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‘Em Portugal temos vários problemas relacionados com o ciclo de urânio’, entrevista com António Eloy

 

António Eloy é o responsável pela organização do primeiro Festival de Urânio que teve lugar na cidade do Porto, na Casa da Horta. Um evento, organizado pelo activista social, consultor para energias limpas, professor e escritor, que visa promover a consciencialização das populações para os perigos da energia nuclear e o debate de outras temáticas relacionadas com os filmes em exibição.

Qual é a importância deste festival ao nível nacional?

António Eloy: Este festival surge como extensão de um que se realizou no Rio de Janeiro. Vamos mostrar os filmes mais importantes que passaram nesse evento. Foi-me entregue a coordenação deste festival pelos organizadores brasileiros aquando da sua passagem por Portugal, durante as filmagens sobre a mineração de urânio em Nisa e alguns contactos com a zona de Urgeiriça. Dei-lhes uma explicação da minha actividade social e profissional nesta matéria e expliquei-lhes o problema que se colocaria a uma futura e hipotética mineração em Nisa, as dificuldades que já existem em termos de recuperação das áreas minadas, os problemas sociais e de saúde pública dos trabalhadores e das populações em toda esta zona da Cova da Beira. Foi uma grande conversa, ficámos em contacto e eles desafiaram-me para organizar esta extensão do festival no Porto. Estamos a pensar transpor este evento, no mês de Janeiro, para a cidade de Lisboa. Contámos também com a disponibilidade das autoridades locais para mostrar os filmes em outras zonas do país, embora estes filmes estejam centrados na produção, também focam os problemas adjacentes do ciclo de urânio, da produção de energia em centrais termoeléctricas, a utilização dos seus resíduos para a fabricação de bombas com urânio empobrecido e do armamento de destruição massiva que é abordado em filmes com muita qualidade.

Porquê decidistes trazer este evento até aqui, achas que não se dá a devida importância à questão nuclear no nosso país?

AE: Em Portugal temos vários problemas relacionados com o ciclo de urânio, a mineração na Cova da Beira que provocou sérios prejuízos e ainda tem efeitos ambientais, na saúde das populações e dos trabalhadores. Há a hipótese de abrir uma nova jazida, na zona de Niza, que se depara com uma forte oposição popular e com uma análise de impacto ambiental muito negativa. Este festival poderá ser repercutido nestas zonas e contribuirá para criar um movimento de opinião pública, ajudar a recuperar zonas devastadas e impedir que novas áreas sejam destruídas. Em Portugal, e já foi objecto de debate, temos pessoas que defendem a instalação de centrais nucleares. Finalmente, temos o problema das centrais espanholas que estão aqui ao pé, da central de Almaraz, do encerramento das usinas na zona da Andaluzia, tivemos a ameaça da criação de um cemitério radioactivo perto da fronteira portuguesa e no passado procedeu-se ao encerramento das fossas marítimas atlânticas o que nos preocupou muito na altura, embora esse problema esteja afastado.

No programa não constam quaisquer filmes sobre a questão do urânio em Portugal, isso é porque pretendem mostra-lo em Janeiro?

AE: Temos a garantida da estreia mundial de um filme sobre a zona de Nisa, realizado pela Márcia Gomes e pelo Norbert Shuchanek, que aborda estas questões concretas da hipotética mineração nesta zona. No âmbito deste festival, estive a desenvolver alguns contactos, nomeadamente com um grupo de jovens que fizeram um filme sobre as minas da Borralha e que se mostraram interessados em fazer filmagens sobre a Cova da Beira com dois enfoques alternativos. Esse projecto está a ser estudado e é evidente que se for para frente o documentário será mostrado, não em Janeiro, porque não haverá hipótese de o fazer em tão curto lapso de tempo, mas numa extensão do festival que faremos no final do ano de 2012, início de 2013.

Quais são os filmes que podes destacar desta mostra?

AE: Ontem, visionámos um filme tremendo sobre o impacto das bombas em cenários de guerra, que também afectam portugueses e as tropas de várias nacionalidades que têm sido expostos as radiações das bombas de urânio empobrecido. Nomeadamente na Bósnia, nos Balcãs e no Iraque. Vimos um relato impressionante de ex-soldados americanos que denunciavam estas situações. Outro dos documentários que constam da programação visa o comboio castor, a transferência de resíduos altamente radioactivos para a Alemanha, onde são depositados numa salina desactivada em Gorlenben durante milhares de anos. Assistimos as manifestações e a oposição das populações locais que demonstram uma posição muito empenhada e consciencializada nesta matéria. Uma estreia mundial neste festival será o documentário sobre as minas de Caetité. É uma extracção a céu aberto, que tem provocado um impacto devastador no meio ambiente e em termos de saúde pública. Outra das histórias que vamos abordar é a mineração nos EUA e a destruição das terras dos indígenas americanos. Vamos continuar a ter debates concentrados em várias temáticas, de referir a conservação e eficiência energética tudo relacionado com o ciclo de urânio, da produção e transformação desta matéria-prima em energia.

Que elações pudestes retirar dos debates que já decorreram?

AE: O debate foi sobretudo muito civilizado. Foi um debate muito franco e muito aberto em que tivemos a oportunidade de ouvir as duas posições, Naturalmente, os filmes induzem num determinado sentido, contudo temos todo o interesse de ouvir as pessoas com outras opiniões. O engenheiro Pedro Sampaio Nunes, que é um dos promotores das centrais nucleares tinha algum receio, porque por vezes tem sido contestado com alguma veemência e violência. Contudo, ele pode-se exprimir de uma forma aberta. Os diversos pontos de vista foram expressos pela generalidade das pessoas. Mas, o mais importante, para nós activistas sociais, sobretudo, os que estão empenhados na sustentabilidade e no meio ambiente, é conhecer os diversos pontos de vista, porque não nós podemos opor com consciência, critério e qualidade sem ouvir os que são a favor das centrais nucleares, que ao nosso ver estão errados. De reter, que foi um debate muito cortês e que todos ganhámos com essa troca de ideias, também para perceber quais são os pontos fracos dos argumentos em prol da energia nuclear e mesmo se pode dizer dos nossos pontos de vista.

http://casadahorta.pegada.net/entrada/

Entrevista de Yvette Vieira, publicada na revista Ivy

Entrevista enviada por Norbert Suchanek, para o EcoDebate, 08/12/2011

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