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Como estabilizar a população mundial? artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

[EcoDebate] De acordo com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), o habitante de número 7 bilhões chegará ao mundo no dia 31 de outubro de 2011. A espécie humana chegou a 3,5 bilhões em 1968, a 4 bilhões em 1974, a 5 bilhões em 1987 e a 6 bilhões em 1999. Ou seja, em 43 anos (entre 1968 e 2011), a população global dobrou de tamanho, tendo acrescentado 1 bilhão de pessoas apenas nos últimos 12 anos.

Sete bilhões de pessoas é muito, é pouco ou é suficiente?

Evidentemente, assim como quase tudo que se refere às ciências humanas, não existe uma resposta única. Sempre vão existir aqueles que acham que a Terra tem espaço suficiente, enquanto outros acham que a Terra está superpovoada.

Porém, hoje em dia, é crescente o número de pessoas que consideram que as atividades humanas estão destruindo o Planeta e colocando em risco o futuro da humanidade e das outras espécies vivas da Terra. Mas enquanto algumas pesquisadores responsabilizam o crescimento populacional pelo estresse ambiental, outros responsabilizam o crescimento do consumo.

Os primeiros dizem que o consumo é elevado porque existem muitas pessoas no mundo (overpopulation) e que a demanda por bens e serviços sempre tende a crescer porque as aspirações humanas são infinitas. Os segundos consideram que o alto consumo (overconsumption) ocorre devido à máquina de propaganda mobilizada pelo modelo capitalista de produção e acumulação de lucro.

De fato, a população e o consumo têm crescido de maneira exponencial nos últimos 200 anos. Mesmo países como a China e o Vietnã, que resistiram às ideologias dos países capitalistas ocidentais (inclusive são até hoje dirigidos por partidos comunistas), têm adotado medidas para controlar a população, enquanto promovem o consumo amplo e irrestrito. Cada vez existem mais países em desenvolvimento que querem copiar os “sucessos” da China contemporânea na produção de bens de consumo. Os países em desenvolvimento já são responsáveis pela metade da produção econômica mundial.

Com um número maior ou menor de pessoas, o fato inequívoco é que precisamos mudar o padrão de produção e consumo. Este é o grande desafio do século XXI. Principalmente, é preciso controlar, o consumo desregrado que reduz cada vez mais a capacidade de regeneração do meio ambiente. Inclusive ajuda muito quando as pessoas optam por viver de maneira ambientalmente sustentável e adotam a filosofia de vida baseada na simplicidade voluntária. Mas isto não é excludente com a autodeterminação reprodutiva e autonomia para ter o número de filhos desejados.

Sete bilhões de habitantes no mundo poderia não ser muito se houvesse a adoção de um nível de consumo compatível com a sustentabilidade ambiental. Porém, o consumo médio da população mundial já está acima da capacidade de regeneração do Planeta e a demanda agregada continua crescendo. Um crescimento do PIB de 3,5% ao ano significa dobrar a produção econômica em 20 anos. O crescimento populacional, em última instância, tem funcionado como força impulsora de mais crescimento econômico.

Porém, o Planeta tem os seus limites e os próprios autores da economia clássica já falavam que o crescimento econômico chegaria, algum dia, ao “Estado Estacionário”.

Assim, mais cedo ou mais tarde, a hipótese da estabilização populacional estará colocada no horizonte. Ao invés de uma população crescendo rumo ao infinito, uma estabilidade do número de habitantes poderá ajudar os investimentos em qualidade de vida e bem-estar das pessoas e não em aumentos puramente quantitativos. Ou seja, a estabilização da população mundial pode ser uma forma de valorização do ser humano e do meio ambiente ao mesmo tempo.

A estabilidade da população mundial não requer esforços extraordinários. Já existem países nos quais a população está decrescendo, como: Cuba, Rússia, Japão, Ucrânia, etc. Existem outros que vão ter suas populações caindo num futuro próximo, pois já possuem taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição, tais como: Brasil, Chile, China, Coréia do Sul, Irã, Vietnã, etc. Também há um grande grupo de países que estão em processo de transição de altas para baixas taxas de fecundidade e devem atingir o nível de reposição em um espaço curto de tempo.

