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Réquiem para o Rio Carioca, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

[EcoDebate] O aniversário do Rio de Janeiro é comemorado oficialmente no dia 01 de março e a cidade, de mais de 6 milhões de habitantes, é uma das poucas grandes metrópoles do mundo que não possui um grande rio cortando seu espaço urbano. Isto torna o nome da capital fluminense duplamente estranho, pois o Rio de Janeiro nem é rio e nem é de janeiro.

O nome da cidade foi fruto de um engano. No dia 01 de janeiro de 1502, um lusitano – não se sabe ao certo se Gonçalo Coelho ou Gaspar de Lemos – confundiu o estuário da Baia da Guanabara com um rio. Mais tarde a confusão foi esclarecida, o nome ficou e o Rio de Janeiro se tornou uma grande cidade, mas sem a presença de um grande rio, mesmo depois da expulsão dos franceses e da fundação da cidade do “Rio de Janeiro”, no dia 01 de março de 1565, por Estácio de Sá.

Já o nome Carioca vem da língua Tupi e quer dizer “casa de branco”. Dizem que foi o nome dado a uma casa construída pelos portugueses na beira do rio que desaguava na praia do Flamengo. Daí o nome do Rio Carioca e, por extensão, de todos os habitantes da cidade.

O Rio Carioca foi fundamental para o crescimento da cidade do Rio de Janeiro, tendo sido a principal fonte de água doce desde os primórdios da colonização. O Rio Carioca tem sua nascente na Floresta da Tijuca, em Santa Teresa, e originalmente, corria para o atual Largo do Machado, onde formava uma lagoa, conhecida como Lagoa da Carioca. Uma parte das águas da lagoa seguia para a foz na Praia do Flamengo e outra parte se juntava com o Rio Catete e seguia para a foz na Praia do Russell (toda este pedaço do litoral foi aterrado para formar uma parte do atual Aterro do Flamengo). Nos dias atuais, quando chove muito forte, toda esta área costuma ficar inundada.

Desde o século XVIII, as águas do Rio Carioca foram utilizadas para o abastecimento do centro da cidade, tendo sido canalizadas na construção dos Arcos da Lapa, aqueduto terminado em 1750 e que fornecia água doce e limpa para os chafarizes e fontes, especialmente, do Largo da Carioca, do Paço Imperial e da Praça XV. Dizem que as mulheres que bebiam suas águas ficavam mais bonitas e os homens, recuperavam o vigor físico. Portanto, o Rio Carioca foi fundamental para o desenvolvimento físico e simbólico da “cidade maravilhosa”.

Porém, com o passar do tempo, o leito do rio foi canalizado a suas lagoas foram drenadas na medida em que cresciam as moradias e o comércio da área. Durante as obras de remodelação e ampliação do cento da cidade – promovidas pelo prefeito Pereira Passos no início do século XX – as águas passaram para o nível subterrâneo e desapareceram da vista dos cariocas nos bairros de Cosme Velho, Laranjeiras e Flamengo.

Se o Rio Carioca possibilitou a cidade ser o que ela é hoje, o Rio de Janeiro não fez por merecer o seu rio que deságua mais perto da entrada da Baia de Guanabara. O antigo rio foi descaracterizado e se tornou uma vítima inocente de uma violência injustificável. Aliás outros rios importantes da cidade, como o Maracanã, também se tornaram simples canal de esgoto e, todos juntos, deságuam na baia, também conhecida como “Pinicão da Guanabara”.

Sendo pequeno e frágil, o Rio Carioca não resistiu às constantes e crescentes investidas humanas. Atualmente, as águas do rio estão completamente contaminadas por esgoto de todo tipo e as mulheres e os homens não podem mais beber de suas águas (para se tornarem bonitas e vigorosos).

Sempre que caminho na praia do Flamengo passo pela foz do “rio” Carioca. Confesso que, por diversas vezes, tive que tapar o nariz. O rio não está só morto, ele está em permanente estado de decomposição e putrefação.

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

EcoDebate, 01/03/2012

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