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Poluição causada pelas atividades de mineração mata vilarejos na China

 

Mina de Bayan Obo, foto do NYT
Mina de Bayan Obo, foto do NYT

Visto do céu, parece um grande lago, alimentado por inúmeros afluentes. De perto, descobrimos uma superfície opaca, onde não vive nenhum peixe, onde nenhuma alga aflora à superfície. Suas bordas são recobertas de uma crosta escura, tão espessa que é possível caminhar por cima. Trata-se, na verdade, de um imenso escoadouro de 10 quilômetros quadrados, no qual as fábricas dos arredores despejam águas carregadas de produtos químicos usados no tratamento de 17 minerais procurados em todo o planeta: as “terras-raras”. Matéria de Cécile Bontron, de Le Monde, no UOL Notícias.

A cidade de Baotou, na Mongólia Interior, é o maior ponto chinês de produção desses materiais estratégicos, indispensáveis a qualquer indústria de alta tecnologia, desde os smartphones até os GPS, mas também às energias verdes, eólicas e sobretudo aos carros elétricos. Eles são extraídos da jazida de Bayan Obo, situada 120 quilômetros mais ao norte, de onde são encaminhados para cá, onde são tratados.

A concentração de terras-raras na rocha é na verdade muito pequena, e é preciso separá-las e refiná-las através de processos hidrometalúrgicos e de banhos de ácidos. A China realiza 97% da produção mundial, sendo que 70% são tratados em Baotou.

Nas águas turvas da bacia de afluentes, encontram-se todas as espécies de substâncias químicas tóxicas, mas também elementos radioativos, como tório, cuja ingestão provoca câncer do pâncreas, do pulmão e leucemia.

“Antes da chegada das usinas, havia somente campos aqui, a perder de vista! No lugar dessa lama radioativa, era possível ver melancias, berinjelas, tomates…”, suspira Li Guirong. Foi em 1958 –dez anos após seu nascimento, ele lembra –que a empresa estatal Baogang, número um nesse mercado, começou a produzir terras-raras. Então surgiu o lago. “No começo, não nos demos conta da poluição que era gerada. Como poderíamos saber?”, conta o velho camponês de rosto marcado por rugas. Secretário-geral da filial local do Partido Comunista, ele é uma das raras pessoas que ousam falar.

Ele relata que por volta do final dos anos 1980, os habitantes dos vilarejos vizinhos observaram estranhas anomalias em suas plantações: “As plantas não cresciam bem. Elas davam flores, mas às vezes sem frutos, ou então pequenos e de mau cheiro.” Dez anos mais tarde, ele teve de se resignar: os legumes não nasciam mais.

No vilarejo de Xinguang Sancun, assim como em todos os que cercam as usinas de Baotou, os camponeses abandonaram alguns campos, e no restante agora só plantam trigo e milho. Um estudo da secretaria municipal de proteção ambiental lhes revelou, afinal, que as terras-raras eram a fonte de seus problemas. As terras-raras, mas também as dezenas de novas usinas que brotaram em torno das instalações de tratamento, que fornecem produtos diversos, bem como uma usina elétrica a carvão que alimenta o novo tecido industrial de Baotou, autoproclamada “capital mundial das terras-raras”. Além dos vapores de solventes, sobretudo de ácido sulfúrico, os moradores respiram a poeira de carvão que entra em suas casas.

De alguns anos para cá, a poluição ambiente se acentuou, uma vez que o solo e os lençóis freáticos ficaram saturados de produtos tóxicos. Cinco anos atrás, Li teve de se desfazer de seus porcos doentes, últimos sobreviventes de um pequeno rebanho de vacas, cavalos, galinhas e cabras, dizimados por esses venenos.

Os camponeses fugiram. Hoje, em Xinguang Sancun, a maior parte das pequenas casas de tijolos escuros, aglutinadas umas às outras, estão caindo aos pedaços. Em dez anos, o vilarejo passou de 2 mil para 300 habitantes.

Lu Yongqing, 56, faz parte dos primeiros que partiram. “Eu não conseguia mais alimentar minha família”, ele conta. Ele tentou a sorte em Baotou, como pedreiro e depois carregador de tijolos em uma fábrica, antes de ir vender legumes nos mercados, complementando com bicos. “Nunca tive contrato fixo”, ele diz. Mantidos no status de camponeses que figura em seu registro de família, os refugiados de Xinguang Sancun se tornaram cidadãos de segunda classe, fadados à exploração.

Os que permaneceram no vilarejo, diversas vezes dividido e redesenhado de acordo com as instalações das usinas e da redistribuição agrária, costumam se encontrar perto da sala de mah-jong. “Tenho dor nas pernas como muita gente do vilarejo. Muitos também sofrem de diabete, osteoporose, problemas pulmonares. Nenhuma família é poupada pelas doenças”, afirma He Guixiang, firme no meio da reunião.

Essa sexagenária conhece bem as múltiplas consequências da contaminação por ter feito parte dos representantes de Xinguang Sancun que ousaram levar as queixas dos moradores junto ao governo local. “Faz vinte anos que bato na porta das autoridades,” ela diz. “No início, eu ia todos os dias, menos no domingo!”

De tanto que lutaram, os moradores acabaram conseguindo promessas de indenizações financeiras… que só foram parcialmente cumpridas. Foram prometidas também novas moradias. A alguns quilômetros a oeste de Xinguang Sancun, vemos torres bem ordenadas. Elas foram construídas com uma indenização paga pela empresa Baogang ao governo local. Mas os prédios estão desertos. Em cinco anos, dos 5 mil ocupantes previstos – eles viriam dos cinco vilarejos próximos do escoadouro – , nenhum se mudou. Isso porque o governo exige que eles comprem um direito de concessão sobre suas moradias, que eles não poderão deixar para seus filhos.

O velho Li Guirong, He Guixiang e todos aqueles que não puderam ir embora sobrevivem somente das poucas indenizações que a empresa lhes concedeu, além de uma magra pensão. Alguns tentaram vender os resíduos do lago, ainda muito ricos em terras-raras, para as usinas de tratamento. Dessa forma eles ganharam 2 mil yuans (pouco mais de R$ 617) por tonelada. Mas, de alguns meses para cá, o Estado passou a privá-los desse recurso. Um dos revendedores está sendo processado e pode ser condenado a mais de dez anos de cadeia.

Tradutor: Lana Lim

EcoDebate, 24/07/2012

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