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Artigo

Associação para Proteção Ambiental de São Carlos, 40 anos – uma reflexão, artigo de Paulo José Penalva Mancini

 

[EcoDebate] No dia 28 de maio de 2017 a APASC- Associação para Proteção Ambiental de São Carlos, completa 40 anos de existência, quando no final de uma “Semana de Estudos Ecológicos” organizada por estudantes da UFSCar em conjunto com profissionais do SENAC – Serviço Nacional do Comércio de São Carlos, após uma palestra proferida pelo saudoso professor Mário Tolentino sobre “Problemas Ambientais de São Carlos”, os presentes decidiram formar uma comissão provisória para constituição de uma associação voltada à proteção ambiental de nosso município. Foi a primeira entidade ambientalista de nossa cidade, e uma das pioneiras no estado de São Paulo e no Brasil. À época uma das entidades inspiradoras foi a AGAPN – Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, de Porto Alegre, então presidida pelo engenheiro agrônomo e ambientalista José Lutzemberger.

Há 40 anos praticamente não existia nenhuma legislação ambiental. O Código das Águas da dedada de 1930 e o Código Florestal de 1965, além de pouco conhecidos e aplicados, tinham como propósito, principalmente, garantir o aproveitamento de água e madeira para fins energéticos para o uso humano. Não havia ainda – expressa em lei – uma preocupação e valorização do ambiente ou da natureza em si mesma. Apenas em 1981 foi aprovada a Política Nacional de Meio Ambiente, lei federal 6.938/81. De maneira geral os ambientalistas eram vistos como românticos, sonhadores, poetas, malucos ou, até mesmo, ‘veados’. E, realmente, os artistas –sempre os mais sensíveis e mais ‘antenados’ às tragédias de seu tempo eram, quase solitariamente, eram quem mais denunciavam a devastação da natureza em curso. Depois deles vieram os ambientalistas ‘eco-chatos’ e depois, finalmente, os e as cientistas são hoje os que mais e melhor operam o ‘ambientalismo’ em geral, e anunciam (ainda ignorados como nós os ambientalistas no passado) o apocalipse com o aquecimento global.

De sua primeira ação em defesa do meio ambiente em São Carlos, ainda em 1977 – uma carta à Prefeitura solicitando providências para evitar a deposição de lixo e entulho na área verde então conhecida como “Buracão do Asilo”, hoje o “Bosque das Paineira” situado no final da rua Padre Teixeira, no Jardim Bethânia – à última – uma solicitação de providências à Prefeitura e ao Ministério Público para apurar podas e cortes de árvores, provavelmente irregulares feitos pela concessionária de energia elétrica – foram muitas e algumas muito grandiosas as ações da APSC na defesa do meio ambienta do loca, tais como, citando apenas algumas: articulação para que a Prefeitura contratasse técnicos com formação superior e real competência para administração do Parque Ecológico de São Carlos; ativa participação em articulações para impedir a instalação de aeroporto internacional em extensa área de cerrado ao lado da Represa do Lobo (Broa); ação judicial para impedimento de instalação de mineradora de areia quartzosa no manancial do ribeirão Feijão;; ações contra deposição de lixo municipal e industrial em antigo lixão; ação judicial para impedir a construção de avenidas marginais em áreas de preservação permanente; representações contra a implantação de indústrias sem a aprovação de um estudo de impacto ambiental; através de ativa participação no COMDEMA – CONSELHO Municipal de Defesa do Meio Ambiente, teve papel relevante na elaboração e aprovação das áreas municipais de proteção e recuperação de mananciais (APREMs-SC).

Junto com todo movimento ambientalista brasileiro a APASC participou de grandes campanhas contra um desenvolvimentismo alheio à relevância da conservação de nossos biomas para uma sociedade sustentável, e também às reais necessidades da maioria da população brasileira.

Sempre com caráter apartidário, a APASC nasceu em um momento em que a sociedade brasileira buscava, nas brechas do regime ditatorial vigente, espaços para o exercício da participação cidadã, convicta de que é impossível fazer gestão ambiental sem participação popular, livre e democrática. Não há, historicamente, por parte da população brasileira tradição de participação e controle social da gestão dos bens públicos e nada é mais ‘público’ (de todos e todas) que o ‘meio’ em que vivemos e sobrevivemos. Por isso ainda estamos longe de tornarmo-nos cidades e sociedades sustentáveis e estamos deixando de herança aos nossos filhos e filhas um futuro catastrófico, a permanecermos na inércia do atual modelo desenvolvimento sócio-econômico-tecnológico. Sobretudo, nesse momento em que o Brasil enfrenta sérios retrocessos em sua incipiente e frágil democracia, cabe ressaltar sua relevância para defesa do meio ambiente: um regime autoritário que ceifa os direitos de seres humanos, o que não fará com os direitos da natureza?