O Plano de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), realizada no Cairo em 1994, diz em seu parágrafo 3.14: “Estão se fortalecendo mutuamente os esforços para diminuir o crescimento demográfico, para reduzir a pobreza, para alcançar o progresso econômico, melhorar a proteção ambiental e reduzir sistemas insustentáveis de consumo e de produção. Em muitos países, o crescimento mais lento da população exigiu mais tempo para se ajustar a futuros aumentos demográficos. Isso aumentou a capacidade desses países de atacar a pobreza, proteger e recuperar o meio ambiente e lançar a base de um futuro desenvolvimento sustentável. A simples diferença de uma única década na transição para níveis de estabilização da fecundidade pode ter considerável impacto positivo na qualidade de vida”.

Portanto, a estabilização das taxas de fecundidade pode melhorar o bem-estar do população. Contudo, existem atualmente cerca de 30 países que possuem taxas de fecundidade muito altas e cujos governos apresentam dificuldades para ajudar suas populações a atingir o tamanho de famílias que desejam. Nestes países – que geralmente são pobres e possuem altos índices de violência e insegurança – o fenômeno da gravidez indesejada é muito alto. A maior parte do crescimento populacional projetado até 2.100 está concentrada nestes poucos países (a grande maioria na África ao sul do Saara).

Desta forma, não é tarefa impossível evitar o crescimento populacional não planejado (e não desejado). As populações pobres, de modo geral, e os pobres dos países pobres, em particular, têm muitos filhos por falta de acesso aos métodos de regulação da fecundidade, falta de acesso aos direitos sexuais e reprodutivos e falta de acesso à educação, saúde e trabalho. Existem cerce de 215 milhões de mulheres no mundo sem acesso aos métodos contraceptivos.

Portanto, com inclusão social as famílias tendem a limitar seu tamanho pelos seus próprios meios. A cidadania é o melhor contraceptivo.

Além do mais, como colocado no parágrafo 3.14 da CIPD/1994 do Cairo, quando as taxas de fecundidade começam a cair se reduz, também, a razão de dependência demográfica e se cria uma janela de oportunidade para melhorias na educação, saúde, mercado de trabalho, etc. Em geral, a redução do ritmo de crescimento demográfico e a mudança da estrutura etária cria um círculo virtuoso que tende a contribuir para o bem-estar da população.

Da mesma forma como é impossível o consumo crescer ao infinito, também é impossível que a população cresça infinitamente. Por isto, algum dia, a população vai se estabilizar. Mas devido à estrutura etária jovem prevalencente em uma parcela ampla da população mundial, mesmo com uma queda rápida da fecundidade, o crescimento atual da populaçao vai continuar devido à inércia demográfica. Depois dos 7 bilhões de habitantes de 2011 os 8 bilhões de habitantes já estão encomendados para algum ano entre 2025 e 2030. Entretanto, a população mundial pode parar de crescer antes de chegar aos 9 bilhões de habitantes.

Na verdade, o problema de alto crescimento demográfico é um problema localizado nos citados cerca de três dezenas de países e que pode ser solucionado com vontade política e uma fração dos recursos mundiais gastos com despesas militares. O processo de urbanização do mundo, que vai se aprofundar nas próximas décadas, tende a abrir novas oportunidades para a implementação dos direitos de cidadania.

Para estabilizar a população dos países com alto crescimento demográfico, ainda no século XXI, seria preciso trazer as taxas de fecundidade para o nível de reposição (2,1 filhos por mulher), por meio das seguintes medidas:

  1. Universalizar o ensino fundamental para todas as crianças e jovens do mundo;
  2. Garantir o pleno emprego e o trabalho decente;
  3. Garantir direitos iguais para homens e mulheres (equidade de gênero);
  4. Garantir habitação e serviços adequados de água, esgoto, lixo e luz para todos;
  5. Reduzir a mortalidade infantil e garantir o acesso universal à saúde, à higiene, combatendo as principais causas de epidemias;
  6. Garantir acesso universal à saúde sexual e reprodutiva (o que inclui disponibilidade e variedade de métodos de regulação da fecundidade);
  7. Garantir liberdade de organização, manifestação e acesso à informação;
  8. Garantir a governança nacional e o apoio e a coordenação internacional para implementar, de maneira universal e indivisível, a plenitude dos direitos humanos.

José Eustáquio Diniz Alves, colunista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

EcoDebate, 26/10/2011

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4 thoughts on “Como estabilizar a população mundial? artigo de José Eustáquio Diniz Alves

  • Vitor Fonseca pereira

    (overpopulation) e que a demanda por bens e serviços sempre tende a crescer porque as aspirações humanas são infinitas. Os segundos consideram que o alto consumo (overconsumption)

  • No dia 31 de outubro de 2011 a população 7 bi de pessoas, em sua maioria sem educação, pouca consciência e valores.

