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Artigo

A proposta de Estadualização do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães

 

artigo de opinião

A proposta de Estadualização do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, artigo de Eduardo Figueiredo Abreu

Há fortes demandas nas 47 unidades de conservação de responsabilidade do governo do Estado de Mato Grosso, que ao longo da história receberam investimentos pífios

As Unidades de Conservação (UC) de acordo com o art. 2º da Lei Federal nº 9.985, de 18 de junho de 2000, que entre outras providências institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, são espaços ambientais, com características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público com objetivos de conservação.

O marco inicial da criação de unidades de conservação no mundo foi o Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, em 1872. Depois disso, outros parques nacionais foram surgindo ao redor do mundo, assim como outros modelos de unidade de conservação.

No Brasil, embora já no final do século XIX surgissem propostas desse tipo de iniciativa, os primeiros parques nacionais foram instituídos na década de 1930, com a criação do Parque Nacional do Itatiaia (1937), do Parque Nacional da Serra dos órgãos e do Parque Nacional do Iguaçu (1939). Essas unidades foram estabelecidas ainda sob o primeiro Código Florestal Brasileiro, de 1934.

Nas décadas seguintes, houve expansão do número de unidades de conservação no país e avanços na legislação que ampliaram também as suas tipologias e/ou categorias, estabelecendo outros tipos de usos e exploração dos recursos naturais.

Em Mato Grosso, a primeira Unidade de Conservação criada foi o Parque Estadual Águas Quentes, em 1978, no município de Santo Antônio do Leverger, a 34 quilômetros de Cuiabá, na região Sul do Estado, com área de 1.487,00 hectares, categoria de proteção integral e com plano de manejo já elaborado. Importante ressaltar que as UCs podem ser criadas e geridas pelas três instâncias: federal, estadual e municipal.

No caso de Unidades de Conservação federais o órgão responsável é o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). As estaduais são administradas pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) e nos municípios, pelas secretarias de meio ambiente.

Atualmente, o sistema estadual de conservação mato-grossense conta com 47 unidades, entre Parques estaduais, reservas, áreas extrativistas e estações ecológicas, entre outras categorias. Tais unidades somam pouco mais de 3 milhões de hectares no estado, ou pouco mais de 3% do território estadual. Dentre estas, existem apenas 6 (seis) que são RPPNs (Reservas Particulares de Patrimônio Nacional), que são iniciativas do setor privado, que somadas atingem pouco mais de 7 mil hectares, o que é muito pouco para os mais de 3 milhões de hectares de unidades de conservação de responsabilidade do Governo do Estado, o que demonstra a necessidade de criar políticas para ampliar a contribuição do setor privado na criação de áreas protegidas. Segundo dados do próprio governo do Estado, através do site da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, apenas 16 unidades possuem planos de manejo, que é o instrumento técnico que regulamenta o uso sustentável dessas unidades. Persistem ainda em algumas dessas unidades problemas fundiários, além de sofrerem invasões para atividade garimpeira clandestina e extração de madeira com valor comercial.

Neste canário foi proposto pela senadora do Estado de Mato Grosso, Margareth Buzetti, o projeto de lei nº3.649/2023, com o objetivo de estadualização do Parque nacional da Chapada dos Guimarães, ou seja, a transferência de sua gestão, que atualmente é feita pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, para o Governo do Estado de Mato Grosso.

Esse projeto de estadualização já despertou reações adversas no Estado de Mato Grosso, o Conselho Consultivo do Parque Nacional emitiu moção de repúdio contra o referido projeto de lei, estudos de viabilidade técnica que justifiquem a transferência para o âmbito estadual, assim como não informa qual a estrutura irá dispor para uma possível gestão estadual do parque, ou seja, onde, quando e como serão aplicados os recursos financeiros propostos.

O Parque nacional da Chapada dos Guimarães foi criado em 12 de Abril de 1989 pela lei Federal nº97.656, constando área de 32.630 hectares que forma um mosaico paisagístico único e exuberante, com ocorrência de dezenas de cachoeiras, sítios arqueológicos, rica biodiversidade e habitats de espécies da fauna em risco de extinção, além de peculiar formação geológica compondo chapadões e mirantes. Nos Parques Nacionais, o objetivo básico é a preservação dos ecossistemas naturais e é de posse e domínio públicos. Nelas podem ser desenvolvidas atividades de educação ambiental e estudos de pesquisa científica.

Recentemente foi publicado pela imprensa de que o governo do Estado teria disponível em caixa para investir R$ 200 milhões no caso da estadualização do parque nacional ser aprovada e propõe investimentos para fortalecer o ecoturismo desta unidade. Todavia, não há conhecimento de qual projeto técnico e atividades propostas, assim como não houve debate público com os municípios envolvidos no Estado de Mato Grosso, no caso, Cuiabá e Chapada dos Guimarães.

Além disso, há fortes demandas nas 47 unidades de conservação de responsabilidade do governo do Estado de Mato Grosso, que ao longo da história receberam investimentos pífios, necessitando também de intervenções imediatas, de investimentos na sua estruturação física, na regularização fundiária, na elaboração de plano de manejo, instalação de conselhos consultivos, e do fortalecimento da fiscalização para coibir grilagem de terras protegidas, garimpo ilegal e retirada de madeira nessas unidades.

No entorno do próprio Parque Nacional da Chapada dos Guimarães existe uma unidade de conservação estadual, a Área de Proteção Ambiental (APA) da chapada dos Guimarães, com área de 251 mil hectares, ou seja, quase 8 vezes a área do parque nacional da chapada dos Guimarães, e tem como objetivo preservar as feições geomorfológicas das escarpas e do planalto da chapada dos Guimarães, suas matas galerias, o cerrado e das nascentes dos rios e córregos denominados Coxipó, Coxipó-açu, água fria, bom jardim, cachoeirinha, aricazinho, dentre outros recurso hídricos muito importantes, inclusive para a capital mato-grossense.

Essa Área de Proteção Ambiental já tem uma demanda técnica significativa por parte do governo estadual, pois na região do planalto da chapada dos Guimarães, próximo ao monumento do mirante, já vem sofrendo fortes ameaças ambientais devido o avanço de monoculturas e de aplicação de agrotóxicos, provocando desmates, contaminação e assoreamento dos recursos hídricos que precisam ser de maior fiscalização e monitoramento para a conservação ambiental da Área de Proteção Ambiental da Chapada dos Guimarães.

Nesta semana, a comissão de meio ambiente do senado realizou audiência pública quando debateu o projeto de lei da estadualização, sendo proposto a criação de grupo de trabalho para maior aprofundamento do projeto, bem como a possibilidade de uma gestão compartilhada entre governos federal e estadual.

Defendemos também a realização de audiências públicas no Estado de Mato Grosso, com ampla participação popular, oportunidade para debater também a gestão de todas as unidades de conservação estaduais do Estado de Mato Grosso e fortalecer políticas para criação de novas unidades de conservação, inclusive de RPPNs, que atualmente representam apenas 0,25% do total de área correspondente às das unidades de conservação estaduais.

Eduardo Figueiredo Abreu, Engenheiro Florestal, Assessor Parlamentar

 

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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