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Vice-PGR defende, na Câmara dos Deputados, direito de indígenas ocuparem suas terras tradicionais

 

Questão dos guarani-kaiowá, no Mato Grosso do Sul, e dos xavante, no Mato Grosso, foi discutida em audiência pública nesta quinta-feira, 10 de maio

O direito à ocupação de territórios indígenas pelas etnias guarani-kaiowá, no Mato Grosso do Sul, e pelos xavante que vivem na Terra Indígena Marãiwatsédé, em Mato Grosso, foi defendido pela vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat. Ela participou, nesta quinta-feira, 10 de maio, de audiência pública na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados.

Deborah Duprat falou aos participantes da audiência pública sobre a luta das comunidades indígenas pela ocupação das terras que a Constituição da República lhes garante a posse. Ao ressaltar a importância da discussão da questão indígena em uma Comissão afeta ao trato de questões ambientais, a vice-procuradora-geral da República asseverou que o enfrentamento do problema, comum às duas áreas, será alcançado pela soma de esforços.

A luta dos xavante que vivem na terra indígena Marãiwatsédé, em Mato Grosso, é antiga. Expulsos de suas terras, Deborah Duprat recordou que, ainda na década de 1990, recebeu lideranças xavante que pediam que alguma providência fosse tomada pelo Ministério Público Federal para garantir que ao menos os indígenas mais idosos pudessem retornar à Marãiwatsédé para ali morrer e serem enterrados. Desde essa época, o MPF atua na defesa dos direitos dos xavante de ocuparem suas terras. Por meio de uma ação civil pública, o MPF conseguiu decisão judicial, em caráter liminar, que garantia aos índios o retorno às suas terras. Entretanto, em sede recursal, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região adotou outro posicionamento e impediu o retorno dos índios à sua terra tradicional.

Pouco mais de dez anos depois dessa decisão, o caso foi analisado liminarmente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou os índios a retornar a Marãiwatséde visto que, à época da decisão do TRF 1ª Região, a Funai já havia concluído totalmente o processo demarcatório da terra e não havia mais, no âmbito do Governo, qualquer disputa quanto ao fato de se tratar de uma área indígena. Entretanto, apesar de a decisão do STF ter autorizado o retorno dos xavante, não determinou a retirada, de Marãiwatséde, de todos os que ocupavam a área ilegalmente. Como o prosseguimento do processo, a Justiça Federal, em 1ª instância, emitiu decisão definitiva favorável à reocupação do território pelos xavante. Em seguida, na fase de recursos, o TRF 1ª Região confirmou a decisão. Deborah Duprat afirmou que, com esta decisão, “se afirma que a área Marãiwatséde é terra indígena e que os índios têm direito pleno sobre ela, ou seja: posse plena, pacífica, e usufruto dos seus recursos naturais”.

Apesar da decisão definitiva do TRF, Deborah Duprat explicou por que, até hoje, os xavante não retornaram a Marãiwatséde. Ela esclareceu que, mesmo após a decisão definitiva de mérito pelo TRF, houve outra decisão, proferida pelo mesmo Tribunal, que suspendeu a execução da sentença anterior, favorável aos xavante. Para Duprat, a essa altura, o TRF já não tinha mais competência para se manifestar sobre o caso. O motivo da nova decisão foi a apresentação de um acordo, pelo Governo de Mato Grosso, para que os xavante ocupassem o Parque Estadual do Araguaia, e não a área Marãiwatséde. Para Duprat, “esse acordo é impossível, pois terra indígena não se transaciona, está fora de comércio, e não pode ser trocada”. Ela complementa ao afirmar que “as áreas indígenas são terras que a Constituição diz que é indígena pelo fato de que ali existem as referências culturais e simbólicas desse povo”.

Guarani-kaiowá – Sobre a situação enfrentada pelos guarani-kaiowá, Deborah Duprat destacou que, apesar de as terras terem sido tituladas, não há discussão acerca do fato de os guarani-kaiowá nunca terem saído da área, tampouco quanto ao amplo processo titulação dessas áreas para o setor privado, que lá instalou projetos de natureza agropecuária. Na audiência pública, a vice-procuradora-geral da República reconheceu o esforço da Funai no enfrentamento da questão, mas lamentou que os grupos de trabalho que têm ido à área e não têm conseguido avanços devido à grande resistência dos que denominam proprietários da terra. Estes recusam-se a permitir estudos nas áreas, postura que vem sendo reforçada por decisões judiciais. Para Débora Duprat, trata-se de um círculo vicioso: “toda vez que há uma iniciativa do Estado de avançar no processo de reconhecimento dessas terras nós temos uma reação privada à qual se soma um reforço do Judiciário”. Fato ainda mais grave, Duprat mencionou concurso do Estado do Mato Grosso do Sul contra o reconhecimento desses direitos. “O próprio Estado se empenha em ações, em conjunto com fazendeiros, no sentido de impugnar esse reconhecimento de terras indígenas”, afirmou Duprat.

Deborah Duprat também chamou a atenção para um clima de hostilidade contra os guarani-kaiowá que tem se estabelecido no Mato Grosso do Sul. Ela destacou que os indígenas, “além de estarem nesse processo de retomada de terras e terem a hostilidade daqueles que as ocupam, eles também têm contra si um sentimento generalizado da população, que é constantemente estimulado, para que a população se rebele contra os índios”. Duprat alertou sobre a gravidade do problema. Para ela, “a questão no Mato Grosso do Sul é a situação indígena mais grave de todo o país porque, além de estarem em terras diminutas, além estarem sem possibilidade de sobrevivência física, cultural, de reprodução de usos, de costumes, e tradições, eles têm contra si um sentimento que pretende diminuí-los, inferiorizá-los”. Duprat lamentou que “depois de tanto tempo da promulgação de uma Constituição, de avanços judiciais tão expressivos, nós estejamos ainda, em relação aos xavante e aos guarani-kaiowá, enfrentando, especialmente por parte do Judiciário, essa incompreensão e essa resistência”.

Fonte: Procuradoria Geral da República

EcoDebate, 11/05/2012

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