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Rio+20 e Amazônia, artigo de Rubens Ricupero

 

[Folha de S.Paulo] Quando o presidente Sarney tomou a surpreendente decisão de oferecer o Brasil como sede da Rio 92, sua motivação tinha tudo a ver com a Amazônia. O fim dos anos 1980 coincidiu com o agravamento da destruição da floresta e da campanha internacional de denúncias. A reunião se realizou sob o governo Collor, ocasião em que se conseguiu fazer da Rio 92 a “finest hour”, o momento mais alto da diplomacia ambiental brasileira.

Atuamos como país em desenvolvimento, sem esquecer a perspectiva dos interesses da humanidade, ameaçada por fenômeno global que afeta o planeta e a atmosfera acima das fronteiras. Se o governo brasileiro sob Sarney ou Collor não fugiu do problema amazônico, impõe-se agora seguir linha semelhante, enfrentando de forma proativa a ameaça que a mudança climática faz pesar sobre a região.

O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) estimou que os aumentos da temperatura e as reduções na água provocarão a substituição da floresta tropical úmida por savana mais pobre que a do cerrado, de início na Amazônia oriental, onde mais intensa tem sido a desflorestação.

No pior cenário, a elevação da temperatura pode chegar até a enormidade de 8ºC! Além da destruição da floresta, do aumento de frequência das secas e dos incêndios, uma elevação desse tipo nos arrastaria a terreno desconhecido, fora da experiência histórica da humanidade.

Um dos efeitos seria o impacto sobre o regime de chuvas desde Mato Grosso até Buenos Aires. São elas que contribuem para fazer da área uma das mais produtivas concentrações de produção agropecuária do planeta.

A deterioração do balanço hídrico teria o potencial de aniquilar a principal vantagem comparativa do Brasil, da Argentina e de outros sul-americanos no comércio mundial. Reduziria a capacidade de produção de alimentos no momento em que a expansão da população torna cada vez mais crítica a oferta de calorias e proteínas.

A fim de enfrentar o perigo, falta-nos, no âmbito do Tratado Amazônico, um acordo para criar uma espécie de IPCC regional, a fim de analisar o conhecimento científico e chegar a um consenso sobre ações para combater a mudança do clima na região.

Como na Amazônia o maior problema é a falta e inadequação do conhecimento científico, impõe-se também instituir uma rede de coleta de dados e pesquisa em todos os países da bacia. Precisamos nos antecipar ao que certamente ocorrerá se nada fizermos: as cobranças, as críticas, os juízos condenatórios do resto do planeta.

Nada melhor para aproveitar a oportunidade da Rio+20 do que demonstrar que o Tratado de Cooperação Amazônica está mais vivo do que nunca na sintonia com as preocupações de toda a comunidade internacional.

Uma decisão dos países amazônicos de estabelecer mecanismo para fomentar e sistematizar as pesquisas, o conhecimento e as propostas sobre a Amazônia será a prova mais irrefutável da determinação das nações amazônicas de proteger a Amazônia contra a destruição.

Rubens Ricupero é embaixador e ex-ministro do Meio Ambiente (1993-1994).

Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo e socizalizado pelo Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4468.

EcoDebate, 03/04/2012

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2 thoughts on “Rio+20 e Amazônia, artigo de Rubens Ricupero

  • A deterioração do balanço hídrico da Amazônia, como de todos os outros biomas, é inevitável, a menos que a expansão populacional seja revertida, e a população humana seja mantida em quantidade compatível com as possibilidades planetárias.

    É evidente e incontestável que somos nós, seres humanos, os responsáveis pelos desequilíbrios ambientais, por existirmos em quantidade exagerada. Mas a nossa sociedade está organizada (ou desorganizada?) para se reproduzir cada vez mais. Incentivos nesse sentido não faltam. Os apelos emotivos são dissemidos em toda a sociedade, com a finalidade de estimular os instintos paterno e materno, e, assim, garantir o crescimento numérico da população humana, o que possibilita a geração de empreendimentos cada vez maiores e o consequente desenvolvimento do capital.

  • Bruno Versiani dos Anjos

    Parabéns pelo comentário do Valdeci … A maioria dos ditos “ambientalistas” perde tempo demais em uma retórica vazia de “desenvolvimento sustentável”, e pouca gente toca o “dedo na ferida”da super população. UM MUNDO COM SETE BILHÕES É SIMPLESMENTE INVIÁVEL do ponto de vista ambiental. Como afirmado pelo colega, a nossa sociedade pós cristã, baseada em conceitos sentimentalóides e senso comum, valoriza ao máximo a paternidade e maternidade, cobrindo esse conceitos com uma aura quase sagrada. Programas do SUS e o bolsa família estimulam a gravidez, lembremos que o aborto ainda é proibido em nossa republiqueta fundamentalista cristã dominada pelas bancadas ruralista e evangélica… Ter mais de um filho hoje representa um crime ambiental, segundo meu ponto de vista …

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