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Artigo

Os 200 anos do livro ‘Frankenstein, ou o moderno Prometeu’, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

“Monstro é aquele que não sabe amar.
Os filhos abandonados da pátria que os pariu”.
Enredo da Beija-Flor para o carnaval 2018

 

Os 200 anos do livro 'Frankenstein, ou o moderno Prometeu'

 

[EcoDebate] O livro “Frankenstein, ou o moderno Prometeu”, de Mary Shelley, tem inspirado a imaginação popular e fomentado a discussão sobre o papel da ciência e da tecnologia no mundo moderno. O livro é uma das obras-primas da imaginação da literatura mundial e foi publicado no dia 01 de janeiro de 1818. Portanto, vai fazer duzentos anos no primeiro dia de 2018.

O impressionante é que o livro foi concebido, em junho de 1816, quando Mary Shelley tinha apenas 18 anos. Ela fez uma versão mais curta nos meses seguintes e expandiu a obra em 1817. Como dito, o livro foi publicado na virada do ano de 1818 e se tornou um sucesso nas livrarias e bastante difundido no cinema e na televisão.

Embora o romance seja mais frequentemente discutido como um exemplo do romantismo ou como um trabalho pioneiro e inovador de ficção científica – Mary Shelley estava profundamente consciente dos desenvolvimentos científicos contemporâneos e incorporou-os em sua história. O livro reflete sobre o desenvolvimento da ciência e os limites da Razão. Vários centros de pesquisa do mundo fizeram seminários e edições comemorativas do livro, especialmente nas áreas de engenharia e biologia.

Mary Shelley viveu em um ambiente intelectual dos mais avançados da Inglaterra (e do mundo). Seu pai, William Godwin, foi um filósofo e político revolucionário que defendia as ideias libertárias dos iluministas e os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade da Revolução Francesa, escrevendo, dentre outros, o famoso livro “Inquérito acerca da justiça política”. Sua mãe, Mary Wollstonecraft, foi a pioneira do feminismo moderno e escreveu o seminal livro “Reivindicação dos Direitos da Mulher”.

Mary Wollstonecraft Godwin (nome de solteira de Mary Shelley) nasceu no dia 30/08/1797 e sua mãe morreu poucos dias depois, em função de complicações do parto. Infelizmente, a primeira feminista da era moderna morreu de morte materna, o que mostra a gravidade desta evitável causa de morte.

Não custa lembrar que William Godwin e Mary Wollstonecraft eram amigos e parceiros intelectuais de Thomas Paine e de Condorcet. Marie Jean Antoine Nicolas de Caritat (1743-1794), conhecido como Marquês de Condorcet, foi um filósofo, matemático, iluminista e revolucionário francês. Ele escreveu o influente livro “Esboço de um quadro histórico dos progressos do espírito humano”. Condorcet era pacifista, abolicionista, defendia o progresso da ciência, a educação universal, o avanço tecnológico, a produtividade agrícola e se destacou na defesa da equidade de gênero e no direito de voto feminino.

Thomas Paine (1737-1809), nascido na Inglaterra, foi um pensador radical, inventor, intelectual e revolucionário, sendo um dos Pais Fundadores dos Estados Unidos da América e também uma das lideranças da Convenção Nacional na Revolução Francesa. Seu livro Common Sense (1776) se tornou um grande best seller e foi fundamental para a Independência dos EUA. Na França publicou o livro Rights of Man (1791), defendendo os ideais Iluministas e The Age of Reason (1794), onde advoga a filosofia Deísta, critica as religiões institucionalizadas e argumenta em defesa da razão e do livre pensar. Ainda na França, escreveu o livro Agrarian Justice (1795), onde reflete sobre as origens da propriedade e o direito que todas as pessoas deveriam possuir sobre os frutos do uso e produção da terra. Ele introduziu, de maneira inovadora, o conceito de renda mínima.

Portanto, a geração anterior a Mary Shelley era de uma grandeza intelectual sem comparação. Ela não só herdou esta bagagem intelectual, como conviveu como uma nova geração, igualmente, de grande capacidade intelectual, poética e científica. Ela conhecia os experimentos de Luigi Galvani (1737 – 1798) e do médico Erasmus Darwin (1731-1802), avô de Charles Darwin, assim como as obras e as realizações do grande naturalista Alexander von Humboldt (1769 – 1859) – que era antiescravista e incentivador da independência dos países latino-americanos, além de amigo e incentivador de Simon Bolívar.

