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Verdades inconvenientes sobre a proposta de Lei Geral do Licenciamento Ambiental, por Luis E. Sánchez, Alberto Fonseca e Marcelo Montaño

 

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Verdades inconvenientes sobre a proposta de Lei Geral do Licenciamento Ambiental, por Luis E. Sánchez, Alberto Fonseca e Marcelo Montaño

[USP] Foi divulgada na noite de 8 de agosto a versão “final” do Projeto de Lei (PL) da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, que pode ser votado a qualquer momento no plenário da Câmara dos Deputados. Diferentemente da reforma da Previdência Social, que mobilizou toda a sociedade brasileira, a reforma do licenciamento ambiental tramita em regime de urgência sob o escrutínio tímido de uma pequena parcela da sociedade atenta ao assunto. Assim como a previdência, a reforma do licenciamento ambiental também afeta o futuro de todos os brasileiros, seus filhos e netos. Entretanto, grande parte da população terá dificuldade de opinar sobre essa nova reforma sem recorrer aos simplismos veiculados pelas mídias sociais, tais como “licenciamento nada tem a ver com desmatamento”, como afirmou dia 9 de agosto o coordenador do grupo de trabalho, deputado Kim Katiguiri. Nesse contexto, é importante esclarecer três grandes verdades.

A primeira grande verdade, inconveniente para aqueles que defendem o modo afobado como o atual PL foi elaborado, é que a colcha de retalhos em que se transformou o licenciamento ambiental demanda uma lei geral orientada pelo princípio constitucional de assegurar um meio ambiente ecologicamente equilibrado para todos. Todavia, para assegurar a viabilidade política da nova lei, a Câmara precisará encontrar um equilíbrio entre expectativas conflitantes de parcelas da sociedade brasileira, reconhecendo que o espaço oferecido até o momento para o diálogo não pode ser compreendido como suficiente.

A segunda grande verdade, inconveniente para defensores do atual projeto de lei, é que a proposta não é nada equilibrada. Os diversos artigos do PL privilegiam os anseios de certos setores empresariais e (pasmem!) de dirigentes de alguns órgãos licenciadores, a ponto ser possível verificar a existência de pontos inegociáveis e, portanto, previamente acordados, como a isenção do licenciamento concedida a atividades agropecuárias e a certas obras de infraestrutura. O principal objetivo anunciado é agilizar o processo decisório, o que é imprescindível, mas, ao pretender atingi-lo por meio de procedimentos simplificados e redução nas exigências de estudos de impacto ambiental e de participação de órgãos intervenientes, percebe-se um claro prejuízo ao equilíbrio do texto final. Se a Lei Geral do Licenciamento Ambiental for aprovada da forma como se encontra, teremos menos estudos ambientais e mais decisões arbitrárias e mal informadas. Tais alterações poderão beneficiar, no curtíssimo prazo, parte do setor produtivo, que terá suas licenças ambientais aceleradas e barateadas, bem como os dirigentes dos órgãos licenciadores, que terão seus passivos administrativos reduzidos.

Nas audiências públicas promovidas pela Câmara dos Deputados manifestaram-se especialistas em licenciamento ambiental, oferecendo alternativas consistentes para o equilíbrio pretendido. Infelizmente, o coordenador aceitou pouco do ofertado. Contribuições com fundamentação no conhecimento científico foram absolutamente desconsideradas – e sem qualquer justificativa. Apesar dos alertas, o texto do PL que vai a plenário mantém incoerências internas e diversos artigos com profundas fragilidades técnicas e jurídicas.

A terceira grande verdade, inconveniente para todos nós, é que a agilização administrativa pretendida deverá dificultar, e muito, os investimentos. Ao insistir nos erros reiteradamente apontados e ignorar as alternativas que lhe foram apresentadas, o deputado Kim entrega à Câmara do Deputados uma proposta de lei que, aprovada dessa forma, irá resultar em retrocesso na proteção ambiental e potencializar conflitos entre entes federativos e partes interessadas, desencadeando dois problemas principais: 1) insegurança jurídica para quem pretende investir no Brasil, sobretudo no longo prazo, quando os efeitos adversos do PL começarem a se manifestar; e 2) dificuldade para obter financiamento junto a bancos de desenvolvimento, fundos de investimento e bancos privados que, cada vez mais, adotam salvaguardas socioambientais.

Cabe agora ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, ponderar se encaminha ao plenário um texto capenga, que será provavelmente combatido no Senado, ou se determina a retomada do diálogo com vistas à produção de um texto que compatibilize a proteção dos recursos ambientais para as presentes e futuras gerações com sustentabilidade econômica e social.*

 

* Duas notas técnicas sobre o projeto de lei foram preparadas pelos autores, em colaboração com outros pesquisadores, e estão disponíveis em https://doi.org/10.13140/RG.2.2.25204.19841 e https://doi.org/10.13140/RG.2.2.10309.81121.

 

Luis E. Sánchez é professor titular da Poli-USP; Alberto Fonseca é professor associado da Escola de Minas da UFOP; Marcelo Montaño é professor associado da Escola de Engenharia de São Carlos (USP)

 

Do Jornal da USP, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 19/08/2019

[cite]

 

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