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Artigo

A REDE de Marina, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

 

Rede Sustentabilidade

 

[EcoDebate] A candidatura presidencial de Marina Silva não interessa ao PT e muito menos ao PSDB. O primeiro vê nela um potencial adversário no segundo turno das eleições, turno que os petistas queriam ver eliminado na primeira votação. Já o PSDB vê em Marina a usurpação das chances de ir ao segundo turno. Pode até costurar uma aliança com ela no segundo turno, mas seria o sepultamento político do PSDB, agora como coadjuvante, não mais como protagonista da política nacional.

Portanto, não parece mera coincidência que os cartórios estejam travando ao máximo o reconhecimento das assinaturas daqueles que gostariam de ver a REDE registrada e com direitos de concorrer às eleições.

Sobre Marina paira uma visão de preconceito, desqualificação, mas também de receio. Preconceito porque, como Lula, vem dos meios pobres, das selvas do Acre, tem problemas de saúde, educação tardia e agora é evangélica da Assembleia de Deus. Desqualificação porque Marina foi ministra do meio ambiente do governo Lula e sua passagem deixou um rastro de contradições entre seu discurso e suas práticas reais, como a complacência com a Transposição, Angra III, exploração comercial das florestas.

Mas, no fundo, o que o meio político tem dela é receio. Mesmo com todas as suas contradições, ela trouxe para o cenário político brasileiro o chamado “pensamento complexo”. Essa weltasnchauung (visão de mundo), absolutamente contemporânea, sabe que existe uma implicação total entre a economia, sociedade e natureza. Mais do que uma novidade, é uma exigência dos tempos modernos buscar equilíbrio entre a atividade econômica e a sustentabilidade. Nessa visão, não raro, o ambiental pode prevalecer sobre o econômico. Questões básicas como água, solos, biodiversidade, clima, assim como novas tecnologias e redes sociais, tem que ser pensadas em suas relações, não em gavetas estanques como é a praxe da sociedade político-econômica contemporânea. Com essa postura Marina é facilmente rotulada de “capitalista verde”. Mas, ela traz preocupações que qualquer pessoa razoavelmente informada sabe que tem pertinência histórica e política. Além do mais, ela se opõe ao capitalismo e ao socialismo cinzas, baseados na destruição das bases naturais da vida para fazer valer seus ideários.

Se petistas e tucanos acharem que vão derrotar Marina por subestimação e desqualificação, podem estar cometendo um erro mortal. Sua ascensão nas pesquisas, sobretudo depois das manifestações, dizem que muita gente entende seu recado.

O PT, uma vez no poder, poderia roubar o potencial eleitoral de Marina. Bastaria que se apossasse de algumas de suas bandeiras principais, transformando-as em políticas públicas. Uma delas, temos insistindo através do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social, é tornar os nordestinos do semiárido produtores de energia solar, pela direta captação, conversão e lançamento da energia captada na rede nacional. Os produtores, através de algumas placas e um conversor – não é essa tecnologia de armazenar em baterias -, venderiam energia para o governo ou para as empresas. Seria uma revolução tecnológica e social, já que as famílias produtoras de energia poderiam facilmente dispensar o Bolsa Família. A tecnologia já existe – essa política também já existe em vários países, como Alemanha -, mas o governo nunca avança, porque a produção de energia no Brasil está reservada às grandes empresas. Ao povo está destinado apenas o consumo.

Bandeira simples como esta parece impossível no PT, afinal, Lula é admirador do desenvolvimentismo do regime militar e Dilma é simplesmente “crescimentista”. Os tucanos parecem vencidos na história. Nesse vácuo Marina surfa.

Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.

EcoDebate, 28/08/2013


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10 thoughts on “A REDE de Marina, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

  • Será, Roberto? Será que no poder, aliada com a nobreza do café com leite e com o sistema político ruralista na base, a Marina conseguiria impor o “pensamento complexo” no governo do Brasil? Não conseguiu com o PT, duvido que daria certo com o PSDB. Novidade aliada com coisa velha, vira coisa velha também!