Em junho de 1816, Mary acompanhou o seu futuro marido, o poeta Percy Shelley (1792-1822), o médico e escritor John Polidori (1795-1821) e o famoso poeta Lord Byron (1788-1824) a uma viagem de férias à Suíça. Eles ficaram hospedados na Villa Diodati, nas cercanias do lago Genebra, onde o livro “Frankenstein, ou o moderno Prometeu” foi concebido. Cabe também registrar que Mary Wollstonecraft e Mary Shelley é a dupla, de mãe e filha, de maior sucesso literário e reconhecimento científico da história da língua inglesa.

No romance, o estudante de química Victor Frankenstein, depois de estudar galvanismo, desenvolve uma técnica secreta para imbuir corpos inanimados com vida. Ele sonhava produzir uma bela Criatura, mas produziu um ser com aparência de monstro. Victor renega a Criatura e foge na tentativa de esquecer sua criação. Isto deixa a Criatura confusa, com raiva e com sentimento de rejeição. Porém, a despeito do horror que provoca nas pessoas, a Criatura sobrevive e se educa sozinha e, depois de vários desencontros e várias tragédias, encontra-se novamente com Victor Frankenstein e exige que ele crie uma companheira, com as mesmas características, para que o novo casal pudesse viver longe da civilização (nas florestas selvagens da América do Sul). A princípio Victor concorda, mas depois se nega a fazer a Criatura feminina, com medo de dar início a uma nova “raça de monstros”. Neste ponto, Criador e Criatura entram em guerra aberta, cada um tentando aniquilar a vida do outro.

Mary Shelley utiliza as ideias de Jean-Jacques Rousseau para desenvolver o processo de aprendizado e socialização da Criatura: “Nascemos livres, mas vivemos acorrentados na sociedade” (tal como Prometeu acorrentado). Ela apresenta o roteiro da transformação da Criatura em Monstro com base na ideia rousseauniana de que “O homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe”.

A mensagem do livro “Frankenstein, ou o moderno Prometeu” é sobre as injustiças sociais e os efeitos não antecipados da ciência e da tecnologia. A autora trata a tecnologia como uma força autônoma que, em vez de necessariamente gerar progresso e bem-estar, pode gerar aberração e monstruosidade, voltando-se contra o próprio criador e atuando em oposição aos interesses da sociedade. Em vez de ser uma solução, a tecnologia vira um problema.

O livro de Mary Shelley continua atual e popular. Por exemplo, a escola de samba Beija-Flor de Nilópolis, decidiu levar para a Sapucaí, no Carnaval de 2018, a história de Frankenstein, com o seguinte título do enredo: “Monstro é aquele que não sabe amar. Os filhos abandonados da pátria que os pariu”.

O enredo tratará a estória de Frankenstein pelo lado da crítica social, abordando temas como: “guerra santa brasileira”, o sagrado versus profano, a religião na política, o dízimo cobrado dos fiéis, etc. A sinopse do enredo diz: “Esse romance tem muito a nos dizer das diversas mazelas que atualmente corroem a integridade moral e espiritual de uma sociedade onde a desigualdade se alimenta do descaso, tornando uma geração formada pelo caos, vitimada pelo abandono, que menosprezam tudo e a todos que lhes parece inadequados. O monstro de Frankenstein é a nossa realidade invertida”.

 

“Monstro é aquele que não sabe amar. Os filhos abandonados da pátria que os pariu”.

 

Mary Shelley é realmente uma grande referência para o século XXI. Ela antecipou a crítica moderna ao denunciar as injustiças sociais e ao sugerir que a tecnologia que gerou progresso, também gerou poluição das cidades, eliminou empregos, modificou a vida das pequenas comunidades, provocou acidentes (radiação atômica, vazamentos de petróleo, etc.), assoreou os rios, esvaziou aquíferos, desmatou florestas, acidificou os oceanos, aqueceu a atmosfera e provocou mudanças climáticas.

O desenvolvimento tecnológico gerou muita riqueza, mas também gerou muita desigualdade social e retrocesso ambiental. Mary Shelley fez ainda uma crítica à intolerância e ao preconceito em relação à diferença e à alteridade. Para consultar mais sobre o significado do livro, acessar o artigo abaixo:

ALVES, JED. Frankenstein e o ‘monstro’ do aquecimento global, # Colabora, RJ, 17/10/2010
https://projetocolabora.com.br/clima/frankenstein-e-o-aquecimento-global/

 

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 23/10/2017

[cite]

 

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