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Ainda o desmonte do IBAMA, os nossos políticos e nós, os eleitores, artigo de Roberta Graf

 

artigo

 

[EcoDebate] O PT ganhou apertado a prefeitura da capital do Acre ontem, com menos de 1% na diferença dos votos pro segundo colocado, ainda que tenha usado pesada máquina pública e particular de “investimentos” na campanha.

E mais uma má notícia: sexta-feira passada, dia 26/10/2012, saiu o novo edital de concurso público pro IBAMA, com 108 vagas distribuídas em “todo o território nacional necessário ao PAC da Dilma”, ou seja, “Brasília” (93 vagas) e “Rio de Janeiro” (15 vagas). Visivelmente, para licenciar e gerenciar impactos das mega-hidrelétricas e do petróleo do Pré-Sal, entre outros mega-empreendimentos. Também não entrou no edital qualquer tema ligado à conservação e manejo de biomas e espécies, nem de educação ambiental pró-ativa a comunidades e sociedades ambientalmente sustentáveis. Os demais 25 estados do Brasilzão continental não receberam vagas, embora recebam as obras, ou seja, se gastará muito dinheiro público deslocando servidores de Brasília às vistorias e fiscalizações, num órgão excessivamente centralizado e com enormes deficiências de gestão.

O que se quer do IBAMA? O que se espera de qualquer país sério, para o órgão ambiental federal central? Ao meu ver e dos demais estudiosos do tema, uma instituição forte, em todo o país, não só na capital, nem só nas capitais estaduais, mas nos municípios, de forma inteligentemente estratégica, para atender especialmente regiões de altos impactos e conflitos sócio-ambientais, desmatamento, indústrias. E também para atender regiões sensíveis ainda preservadas, os hot-spots, e uma boa amostragem de biomas, ecossistemas, hidrografia e espécies ameaçadas.

Como? Com muito recurso financeiro e muitos servidores, e com boas condições de trabalho. Com os adicionais que há anos clamamos, merecidos e necessários, de qualificação, interiorização, periculosidade, penosidade, insalubridade – não temos nenhum destes até hoje. Servidores com boas condições e valorizados que não quisessem pedir remoção a capitais ou à Brasília, e com políticas de RH condizentes com nossa missão, por exemplo com sistemas de rodízio e adequados concursos de remoção interna. Aqui não só carecemos de uma boa política de RH, carecemos de alguma, pois aqui não há – ou de “gestão de pessoas”, como quiseram apelidar mais bonito, só na teoria.

Qual é o cenário, porém? O exato oposto. Até hoje com uma política agressiva de sucateamento do órgão, bem como da política e gestão ambiental pública como um todo, desde a primeira gestão Lula (mas ele “não sabia de nada”), fecharam nada menos do que 91 escritórios do IBAMA, 44% destes na Região Norte (Amazônia) que necessita tanto de proteção, como se sabe. Os servidores dos municípios em que o IBAMA fechou continuam abandonados à míngua, obrigados a se mudar para as (distantes) capitais, e, se não quiserem ir, ficam ilegalmente trabalhando nas prefeituras (o RH do IBAMA não solucionou nenhum caso até hoje). Somada à cotidiana evasão de pessoas para a Meca-Brasília e outras capitais, bem como à enorme aposentadoria de um contingente já idoso de servidores, daqui a 05 anos teremos cerca de 40 servidores em cada estado, se não houver novos concursos com muitas vagas e boas políticas de RH: fecharão, também, as superintendências do IBAMA em cada estado?

Há péssimos rumores de intenções de se fechar o próprio IBAMA, transformando-o numa agência de quinta grandeza limitada à Brasília. Embora haja enorme oposição a esta terrível ideia, eu não duvido nada, diante da bancada de deputados e senadores que dispomos, e da cada vez mais anti-ambiental e anti-indígena política do PT, que lidera há 10 anos o Governo Federal. Há rumores também que Renan Calheiros, “chateado com a morosidade do IBAMA” em licenciar um mega-estaleiro de gigantes impactos em Alagoas, barrou um PL de criação de novas 1.000 vagas em concurso para o IBAMA e ICMBio.