  • O Gogó diz que Marina deixou um rastro de contradições em seu discurso, demonstrando complacência com a Transposição, Angra III, exploração comercial das florestas.
    A meu ver, não houve contradição alguma. Procurou-se vender a Transposição como algo inusitado e que provocaria sérios problemas ao meio ambiente, sabendo-se que se trata de algo corriqueiro em todo o mundo, que vinha sendo usado até mesmo pelos antigos egípcios. É de Heródoto a famosa frase: – O Egito é uma dádiva do Nilo, ou seja, só existe o Egito hoje pelas obras de infra-estrutura hídrica feitas desde a Antiguidade.
    Se não produzimos trigo suficiente, isso não quer dizer que devamos passar sem pão, pois podemos comprar trigo da Argentina. Se o semiárido não possui água suficiente, isso não quer dizer que seus habitantes devam ficar dependendo eternamente do bolsa-família, pois é possível buscar água de outras bacias.
    Com relação a Angra III, o caso é diferente. Havia uma corrida armamentista com a Argentina durante o regime militar e a usina nuclear era uma forma de desenvolver a bomba atômica, cujos testes estavam sendo feitos na Serra do Cachimbo. Acabou-se a guerra fria e a usina ficou.
    Finalmente, é preciso deixar claro que Marina jamais aprovou a derrubada de florestas nativas para a exploração comercial de madeira.

  • Luciano Castanho

    Gogó: Essa proposta de transformar a população do semi-árido em produtores de energia solar é uma solução criativa e sustentável, além de ser vocação natural da região.
    A regulamentação que possibilita gerar energia limpa e injetá-la na rede, chamada ‘geração distribuída’, foi aprovada em 2012 pela Aneel (RN 482). Pode-se fazer uso das placas fotovoltaicas e também das minieólicas modernas, duráveis, de baixo custo e ótimo desempenho para geração de energia.
    Mas vivemos no Brasil da mentirinha. O consumidor não vai ter como deixar de pagar a tarifa mínima de consumo para a concessionária (até R$ 100,00 ao mês). A distribuição de energia opera como a assinatura mensal obrigatória da linha telefônica, com o agravante do monopólio, já que não há opção na escolha da distribuidora de energia.
    E mais… a decisão inoportuna do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) – por meio do convênio ICMS 6 de abril de 2013 – estabeleceu que quem gera energia limpa com o sol e a injeta na rede, mesmo que para consumir depois num sistema de troca, tem que pagar imposto pela energia produzida.
    Nossos políticos devem achar que a matriz elétrica brasileira já está limpa demais e devemos copiar os padrões europeus. E não demora… nesse emaranhado regulatório vão logo querer taxar a ‘energia elétrica não consumida’ pelo uso do aquecimento solar da água de banho. Aguardem.

  • “O PT, uma vez no poder, poderia roubar o potencial eleitoral de Marina.”

    O PT está querendo iniciar o fracking no Brasil. Ajudou a passar o código ruralista (que PSDB e DEM apoiaram AINDA MAIS, então, nada de branco e preto aqui por favor, que o mundo é colorido e os dois estão com cores dignas de ir pela descarga). Está em franca campanha por menos controles sobre as doações a campanhas políticas.

    Desculpa aí, mas o PT não tem a mínima condição de roubar o potencial eleitoral da Marina. O PT pode ter sido um dia, nos idos da história que os mais velhos insistem em achar que pode não ter passado, um partido ético. Do mesmo modo que o PMDB que hoje luta por cargos como um cachorro magro um dia foi um dos bastiões da luta contra a ditadura militar.

    Não é mais. O PT quis imitar a frase do Delfim, mas jogando fora o coração e desprezando o cérebro. Não é mais de esquerda realmente, tirando na parte de jogar dinheiro para o alto, nem chegou a ir para a direita e realmente achar que a individualidade de cada um deve ser respeitada.

    O PT, em suma, envelheceu. E não foi um envelhecer de Fernanda Montenegro não. O PT envelheceu mal, está hoje um velhinho daqueles carcomidos, barrigudos e babentos, que ainda se acha um garotão sarado e fica dando em cima de menininhas com menos de um quarto da sua idade.

    Note que não foi apenas o PT que envelheceu. O PFL, digo, DEM-PDS se autoimplodiu. O PSDB é um saco de gatos que não sabem mais o que querem exceto poder, e está dançando para o mesmo caminho do PFL.

