EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Artigo

Comportamento do Consumidor: A Influência da Antropologia Cultural, artigo de José Austerliano Rodrigues

 

artigo

Comportamento do Consumidor: A Influência da Antropologia Cultural, artigo de José Austerliano Rodrigues

[EcoDebate]

Comportamento do consumidor tornou-se uma das áreas mais estudadas no campo de Marketing e, diante da crescente emissão de gás carbônico, consumo da água e outros problemas ecológicos, a produção e o consumo global estão se tornando, também, áreas cada vez mais urgentes de serem estudadas.

Sabe-se que as inovações tecnológicas são exigidas para reduzir estes problemas ecológicos, mas a importância e papel do consumo estão recebendo muita atenção nos anos mais recentes (SMART, 2010; SPAARGAREN; OOSTERVEER, 2010; VAN TRIJP; FISCHER, 2011).

Para Solomon (2016): O campo de estudo de comportamento do consumidor abrange uma ampla área, sendo conceituado como sendo “o estudo dos processos envolvidos quando indivíduos ou grupos selecionam, compram, usam ou descartam produtos, serviços, ideias ou experiências para satisfazer necessidades e desejos”. Assim sendo, enquanto objeto acadêmico, o comportamento do consumidor é um campo especializado dentro do marketing baseado nas ciências sociais, que tenta descrever, entender e predizer a tomada de decisão do consumidor como uma função de variáveis demográficas, psicológicas e sociológicas, como variáveis independentes.

Na teoria convencional de comportamento do consumidor a ênfase é na relação entre o vendedor e o consumidor através do chamado mix do marketing que eles oferecem ao consumidor. Além do convencional mix “Ps” (produto, preço, praça e promoção), a oferta do mercado embute elementos como marca e reputação associados com o produto e produtor e (dependendo da estrutura do mercado) a marca do distribuidor que oferta o produto.

Todavia, a partir da década de 1980, a pesquisa do consumidor e o discurso gerencial de marketing sofrem os bombardeios da antropologia, quando surge outra corrente paradigmática como alternativa à epistemologia positivista dominante: o interpretativismo. Embora os estudos interpretativistas do consumo tenham sido utilizados desde décadas anteriores, essa abordagem ganhou força nos anos mais recentes, sendo fortemente influenciada pela antropologia cultural, que leva em consideração os fatores culturais (antropologia digital, cultura, subcultura e classe social do consumidor) (KOTLER; KELLER, 2018; KOTLER; KARTAJAYA; STIAWAN, 2017). Assim sendo, o objetivo principal destes autores é aprofundar o entendimento dos fenômenos de consumo e seus significados, questões essas pouco ou nada consideradas pelo positivismo (HOLBROOK; O’SHAUGHNESSY, 1988; KASSARJIAN; GOODSTEIN, 2010).

Neste caso, o estudo de consumo é amplamente realizado dentro do campo da pesquisa do consumidor, enquanto subcampo da teoria de marketing, que consiste de três áreas principais: modelagem econométrica, processamento de informação e a teoria da cultura do consumidor (Consumer Culture Theory – CCT) (ARNOULD; THOMPSON, 2005, 2007). Enquanto escola de pensamento do campo de marketing, esta teoria tem o olhar voltado para a sociedade pós-moderna (BRAUDILLARD, 1998), baseado nas teorias antropológicas e sociológicas, estudando o consumo a partir de um ponto de vista social e cultural. Não se trata de uma teoria unificada, mas de uma família de perspectivas teóricas que tratam das relações dinâmicas entre as ações dos consumidores, o mercado e os significados culturais. Como dito acima, só a partir dos anos de 1980, durante a virada cultural, é que CCT emergiu como um campo distinto dentro da pesquisa de marketing (EKSTROM, 2003).

CCT rejeita a teoria econômica tradicional de consumo como derivada de um sistema de produção sem problemas, baseado em necessidades. Em vez disto, CCT entende consumo como práticas simbólicas na organização das relações sociais. O tradicional modelo econômico de comportamento do consumidor vem sofrendo um forte ataque nos anos mais recentes. Os economistas comportamentais, que conduzem experimentos de laboratórios e realizam simulações de jogos gerados por computadores para testar as suposições básicas sobre o Homo Economicus, têm se deparado com as falhas. Os neuropsicólogos descobriram que as pessoas experimentam prazeres quando agem contra seus autointeresses mal definidos e os antropólogos descobriram que os consumidores comuns têm pouca semelhança com os materialistas que calculam seus autointeresses e fazem parte do mundo imaginado da teoria econômica neoclássica. Portanto, muitas das suposições do modelo econômico-clássico sobre os atores racionais e autointeressados estão sendo desafiadas, já que foram desenhadas para encorajar o egoísmo em oposição ao comportamento cooperativo, num momento em que muitos preferem cooperar. Estes diferentes campos de pesquisas apoiam os sociólogos que há muito tempo exigem que as considerações altruísticas e éticas sejam centrais para o mundo real na troca do mercado.

Infelizmente, mesmo nos dias de hoje, boa parte dos esforços dos governantes em apoiar o consumo sustentável tem se baseado no modelo de escolha racional do comportamento do consumidor, que considera que os consumidores sempre tomam decisões racionais com o objetivo de maximizar seus autointeresses econômicos. As pesquisas mais recentes, contudo, não dão crédito ao modelo de escolha racional, sendo os programas e ações políticas dele originados vistas com sendo incompletas e ingênuas (ALLAWAY; KOCHAM, 2012).

Este tipo de status quo na agenda de pesquisa foi mantido mesmo se durante as últimas décadas muitas disciplinas sociais e humanistas (sociologia, antropologia, psicologia, história, filosofia ou literatura) estejam expressando um interesse claro e uma contribuição profunda em promover o consumo como um tópico interdisciplinar. A economia restringiu suas manifestações em direção ao consumo para a área de marketing, área que, como vimos, estuda o comportamento do consumidor, mas com uma clara orientação sobre o consumidor como um objeto de interesse dos produtores e não como objeto de seu interesse (IANOLE; CORNESCU, 2013).

José Austerliano Rodrigues. Doutor em Marketing Sustentável pela UFRJ, com ênfase em Sustentabilidade e Marketing, com interesse em pesquisa em Marketing Sustentável, Sustentabilidade de Marketing, Responsabilidade Social e Comportamento do Consumidor. E-mail: austerlianorodrigues@bol.com.br.

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 02/06/2020

[cite]

 

CONTEÚDO SUGERIDO / PUBLICIDADE



 

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate com link e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate, ISSN 2446-9394,

Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta enviar um email para newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

Remoção da lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate

Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para newsletter_ecodebate+unsubscribe@googlegroups.com ou ecodebate@ecodebate.com.br. O seu e-mail será removido e você receberá uma mensagem confirmando a remoção. Observe que a remoção é automática mas não é instantânea.