente do Atlântico
Derretimento na Antártica desacelera maior corrente oceânica
Derretimento recorde na Antártida aumenta tempestades
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
[ Se você gostou desse artigo, deixe um comentário. Além disso, compartilhe esse post em suas redes sociais, assim você ajuda a socializar a informação socioambiental ]