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Ameaças ao processo de licenciamento ambiental: a quem interessa? artigo de Ricardo Luiz da Silva Costa

 

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[EcoDebate] A Lei Complementar 140/2011, em primeiro plano, regulamenta o Art.23 da Constituição Federal e suas derivadas tendo em vista a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, em ações administrativas de competência comum atinentes a proteção ambiental e ao patrimônio natural; ao combate à poluição em todas as suas formas; e a preservação das florestas, da fauna e da flora; e altera a Lei 6938/1981 que define a Política Nacional de Meio Ambiente. É nesse contexto, que o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama) propõe uma minuta de resolução nova, com o escopo de alterar as suas duas Resoluções que tratam especificamente dessa temática: (1) a Avaliação de Impacto Ambiental tratada pela Resolução nº 001/1986, e (2) o Licenciamento Ambiental tratado pela Resolução nº 237/1997.

No tocante ao processo de licenciamento de âmbito federal, essa lei complementar se encontra regulamentada através do Decreto 8437/2015, o qual define os tipos de empreendimentos e atividades cujo processo de licenciamento é de competência da União. Totalmente focado para empreendimentos de obras de infraestrutura da alçada federal, tais como: sistemas viários, geração e transmissão de energia elétrica, exploração e produção de petróleo e gás e outros hidrocarbonetos fluídos. Todavia, se verifica aqui algo preocupante com relação a ausência na lista dessas tipologias, os empreendimentos agropecuários e minerários metálicos que, via de regra, envolvem a descapitalização de milhares de hectares de florestas e, por extensão, perda de biodiversidade, efeitos de mudanças climáticas, entre outros danos às vezes irreversíveis à ecologia e a economia do ambiente impactado. Dando a entender ainda, que, a responsabilidade pela licença ou autorização ambiental para essas e outras tipologias ausentes na lista federal, fica a critério dos demais entes federados.

À guisa de ilustração, no tocante as Áreas Protegidas de âmbito federal, da forma em que se encontra, essa Minuta do Conama ameaça gravemente o texto constitucional, e a própria Lei Complementar nº140/2011, na medida exata em que ignora a doutrina jurídica pátria que considera o tema Terras Indígenas no rol das ações estatais de competência exclusiva da União.

Neste particular, cabe mencionar para não restarem dúvidas a própria Lei Complementar nº 140/2011, em seu Art. 7º, Inciso IV e Letra c, in verbis.

Art. 7º – São ações administrativas da União:
IV – promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades:
c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas;

Portanto, salvo outro juízo, o processo de licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades que afetem, direta ou indiretamente, Terras Indígenas, em termos práticos, continua valendo a regra anterior que vigorava na Resolução Conama 237/1997, isto é, somente o órgão licenciador federal é competente para estabelecer os procedimentos de licenciamento ambiental de tais atividades, quando impactarem Terras Indígenas de modo direto ou indireto. O que significa dizer, em síntese, o Ibama é a instituição que licencia a atividade, porém, condicionada a oitiva do povo indígena afetado e a anuência da Funai, sob pena de o licenciamento ser objeto de questionamentos acerca de sua sustentabilidade jurídica.

Em nota exposta no sítio da Funai, a instituição indigenista governamental protestou contra aquilo que considera açodamento desnecessário por parte do Conama, no tocante a forma de divulgação e consulta pública, breve e coincidente com o feriado de carnaval, assim, não permitindo um prazo mais ampliado para obter as contribuições indispensáveis para um processo de discussão rico, consistente e equilibrado como deve ser todo processo que envolve interesses coletivos e difusos de diferentes partes que precisam ser ouvidas, para que o mesmo tenha o reconhecimento público de legitimidade.

Por fim, considerando o arcabouço jurídico e institucional vigente no País, e segundo o que reza a doutrina do Direito (FERREIRA, Adriano de Assis. Introdução ao Direito. São Paulo: 2012), no ordenamento jurídico deve sempre prevalecer a hierarquia dos instrumentos legais. O que significa dizer, em termos práticos, uma resolução não pode se sobrepor ao decreto e tampouco as leis, e por fim todos devem estar em sintonia fina e permanente com a Carta Magna, isto é, a Constituição Federal. Desta forma, a meu ver, essa proposta de resolução do Conama ao ignorar ou desconsiderar partes que compõem a estrutura do licenciamento ambiental, enquanto importante instrumento de gestão da Política Nacional de Meio Ambiente, carece ser revista, concertada, a fim de afinar e adequar os critérios e diretrizes da resolução pretendida, em consonância com as normas jurídicas, considerando os direitos e deveres de todas as partes integrantes do processo de licenciamento ambiental. Posto que, na forma em que se apresenta, tal proposta ignora o papel funcional e institucional do Sistema Nacional de Áreas Protegidas (Unidades de Conservação, Terras Indígenas, Terras Quilombolas, Áreas de Preservação Permanente, Reservas Legais, etc.) para a conservação da Biodiversidade, enquanto recurso de importância estratégica para o tão almejado Desenvolvimento Sustentável, em nosso país. Em outras palavras, nessa Minuta, não há qualquer referência de forma clara e objetiva, visando a proteção e gestão dessas Áreas Protegidas na esteira do processo de licenciamento ambiental.

Isto posto, com a devida vênia, seria de boa lembrança que o Conama reabrisse espaço e tempo, de modo apropriado que o processo requer, visando a rediscussão dessa matéria, de tamanha relevância tanto para a economia quanto para a ecologia do país, pois que, da forma como se apresenta formulada, se for aprovada em definitivo como resolução, a mesma ferirá gravemente direitos, deveres e interesses de povos habitantes das Áreas Protegidas do Brasil, bem como, de convenções internacionais e metas estabelecidas sobre Conservação da Biodiversidade e Florestas e Mudanças Climáticas. Sem esses cuidados justos e necessários, na condução e definição desse processo, a quem interessa a forma proposta tão linear para tratar de um assunto de tamanha complexidade?

Ricardo Luiz da Silva Costa – (ricaluz23@hotmail.com)

 

in EcoDebate, 08/04/2016

[cite]

 

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