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Vazamento da Chevron, na bacia de Campos, pode afetar saúde da população

 

O vazamento de óleo no Campo de Frade, explorado pela Chevron, na Bacia de Campos, pode chegar às praias do Rio, Espírito Santo e São Paulo dentro de duas semanas, afetando uma população estimada em 15 mil pessoas. O alerta foi feito por técnicos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), em reunião com o secretário estadual do Ambiente, Carlos Minc. “Cerca de dois terços de todo o óleo derramado, sobretudo aquele mais grosso, ainda está abaixo do espelho d’água. Esse óleo vai passando por processo físico-químicos e vira pelotas que vão acabar nas praias”, explicou Minc, em entrevista recente ao jornal O Globo.

Para o biólogo Salvatore Siciliano, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e coordenador do Grupo de Estudos de Mamíferos Marinhos da Região dos Lagos (Gemm-Lagos), é difícil mensurar o dano ambiental. Segundo ele, a maior parte das carcaças dos mamíferos marinhos vai afundar e o que vai chegar às praias é o piche. Salvatore está participando de reuniões regulares com técnicos do Inea. Na quinta-feira (24/11), ele destacou Jailson Fulgêncio de Moura, doutorando da Ensp, para um sobrevoo na Bacia de Campus, a convite do Inea. “Ele verificou que ainda existe uma considerável quantidade de óleo na superfície”, comentou o biólogo. E faz um alerta: peixes e crustáceos consumidos pela população podem ser contaminados por hidrocarbonetos e muitos desses compostos são potencialmente cancerígenos. Leia, a seguir, entrevista com Siciliano.

Qual é a extensão do dano provocado pelo vazamento do óleo da Chevron no Campo de Frade, na Bacia de Campus?

Salvatore Siciliano: É difícil medir a extensão do dano ambiental. No acidente provocado por uma explosão na plataforma de perfuração da British Petroleum, no Golfo do México, em 2010, 800 milhões de litros de óleo vazaram por 87 dias. Apenas 2% das carcaças dos animais atingidos chegaram ao litoral. A informação que temos sobre o impacto do acidente sempre será muito limitada. A maior parte das carcaças vai afundar. O que vai chegar à praia é o piche, que suja o pé. Mas o que está por trás disso é de uma escala enorme. As empresas têm de estar preparadas para esse risco. O ônus não pode caber a todo mundo. Elas têm de monitorar e sanar o problema.

Em sobrevoo realizado na Bacia de Campos, região do vazamento de óleo, qual foi a situação encontrada?

Salvatore Siciliano: O sobrevoo na região da Bacia de Campos foi feito, na quinta-feira (24/11), a convite do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), para avaliar a extensão do vazamento e o comprometimento dos mamíferos e aves marinhas. Quem fez o sobrevoo foi Jailson Fulgêncio de Moura, aluno de doutorado em Saúde Pública e Meio Ambiente da Ensp e pesquisador do Grupo de Estudos de Mamíferos Marinhos da Região dos Lagos (Gemm -Lagos). Ele verificou que ainda existe uma considerável quantidade de óleo na superfície. A mancha maior, ou principal, foi dividida em várias manchas menores por ação mecânica dos jatos de água com areia. Uma boa parte pode ter afundado ou está sendo levado rapidamente pelas correntes, que nessa área são fortíssimas.

A previsão é de que o óleo derramado pela Chevron chegue às praias do Estado do Rio, sobretudo Búzios e Angra dos Reis, além de praias do Espírito Santo e de São Paulo (Ubatuba), dentro de duas semanas. Quais seriam as consequências para a população que vive nessa região?

Salvatore Siciliano: Uma porção desse óleo cru, ou alcatrão, sempre chega nas praias. Aliás, desde criança aprendi que às vezes pisar na areia da praia pode acabar em sujeira nos pés! Aquele piche que gruda na sola do pé é o resultado desses acidentes – um pequeno vazamento aqui outro maior acolá e todos pagam o pato. Risco de chegar à praia sempre há. Boa parte desse óleo se sedimenta no fundo, permanece na coluna d’água, ou evapora, mas uma parte acaba nas praias. O que fica na água acaba sendo incorporado por bioacumulação pelos organismos, do fitoplâncton à baleia. Não é confortável pensar que uma parte dos peixes que vamos consumir no almoço está contaminada por hidrocarbonetos. Muitos desses compostos são potencialmente cancerígenos.

E para os mamíferos e aves marinhas, quais são os riscos?

Salvatore Siciliano: Para as aves marinhas é um enorme desastre. Acredita-se que elas confundam a mancha de óleo com cardumes e, por isso, mergulhem no petróleo. As penas funcionam como esponjas, ficam encharcadas de óleo. As aves tentam se limpar e acabam ingerindo mais alcatrão, se contaminam gravemente, entram em hipotermia, não se alimentam, morrem em poucos dias. Esse ano recebemos muitos pinguins oleados – foi triste de ver. Algumas aves têm o comportamento migratório dos cetáceos, como albatrozes e petréis, outras são residentes daquela região. É o exemplo de atobás, fragatas e algumas gaivotas. Para os mamíferos marinhos o risco maior é a exposição crônica, ou seja, de longo prazo. Assim como nós, os mamíferos marinhos vão comer peixes ou crustáceos contaminados.

O secretário de Estado do Ambiente, Carlos Minc, teria avistado três baleias nadando perto da mancha, a menos de 300 metros de distância. Como está a situação desses cetáceos?

Salvatore Siciliano: Nesta época do ano, as baleias jubarte estão retornando para o Polo Sul. Depois de se alimentar durante o verão, no inverno elas nadaram em direção à linha do Equador, em busca de águas mais quentes para se reproduzir. Agora, voltam para a Antártica, acompanhadas de seus filhotes. O secretário de Estado do Ambiente, Carlos Minc, viu três delas nadando perto da mancha. Mas não foram mais avistadas no sobrevoo realizado na quinta-feira (24/11).

De que forma a Fiocruz pode trabalhar para ajudar o governo do Estado nessa questão?

Salvatore Siciliano: A Fiocruz, por meio do Gemm-Lagos, nosso grupo de pesquisa que inclui diversos estudantes, estagiários e colaboradores voluntários, vai continuar monitorando as praias da região e fazendo as avistagens de mamíferos e aves marinhas – atividades que realizamos desde 1999, na Região dos Lagos e no Norte Fluminense, entre Saquarema e São Francisco do Itabapoana.

Estamos participando de reuniões no Inea e conversando sobre as possibilidades de aplicação dos recursos advindos da multa pelo vazamento de óleo. Uma das nossas propostas é a construção de um centro de reabilitação de animais marinhos na Região dos Lagos. Essa proposta também é apoiada pelo Programa Institucional em Biodiversidade e Saúde da Fiocruz, coordenado pela pesquisadora Marcia Chame.

O que pode ser feito para reduzir o impacto que o vazamento terá no ambiente e na saúde da população e dos animais marinhos?

Salvatore Siciliano: O efeito combinado do vazamento e de toda ação humana na Bacia de Campos, que inclui aumento do tráfego de navios, ruídos, descarga de lixo e esgoto, compromete a saúde do ambiente costeiro-marinho. Só vamos nos dar conta quando perdermos tudo isso. Lembro que quando criança ia à praia na Ilha do Governador, Paquetá e Urca… Quem se arrisca hoje em dia?

Entrevista realizada por Elisa Andries, da Agência Fiocruz de Notícias e publicada pelo EcoDebate, 19/12/2011

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