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Artigo

O cidadão como protagonista no processo de consumo sustentável

 

cuidando da Terra

O cidadão como protagonista no processo de consumo sustentável, artigo de Renata Ross

O cidadão comum assiste a debates, como os da Cúpula de Líderes do Clima, na condição de plateia, sem se dar conta que também é protagonista. É comum nos sentirmos impotentes quando nos deparamos com problemáticas grandes e complexas: como resolver o buraco da Camada de Ozônio? Como despoluir os oceanos? Questões grandiosas e de grande impacto costumam nos paralisar, pois frequentemente nos sentimos muito pequenos para lidar com assuntos tão sérios. Por isso, a melhor maneira de se fazer algo é olhando ao redor para buscar entender como, enquanto indivíduo, dar a sua contribuição. Dê o primeiro passo, mude a rota com pequenas ações.

Aprendemos cedo que na natureza não existe lixo, nela tudo se transforma, mas a verdade é que atualmente quase tudo ao nosso redor é artificial, desde tecidos, cadeiras, sapatos, eletrônicos, alimentos embalados etc. Esses padrões de consumo foram incentivados com o fim da Segunda Guerra Mundial, haja vista que a economia estava quebrada e o mundo precisava se reconstruir. O entendimento foi de que a melhor maneira de nos reestruturarmos seria por meio do consumo. Somado a isso, enquanto seus maridos estavam nos frontes de batalha, muitas mulheres precisaram adentrar ao mercado de trabalho e passaram a exercer um papel que até então era desempenhado pelos homens. Com essa mudança no cotidiano das famílias, surgiu a demanda por produtos mais práticos: papinhas enlatadas, fraldas descartáveis e vários outros itens que passaram a permear os lares mundo afora.

Com o tempo essa tendência de consumo se intensificou. Hoje, de acordo com a ONU, 99% dos produtos que compramos, são jogados fora num período de seis meses. Geramos aproximadamente dois bilhões de toneladas de lixo por ano. A maior parte formada por plásticos. Para agravar o cenário, a estimativa é de que desse total, cerca de 25 milhões de toneladas vão parar nos oceanos. Mas como esse lixo todo acaba sendo depositado nos mares? Por mais difícil que seja de acreditar, a maior parte desse resíduo é gerada nos centros urbanos e combina ineficiência de políticas públicas em torno da gestão de resíduos, questões de ordem social e de educação. Sabe aquela embalagem de plástico que você viu jogada na rua? Se não for recolhida, nas próximas chuvas será dragada pelo bueiro mais próximo e, após uma viagem por rios e córregos, possivelmente terá os mares como destino final. Já temos notícias de cinco grandes zonas de lixo, ou ilhas de plásticos, existentes nos Oceanos. Para a gente ter uma ideia, uma dessas ilhas está localizada próxima ao Havaí, ocupando uma área equivalente a duas vezes o território da França, há quem diga que a extensão seja ainda maior e que representa, na verdade, três vezes o território francês.

Segundo o Instituto de Pesquisas para o Desenvolvimento, da França, cerca de 1,5 milhão de aves, peixes, baleias e tartarugas marinhas morrem todos os anos por causa do plástico. Como tudo o que é da natureza, os corpos desses animais se decompõem, mas os plásticos que foram ingeridos – e que por vezes foi causa da morte destes seres vivos – permanecerão na natureza por tempo indeterminado, porque naturalmente o plástico não se decompõe, o que ocorre é um processo de degradação contínuo que tem como produto final os já conhecidos microplásticos. E é exatamente aí que a coisa complica, como poderemos coletar partículas tão pequenas nos oceanos e em corpos d ´água? Estes microplásticos passam a compor o ambiente e são facilmente confundidos como alimento por plânctons, peixes e outras vidas marinhas. Não bastasse o cenário catastrófico que se configura como a causa da morte de milhares de animais, em algum momento a conta também chega para nós, já que ao ocupar o topo da cadeia alimentar, estes microplásticos são fatalmente ingeridos por seres humanos.

É lamentável e até mesmo triste observar os impactos que nossas escolhas provocam. Além de todos os efeitos nocivos, houve uma piora significativa na qualidade dos produtos, sobretudo alimentícios e bens duráveis. Essa mudança também empobreceu a experiência de consumo como um todo. A garrafa de vidro, que precisava ser devolvida para posterior reenvase, cedeu lugar à garrafa plástica, que além de ser de uso único, costuma alterar o sabor da bebida.

Voltando no tempo, perceberemos que uma questão de ordem fundamentalmente econômica faz toda a diferença e explica como chegamos até aqui. Há alguns anos o leiteiro entregava o leite numa garrafa que era reutilizável, neste modelo as embalagens são consideradas um ativo, uma vez que seu custo é diluído pela quantidade de vezes que poderá ser envasada para o mesmo fim. É evidente que esses recipientes eram fabricados para durar. Já no modelo atual, as embalagens da maior parte dos produtos entram como passivos, pois compõem o custo total daquele produto, logo, quanto mais baratas, menor será o custo total do produto finalizado.

A indústria criou uma urgência no consumo que nós, sociedade, aceitamos e incluímos no nosso dia a dia. Passamos a consumir diversos itens descartáveis, considerados o supra sumo da praticidade, mas desconsideramos todos os fatores negativos que desencadeiam. Essa praticidade está tão presente em nossos hábitos, que fica difícil enxergar uma realidade diferente desta em que vivemos. Nesse processo, sem perceber abrimos mão da qualidade e do prazer associado ao ato de consumir alimentos e bebidas ou alguém duvida que o sabor de uma bebida envasada numa garrafa de vidro é melhor do que numa garrafa plástica?

Precisamos assumir nosso protagonismo, fazer novas escolhas e demandar mudanças que busquem resgatar melhores práticas. Fácil não é, mas é necessário e urgente.

*Renata Ross é gestora de Marketing e Relacionamento na TerraCycle. líder no desenvolvimento de soluções ambientais para produtos e embalagens de difícil reciclagem.

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 28/05/2021

 

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