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Notícia

O governo e a concepção ‘fordista’ de visão de mundo

 

A questão indígena e a votação do Código Florestal são apenas dois exemplos dos retrocessos na área socioambiental no governo Dilma. Vários outros estão em curso como destaca a Carta das organizações ambientalistas. A falta de apetência do governo para com a agenda ambiental e indígena é mais do que simples descaso e falta de vontade política. É fruto de uma concepção de pensar a sociedade. É resultante de determinado tipo esquerda que pensa a questão ambiental e indígena como passivos e não como aspectos importantes num modelo societário.

Modelo fordista tardio

Já dissemos outras vezes nesse espaço da “Conjuntura da Semana” que o PT e o governo de Dilma, assim como foi o de Lula, são tributários do “modelo fordista tardio” na forma de pensar e ver a sociedade. A elite política no poder pensa a sociedade a partir do paradigma da segunda revolução industrial – fordista.

A essência do modelo neodesenvolvimentista em curso é fordista, ou seja, assenta-se nas bases produtivista e consumista. Investe pesadamente em matrizes energéticas centralizadoras e poluidoras (fósseis), perigosas (nuclear) ou devastadoras do meio ambiente (hidrelétricas).

Acerca desse modelo cabe destacar documento assinado por 20 dos mais destacados cientistas que já receberam o Prêmio Blue Planet, também chamado de Prêmio Nobel do Meio Ambiente.  Dizem eles: “É urgente romper a relação entre produção e consumo, de um lado, e destruição ambiental, de outro: “Crescimento material sem limites num planeta com recursos naturais finitos e em geral frágeis será insustentável”, ainda mais com subsídios prejudiciais em áreas como energia (US$ 1 trilhão/ano), transporte e agricultura – “que deveriam ser eliminados”, defende documento entregue no último dia 20 de fevereiro, em Nairóbi, no Quênia, aos ministros reunidos pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

É constitutivo ao modelo neodesenvolvimentista, a hiperexploração dos recursos naturais. Justificam-se aqui a construção das mega-hidrelétricas – Belo Monte,  Complexo Madeira, Complexo Tapajós –, abertura de rodovias e hidrovias; ampliação da exploração de madeira e minérios; expansão da pecuária e das monoculturas da soja e da cana de açucar. Aqui se encaixa também o forte incentivo, via financiamento do BNDES, à expansão da produção das commodities como o etanol, a soja e a pecuária – atividades que exercem pressão sobre os recursos naturais.

Nesse contexto, a questão ambiental e indígena se transformam em um estorvo. Os danos ambientais sob a ótica do progresso são custos inevitáveis e um preço a ser pago. Foi no governo Lula que começaram as pressões para que o Ministério do Meio Ambiente adotasse procedimentos frouxos para a emissão de licenciamento ambiental para as grandes obras do PAC – chegou-se inclusive à divisão do Ibama. Lula reiteradas vezes reclamou dos entraves ambientais – das “pererecas“, dos bagres e do movimento ambientalista.

Dilma Rousseff prossegue no mesmo caminho. Destaque-se que Dilma foi ministra da Casa Civil no governo Lula e coordenadora do PAC e esteve à frente nas pressões para que o Ibama acelerasse as licenças para a execução das obras o que culminou com o afastamento de Marina Silva do Meio-Ambiente.

Coalizão e desideologização

Por outro lado, o conservadorismo do governo frente ao tema ambiental – assim como se vê na questão indígena e no debate da Comissão da Verdade – está relacionado ao governo de coalizão.  As concessões às teses conservadoras se fazem em nome da governabilidade. Para não melindrar sua base de apoio político, o governo vai se desfigurando sempre mais. De tanto ceder e fazer concessões, o governo já não tem mais postura firme frente a alguns pontos. Tudo se tornou negociável. A derrapada fisiológica, somada à visão fordista de pensar o desenvolvimento, empurraram a agenda ambiental e indígena para o final da lista de preocupações do governo.

Os enormes retrocessos na agenda ambiental registrados pela Carta das organizações ambientalistas não são, portanto, fruto da inércia do governo frente ao tema. É ainda mais grave, é fruto de uma concepção de governar.

A análise da conjuntura da semana é uma (re)leitura das “Notícias do Dia’ publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, com sede em Curitiba-PR, parceiro estratégico do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia.

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