Assistimos, cada vez mais revoltados, nossos tristes trópicos, nosso país mais mega-biodiverso do mundo, sucumbir às mega-hidrelétricas em regiões preservadas, UHE de Belo Monstro (ops: ato falho), transposição-assassinato do Velho Chico, altíssimo consumo de agrotóxicos e sementes transgênicas, desmatamento e queimadas e pior: assassinato institucionalizado de índios, como se vê nos Guarani-Kaiowá, que há muito já denunciaram suas mazelas e os latifundiários, políticos e juízes que os perseguem no Mato Grosso do Sul, em seguidas comunicações ao governo, ONGs e sociedade em geral, por meio de livros do CIMI, por exemplo, e via direta. Se Dilma não prestar atenção vai ficar marcada como cúmplice-assassina de índios, até pelas hidrelétricas também, que constrói sem cessar em cima de suas terras. Isso tudo é sinal de desenvolvimento?

Aliás nunca se assassinou tanto no campo, visíveis ataques a lideranças rurais ambientalistas, segundo o CPT. Além disso, temos a péssima PEC n. 215 e a Portaria AGU n. 303 de 2012, vergonhosamente inconstitucionais anti-indígenas, e por consequência, anti-ambientais. A TKCSA e outras mega-obras no Rio de Janeiro, segundo denúncias de organizações locais, ameaçam pescadores de morte e trarão degradação ambiental gigantesca. A mineração de urânio da pobre Caetité, na Bahia, vazou de novo 400 kg de material radioativo na semana passada. Princípio da Precaução? Passa longe do nosso governo e empreendedores.

Deputados e senadores destruíram boa parte do Código Florestal, em vergonhosas negociatas para isentar multas milionárias de latifundiários que são, também, deputados, senadores, governadores. E aprovaram a LC n. 140 em 2011 que esfacela o poder do governo federal na gestão ambiental pública, para entregar às pressões bem sucedidas das oligarquias locais. Entre outros golpes, como a redução de áreas de unidades de conservação via medidas provisórias.

Sem falar no desmonte velado dos demais órgãos públicos federais, como foi visto nas greves do meio do ano, de praticamente todas as carreiras federais, em especial das universidades federais, com mais de 03 meses de duração. Educação para o povo? Não, melhor as bolsas-família e “luz para todos” terem sua brilhante TV ditando como se comportar e o que comprar, comprar, comprar.

O autor do desmonte do Código Florestal habilmente deslocou-se para o ministério que ficará mais rico nos próximos anos, para cuidar da Copa do Mundo e das Olimpíadas. Pão e circo para o povo, desvio de montanhas de dinheiro publico como sempre, e mais várias mega-obras, como o estádio de Pernambuco que está motivando um enorme desmatamento de suas últimas ilhas de Mata Atlântica.

Neste cenário, como clamar que o IBAMA e ICMBio, órgãos siameses que nunca deviam ter sido separados pela ex-ministra e ex-seringueira (que não deu nenhum real para as reservas extrativistas em seus sete anos de gestão), tenham recursos financeiros, servidores valorizados, condições de trabalho, estrutura, planejamento, seriedade? Ora, deixa pra lá, “empurra com a barriga e deixa o abacaxi para os netos” como já disse um pesquisador do aquecimento global. Depois não vão reclamar dos “desastres ambientais”, secas, enchentes, cânceres, doenças cardíacas e pulmonares, stress e depressão, etc. Não vão reclamar do lixo, dos resíduos tóxicos, do esgoto, do êxodo rural, das cidades esfumaçadas e entupidas de carros novos de IPI reduzido e “proprietários endividados”. Aguentem.

Eleitores, no geral, nos tristes trópicos colonizados, estamos ainda muito longe da consciência política, consciência cidadã e consciência ecológica. No país campeão mundial da corrupção e do consumo de agrotóxicos, mas também o mais mega-biodiverso do planeta, estamos matando a natureza e, com ela, a saúde humana e as futuras gerações.

Roberta Graf, doutora em Gestão e Política Ambiental, servidora do IBAMA/Acre, membra das diretorias das Asibamas Nacional e local (as Asibamas são entidades de classe dos servidores do IBAMA, ICMBio, MMA e SFB).