    Espero que apesar de todos os percalços, a REDE consiga se formar, pois eu gostaria de ter em quem votar nas eleições que vem. Se não der, que ao menos o PSOL tenha candidato… eles são mais radicais do que eu gostaria, mas melhor radicalismo do que a * de sempre.

  • frei Johannes Gierse

    Uma nova candidatura da Marina é corajosa, ousada, devido à imagem (errônea ou não) dela, porém, indispensável! Novos caminhos políticos se abrem assim: na persistência e qualidade de argumentos. Os 20% eleitores diferentes no 1º turno nas ultimas eleições são um sinal de esperança, uma voz inédita que se fortaleceu na Vemprarua! O Brasil tem que tomar radicalmente um outro rumo, caso contrário cairá no abismo. – Senti falta de uma sigla partidária – na análise do Gogó e dos comentários: PMDB… este sim, tem poder!

  • Sinceramente, eu sinto que a Marina nao tem tonus fisico para segurar a presidencia de um pais tao grande e complicado.

    Considerando que ela POSSA ter estabilidade emocional, força moral, convicçoes, psicologia, sensibilidade, que NAO tenha se embrutecido pelo sofrimento, que nao se venda, etc, etc, num Brasil continental…

    Considerando-se que tenha tudo isso, ela NAO tem capacidade fisica e saude para o tranco.

    Porque sera’ que ela acha que PODE?

    Ela e’ anemica ou quase isso! Sua experiencia tera’ um custo muito alto para todos!

    Isso nao e’ falar mal… digo isso devido aos meus anos de janela! 8(

  • Montserrat Martins

    Sobre a frase “complacência com a transposição, Angra III e exploração comercial das florestas”: Angra III foi licenciada na gestão Minc, a transposição do São Francisco é que foi na gestão da Marina, enfrentando muitas pressões para abrir mão de critérios, um dos muitos embates do Ministério do Meio Ambiente com o governo, na época. E a exploração comercial da floresta só pode ser feita mediante o uso de técnicas de manejo florestal de baixo impacto, onde é tirada de 3 a 4 árvores por hectare a cada 10 anos.

  • Marina tem entre seus inimigos os nacionalistas. E, isto abrange as duas pontas do espectro político: a esquerda e a direita mais radical. O temor de que, ao assumir, Marina entregue a Amazônia para os europeus (que adoram ela) não deixa alguns segmentos dormirem bem. Assim, ela seria bombardeada de ambos os lados, e sobraria o meio deste espectro para possivelmente apoiá-la.

    Destes, os mais velhos não são tão motivados para votar nela. Então, sobra os jovens eleitores, os quais, possivelmente são a maior parte dos 20%. Estes, por sua vez, votam querendo “mudanças”. Mas apenas mudança por mudança, e sem base política forte de sustento, pode descambar com o que aconteceu com Janio Quadros ou com Collor.

    Não creio que Marina tenha forças para, se ganhar, conduzir o país com segurança para as suas propostas. A fragilidade de sua pessoa e a fragilidade da sua base política tornam-se um risco na visão do eleitor mais consciente. Isto sem contar as diferentes visões regionais do País e, provavelmente Marina não seria do gosto da região Sul, por exemplo.

    Sim, a proposta da Rede é estratégica na atualidade. Mas, a mudança de um paradigma “insusteltável” para um “sustentável” tem um preço político muito grande para a sociedade, pois implicará em sacrifícios e renúncias. Se esta mudança não for conduzida com efetiva participação social e, se seus condutores não tiverem amplo apoio político (carisma), nada feito. E, o trauma, queimará uma boa idéia por décadas.

    JFB

  • O que não pode é Marina se aliar com gente entranhada na multinacional MONSANTO pois se afigura para mim como o primeiro pedaço podre e negro dentro da mancha verde!

  • Debora Wanderley

    Lamentavelmente até agora, ao meu ver, não temos qualquer candidato que possamos dizer “este me representa”. Uma pessoa, séria, honrrada, comprometida com um estado laico, com a sustentabilidade e com os sem poder de enfrentamento, que recuse dinheiro de empresários em sua campanha ( a Monsanto citada pelo Sr. Luiz Alberto é uma delas), que não minta aos seus eleitores, e que não use de sofismas para justificar seus atos.

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