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Artigo

O segundo colapso da ilha de Páscoa, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

“A Ilha de Páscoa é o exemplo mais claro de uma sociedade que se autodestruiu
ao explorar demais os próprios recursos. É um exemplo de ecocídio”
Jared Diamond

 

as estátuas da ilha da Páscoa

 

[EcoDebate] A Ilha de Páscoa, ou Rapa Nui, é uma ilha da Polinésia oriental, localizada no sul do Oceano Pacífico e está situada a 3.700 km de distância da costa do Chile e, atualmente, constitui a província chilena de Ilha de Páscoa. A colonização da Ilha de Páscoa ocorreu em função das viagens dos povos vindos do continente asiático e das ilhas da Polinésia Ocidental.

Na modernidade, a Ilha de Páscoa foi (re)descoberta num domingo de Páscoa de 1722, pelo navegador holandês Jacob Roggeveen que ficou impressionado com as gigantescas estátuas de pedra (chamadas Moais), espalhadas pela ilha e pela total falta de vegetação. Segundo os exploradores europeus, as estátuas e a desertificação da ilha pareciam testemunhas de uma sociedade em colapso.

De acordo com a histografia, no passado, os primeiros habitantes da ilha de Rapa Nui formavam uma sociedade rica e próspera que entrou em colapso em consequência da degradação ambiental. Segundo essa teoria, um pequeno grupo de colonizadores da Polinésia teria chegado entre os séculos IX e X. Trezentos anos depois, o aumento populacional acelerado e a obsessão em construir moais levaram a uma pressão cada vez maior no ambiente. No final do século XVII, os rapanui haviam desmatado a ilha, o que resultou em guerras, fome e colapso cultural.

Essa versão é defendida pelo geógrafo Jared Diamond que usou os rapanui como parábola sobre os perigos da destruição ambiental. Para Diamond, em apenas alguns séculos, os habitantes da Ilha de Páscoa liquidaram suas florestas, levaram suas plantas e animais à extinção, e viram sua complexa sociedade rumar para o caos e o canibalismo. No livro, Colapso, publicado em 2005, Diamond descreveu Rapa Nui como “o exemplo mais claro de uma sociedade que se autodestruiu ao explorar demais os próprios recursos”.

Entretanto, esta narrativa é contestada por outros estudiosos, Terry L. Hunt, que considera que o colapso Rapa Nui foi provocado ou acelerado pela chegada dos Europeus em 1722. Para ele, doenças trazidas de fora, conflitos com invasores europeus e escravidão seguiram-se durante os 150 anos seguintes, e essas foram as principais causas do colapso. No começo da década de 1860, mais de mil rapanui foram levados da ilha como escravos e, no final da década seguinte, o número de habitantes nativos chegava somente a cerca de 100. Em 1888, a ilha foi anexada ao Chile.

Qualquer que seja a explicação, o fato é que houve degradação ambiental da ilha e é impossível manter uma civilização (e suas obras de arte como os Moais) sem haver uma base ambiental que sustente a vida humana e a biodiversidade.

A Ilha de Páscoa é um micro exemplo de autodesastre. O Planeta pode repetir o mesmo desastre ao nível macro. Nos últimos 250 anos, o crescimento do industrialismo e da Pegada Ecológica atingiu níveis insustentáveis. Além da perda de biodiversidade e da degradação dos ecossistemas, a emissão de gases de efeito estufa (GEE) estão acelerando o aquecimento global e provocando o degelo dos polos e dos glaciares. Isto já está elevando o nível dos oceanos e a perspectiva que este aumento se acelere assim como os efeitos climáticos extremos.

De acordo com relatório elaborado por diversos cientistas e divulgado em junho de 2016 pela Organização das Nações Unidas (ONU), 31 patrimônios culturais da humanidade, em 29 países, estão ameaçados pelas mudanças climáticas e a elevação do nível do mar. O estudo mostra que obras icônicas, como os Moais da Ilha de Páscoa, podem ser destruídos devido a problemas causados pelas alterações no clima.

Isto se torna mais graves depois das novas descobertas. Reportagem de André Oliveira, na Revista Galileu (12/06/2015), retrata os achados de arqueólogos que desenterraram, em 2012, o torso de algumas estátuas, mostrando que os moais não apenas têm corpo, como também são tatuados. Os pesquisadores acreditam que padrões crescentes nas tatuagens podem representar canoas do povo Rapa Nui.

 

estátua da ilha da Páscoa

 

O risco do caos climático que ameaça patrimônios ambientais como a Grande Barreira de Corais, na Austrália, e o Atol das Rocas, no Brasil, já vinha sendo enfatizado há tempos por entidades ligadas ao assunto. Mas o novo relatório da ONU lista também monumentos criados pelo ser humano, de extrema importância cultural e, obviamente, turística. O perigo é que todo o Planeta se torne, em termos macroterritoriais, uma grande Ilha de Páscoa.

 

 

No plano micro, a ilha de Páscoa sofre a erosão costeira causada por chuvas que se tornarão cada vez mais frequentes e o aumento do nível das águas no Oceano Pacífico podem fazer com que os moais se percam no mar. Seria o segundo colapso ambiental da cultura Rapa Nui. Um prenúncio de um colapso que pode ser global.

Referência:

Terry L. Hunt. O colapso dos rapanui, SCIAM, 2006
http://www2.uol.com.br/sciam/reportagens/o_colapso_dos_rapanui.html

Jared Diamond – Sociedades em Colapso – Legendado Português.
http://www.youtube.com/watch?v=szkKzVM93cQ

André Jorge Oliveira. Fotos revelam que moais da Ilha de Páscoa têm tatuagens. Revista Galileu, 12/06/2015
http://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Arqueologia/noticia/2015/06/fotos-revelam-que-moais-da-ilha-de-pascoa-tem-tatuagens.html

 

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 23/05/2017

[cite]

 

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One thought on “O segundo colapso da ilha de Páscoa, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

  • artur rodrigues

    Parece que todos estes alertas, não são suficientes para que as pessoas interiorizem estes fenomenos, e tomem precauções. Depois será tarde.

Fechado para comentários.