Foram muitas, e para melhor, as conquistas que tivemos no mundo, no Brasil e em São Carlos na área ambiental, mas ao comemorar 40 anos de existência temos que renovar as energias para buscarmos ainda maior eficiência para construirmos sociedades e cidades melhores, mais seguras, menos desiguais, menos violentas, que aproximem mais as pessoas entre si e estas com toda a comunidade viva natura.

Não podemos, nesta celebração de quatro décadas de existência, continuar a agir pelo que, especialmente, nos motiva: a proteção ambiental de São Carlos. Nesse sentido, para não sermos demasiados apresentamos à toda sociedade são-carlense, nossas autoridades e lideranças, apenas quatro – uma por década, mas para serem implementadas simultaneamente – que gostaríamos que enquanto comunidade humana, ofertássemos a toda natureza que nos sustenta, e às nossas futuras gerações:

1. Floresta Urbana/Ecocidadania rural – as cidades são espaços modificados para o melhor habita humano. Mas como seres também naturais não podemos nem devemos nos isolar da natureza, a trágica inexorabilidade do aquecimento global (a dúvida é de quantos graus em média a temperatura de nosso planeta vai subir) impõe-nos buscar através de intensa arborização urbana, um microclima local adaptado às nossas necessidades. A agricultura urbana também deve contribuir para que vicejem mais matas nativas em nossos campos, essenciais para manutenção da vida selvagem, e para a produção de alimentos saudáveis através de uma agricultura ecológica.

2. Saneamento Ambiental – é preciso que São Carlos atualize sua gestão das águas, avançando no sentido e princípios da Política Nacional de Saneamento, integrando os serviços de captação, tratamento e fornecimento de água potável; coleta e tratamento de esgoto; drenagem de águas pluviais e coleta, tratamento e disposição final de resíduos sólidos. Unificar esses serviços sob a gestão de nossa autarquia municipal – o Serviço Autônomo de Água e Esgoto – e garantir o pleno controle social dessa autarquia através de um Conselho Administrativo com forte participação de usuários, será uma medida ‘saneadora’ para desvios e problemas graves que ainda enfrentamos na área de saneamento municipal.

3. Educação Ambiental – São Carlos destaca-se, historicamente, pela quantidade e qualidade de suas instituições de ensino. Nesse sentido temos que envidar esforços para que todo nosso ambiente seja educador. Já pleiteamos e recebemos o título de Cidade Educadora. Todo ambiente nos ensina, mas precisamos aprender com ele. É imperativo nos educar para respondermos adequadamente às nossas próprias necessidades enquanto seres vivos e humanos. É pela educação que nossa relação com o meio (qual seja ele) se constrói ou destrói. É preciso que se resgate as instâncias de educação ambiental nas secretarias de educação, meio ambiente, trânsito e se criem ainda outras como na agricultura, no esporte, etc.

4. Democracia social e participativa – a democracia representativa que teve seu nascedouro na segunda metade do século XVIII era um imperativo para uma sociedade que começava a concentrar-se em ‘buros’ (cidades), vindo a constituir-se em uma sociedade de massa. Os meios de comunicação e a própria formação cultural, política e educacional da época, não permitia a participação direta de todo cidadão e muito menos cidadãs (nossas sociedades eram e ainda são muito patriarcais). A tecnologia e a cultura digital desenvolvida pra generosos gênios, permitem maior transparência e participação direta da população na gestão da cidade. Nosso sistema educacional e seus equipamentos públicos e privados podem e devem ser usados para capacitar e potencializar grupos sociais para participação qualificada e exercício de efetivo controle social das políticas e serviços públicos.

Saúde, transporte público e segurança que são os temas que hoje – pela má qualidade dos serviços públicos oferecidos – mais afligem nossa comunidade, certamente seriam muito positivamente afetados – talvez até integralmente satisfeitos – especialmente se as três últimos itens – saneamento ambiental, educação ambiental e democracia participativa plena – forem implementados de forma efetiva.

Por pouco que foi feito nestas quatro décadas – poderíamos e deveríamos ter feito muito mais – contudo, podemos dizer, sem falsa modéstia, que São Carlos estaria pior em qualidade ambiental não existisse a APASC.

Mais 40 anos, 2057, muitos de nós não estaremos por aqui, trabalhemos para que a ‘catástrofe climática’ anunciada para o Planeta não se confirme; e para que em São Carlos os efeitos do inevitável aquecimento global sejam amenos para nossos descendentes são-carlenses.

São Carlos, 28 de maio de 2017

Paulo José Penalva Mancini

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 02/06/2017

[cite]

 

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