EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Artigo

PEC 241 não vai entregar o que promete, artigo de Miguel Bruno

 

artigo de opinião

 

[EcoDebate] A proposta de institucionalização de um Novo Regime Fiscal (NRF), através da PEC 241, para a economia brasileira, parte de um diagnóstico equivocado quanto às causas da crise econômica atual. Dois fatores principais contribuíram para isso: o fim do boom dos preços internacionais das commodities; e o crescimento dos salários reais acima dos baixíssimos ganhos de produtividade da economia brasileira, decorrentes do processo em curso de desindustrialização do país. Juntos, esses fatores levaram a um declínio acentuado da taxa de lucro dos setores produtivos, notadamente, o industrial, a partir de 2011.

No ano passado, o segundo governo Dilma promoveu mudanças no Ministério da Fazenda, mas fez um diagnóstico equivocado de que uma crise fiscal havia se instalado. Mais precisamente, a equipe interpretava a crise econômica como um resultado da crise fiscal, e não o contrário. O ajuste fiscal de 2015, então, aprofundou as tendências à recessão que já se configuravam no ano anterior, levando ao crescimento do déficit público. Como a economia já se encontrava em desaceleração em 2014, o resultado do ajuste fiscal de 2015 foi uma recessão de 3,8% neste ano.

O NRF, com relação às proposições de limites para os gastos primários, propõe o estabelecimento de crescimento real zero por 20 anos para várias das rubricas de despesas sociais como saúde e educação. No entanto, o NRF, tal como a Lei de Responsabilidade Fiscal, deixa de fora os gastos financeiros que são os que efetivamente oneram o Tesouro Nacional, e expandem a dívida pública interna a cada aumento da taxa oficial de juros Selic.

Consequentemente, chama a atenção o fato de que a PEC 241 foque apenas nas despesas sociais, cuja legitimidade é inquestionável nas sociedades efetivamente democráticas, e deixe de fora as despesas financeiras. Ao questionar os limites dos gastos em saúde e educação como percentuais do crescimento da receita em função do PIB, a PEC 241 não reconhece que o maior esforço produtivo da sociedade deve ser revertido em maiores gastos sociais como contrapartida do crescimento da arrecadação tributária.

Mesmo que o PIB per capita cresça nos próximos anos, a sociedade não poderá receber os benefícios desse aumento. O excedente de caixa, que permitirá elevar o orçamento público, será principalmente destinado ao pagamento de juros da dívida, mantidos intocáveis pelo NRF proposto. Esse aspecto configura-se como gravíssimo pelas consequências sociais. Como a população cresce assim como as necessidades sociais, o governo se verá incapaz de prover os serviços públicos e o financiamento das políticas públicas imprescindíveis ao desenvolvimento socioeconômico brasileiro.

Outro ponto a ser destacado refere-se à causalidade entre dívida pública e taxas de juros, quando há diversos estudos empíricos que mostram que são as elevadas taxas de juros que aumentam o endividamento público interno, e não o contrário. Portanto, não há consistência no argumento de que com os limites de gastos impostos pelo NRF as taxas de juros tenderão a cair. Na realidade, as taxas de juros são elevadas no Brasil em razão do elevado grau de oligopolização do setor bancário-financeiro que, juntamente com os atores rentistas, agem politicamente sobre o Banco Central para mantê-las em patamares demasiadamente elevados.

Em suma, o Novo Regime Fiscal proposto pela PEC 241 tem caráter eminentemente recessivo e não apresenta chances de entregar o que promete, pois parte de um diagnóstico equivocado da deterioração das receitas fiscais no Brasil. Os proponentes do NRF falam em “descontrole fiscal” e que “todo o país terá que colaborar para solucioná-lo”, mas a distribuição desse ônus exclui o setor bancário-financeiro. Esse é, até o momento, o principal beneficiário das medidas recessivas de 2014-2016 e, muito provavelmente, o maior dos ganhadores com as medidas propostas no NRF. O atual problema fiscal é decorrente de queda das receitas, e não de um descontrole das despesas.

* Miguel Bruno é professor de economia da Faculdade Mackenzie Rio

 

in EcoDebate, 07/11/2016

[cite]

 

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate

Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta enviar um email para newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

Remoção da lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate

Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para newsletter_ecodebate+unsubscribe@googlegroups.com ou ecodebate@ecodebate.com.br. O seu e-mail será removido e você receberá uma mensagem confirmando a remoção. Observe que a remoção é automática mas não é instantânea.