EcoDebate, 30/10/2012

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2 thoughts on “Ainda o desmonte do IBAMA, os nossos políticos e nós, os eleitores, artigo de Roberta Graf

  • Uma opinião:
    O desmonte do Ibama é uma tragédia anunciada há muito tempo, conduzida e feita em favor de interesses divergentes, aparentemente exóticos.
    Falta no Brasil uma Estratégia Ambiental, Diretrizes, Planos, Programas globais e integrados. Falta, enfim, uma Avaliação Ambiental Estratégica, que permita formulação de Políticas, Planos, Programas de longo alcance.
    Aqui no Brasil ainda se discutem os PROJETOS isolados, numa clara demonstração de falta de estratégia orientadora. Mas isto permite que radicais atuem e deve ser do interesse dos que se beneficiam.
    Projetos que se enquadram nas prioridades estratégicas nao devem ser discutidos, somente elogiados e aprovados, com as – POUCAS – cautelas devidas, sem qualquer burocracia.
    E falta decisão política e seriedade, moralidade, impessoalidade, prioridade, interesse, na condução da questao ambiental.
    Parece que a tônica agora é criar Unidades de Conservação “no Papel”, sem qualquer estrutura de gestão, sem recursos para regularização fundiária (passivo de R$trilhões!!!)..e entregar tudo para a iniciativa privada ou deixar abandonado. Ou seja, se tenta estatizar (sem pagar) para privatizar. Realmente, está se tornando um caos, uma terra de ninguem, onde com isto alguns certamente sao beneficiados.

  • Tais notícias de abusos, desmandos e irresponsabilidades, descomprometimento com os destinos futuros do país e da própria humanidade, tudo isso em dimensão tal que me faz lembrar que por muito menos se criou e existe um tribunal internacional em Haia.
    Convivi esse tempo todo com o ambientalismo de “fraldas” que não tem um braço executivo para suas maiores, bem intencionadas e necessárias ações na linha do “Pare! Basta!
    Somente chegaremos à verdadeira defesa ambiental quando as causas injustamente não resolvidas, ou mal resolvidas, que afrontam o povo e a natureza, quando tivermos um “braço para tocar ações no tribunal internacional de Haia” ou outro que talvez precise ser criado, para acabar com os abusos de governantes eleitos que não cumprem seus deveres constitucionais nem os compromissos assumidos e assinados com os demais paises do mundo por via de Organizações representativas, e na própria ONU, e que, justo por isso, podem ser processados, punidos e talvez cassados, também por não zelarem pelos direitos do povo e da nação.
    À vista do que anda acontecendo de abusos, crimes, desmatamentos ilegais, queimadas criminosas, genocídio indígena, protecionismo e submissão aos lobbys internacionais, o descaramento de ligações de “autoridades” ou “gestores” de qualquer escalão com empresas nacionais e multinacionais que conseguem e querem explorar, na terra e no mar, todas as riquezas naturais que lhes dão o “toque de Midas” da fortuna fácil, rápida e descompromissada com o povo e com o Planeta. Quando criaram o IPEA, visitei um amigo e ex-colega de estudos, na sede do órgão, no Rio. Indo tomar um café, na cobertura, passei por um salão onde se expunha o projeto da “Transamazônica”, que iriam fazer sob a batuta do Mário Andreazza. Em um dos andares e corredores, por onde passei, notei um grupo de conversação e discussões se expressando em inglês. Perguntei o que era: era uma comissão de organismos internacionais dando palpites (solicitados?!!!) nos rumos de desenvolvimento do Brasil. O Dr. Delfim Neto, na época no IPEA, deve lembrar-se das “intromissões”. O curioso é que, já naquela época, todo o leito delineado para a transamazônica, também era marcado com desenhos geométricos quadrangulares ou não que, por chamar minha atenção, foi objeto da natural pergunta: “Amigo, de que tratam essas demarcações. São Indigenistas?” Não amigo. São mapas de autorizações de pesquisas ou de explorações já autorizadas de minerais de valor econômico. Não tenho agora à disposição e fácil acesso a “grande lista” e, mais ainda, “os grandes beneficiários”. Um deles já despontou bilionário e como o maior detentor de direitos de explorações no país, parecendo ser o Sr. Eike Batista. Me perdoem se estou enganado. Não vou analisar em detalhes. Mas, a dissertação esparsa serviu como amostra para o tanto que teremos de “boas ações judiciais” e mesmo “legislativas” para acabar com essa farra de usos e abusos contrários aos interesses do Brasil. Precisaremos de uma representação executiva, de natureza civil, para a denúncia, o embargo, o litígio, a sustentação da causa, seu custeio, e o que mais for necessário para um “Brasil Passado a Limpo”.
    Vamos considerar que “Deus é Brasileiro!”, mesmo! É só querer…

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