    Overpopulation e Overconsumption, são coisas que existem apenas em uma sociedade como esta, sem valores, que não respeita a si mesma e muito menos ao próximo. Com um desejo primal de ter e possuir. Bem “demoníaco”, mesmo.

    Se houvesse amor ao próximo, não haveria guerra santa.

    Nós realmente precisamos de leis internacionais sobre educação, e algo sobre o amor ao próximo, à si, à natureza e todas às formas vidas, às diferenças.. à vida. E quando isso acontecer não precisaremos pensar em controle populacional, pois respeitaremos, tudo e a todos.

    Os 30 principais países com problemas populacionais de alto crescimento demográfico. Todos partilhão da mesma razão: políticos no poder, buscando mais poder e uma população com baixa qualidade de vida e de educação.

    É uma defesa extintiva de todo e qualquer ser vivo se proliferar, se reproduzir mais, em ambientes hostis.

    A doença do seculo é o estresse. Porque o sistema que nos proporcionamos a nós e aos nossos filhos é selvagem caótico, sujo e desequilibrado.

    É Lamentável ver o ser humano tão belos e inteligente, mas completamente sem foco, sem respeito pela vida ou pelos outros e pela terra que uma benção.

    Eu pergunto: Por que vivemos assim?
    Por que agimos, assim?

    Se tivessimos valores, festejaríamos 7bi de pessoas, juntos.

  • Boa noite.
    Quando temos um problema a resolver e várias alternativas candidatas a possíveis soluções, devemos submetê-las aos testes de aceitabilidade, adequabilidade e exequibilidade.
    Assim, após equacionarmos com clareza o nosso problema, que nos parece ser: Como devemos agir para garantir boa qualidade de vida para a geração atual, sem comprometer esta mesma qualidade para as gerações futuras?
    Antes de analisarmos as possibilidades citadas no texto, devemos verificar a situação atual: uma parcela reduzida da humanidade vivendo com boa qualidade de vida e com um nível de consumo incompatível com as possibilidades de reposição do Planeta, caso esse consumo fosse adotado pelos 7 bilhões de habitantes. Por outro lado, observamos que a maior parcela da humanidade é carente dos recursos básicos de sobrevivência, dos quais citamos alimentação, saúde, saneamento e educação. Entretanto, esta parcela vem aumentando o poder aquisitivo e, consequentemente o nível de consumo, demandando um aumento de produção. Há vários países em desenvolvimento precisando crescer, para reduzir as desigualdades sociais e dar condições dignas ao seu povo.
    Ao analisarmos a possibilidade de redução da produção e consumo, veremos que é uma ação inadequada e inaceitável, dada a ganância da nossa espécie, ou seja, não será levada a cabo por esta geração.
    Quanto a possibilidade de minimização do crescimento da população, mesmo diante do instinto de
    multiplicação, cabe ao ser humano, que é dotado de inteligência, tomar medidas de preservação da espécie. A qual depende da manutenção da biodiversidade. Assim sendo, essa minimização é exequivel (pode ser resolvida com os recursos que temos), aceitável (não representará perda para humanidade) e adequada (contribui para a solução do nosso problema). Observamos que, a adoção da ação acima citada, já é uma realidade no circulo das pessoas com nível educacional e econômico mais privilegiado. Os líderes mundiais precisam ter coragem para assumir o desgaste inerente ao tema e disponibilizar os meios necessários para que cada família possa fazer seu próprio planejamento reprodutivo.
    No Brasil a legislação garante esse direito, mas o SUS e o ministério da educação não disponibilizam adequadamente os meios necessários.
    Entretanto, sabemos que, somente o acompanhamento do crescimento da população, não resolverá o problema. Sem educação de qualidade, nada se resolve. A destinação inadequada de resíduos sólidos está aí para confirmar esta afirmativa e mostrar que precisamos mudar de atitudes. Criticar é fácil. Vamos agir.

  • O artigo é muito interessante, principalmente sobre a questão da estabilidade populacional, no entanto uma frase me interessou mais ainda: ” existem cerca de 215 milhões de mulheres sem acesso aos métodos contraceptivos”.
    Por trás desta frase leio que ainda recai sobre a mulher o papel dos índices populacionais e a responsabilidade do crescimento ou decréscimo e por isso o levantamento fica restrito as mulheres, quando os homens também tem a mesma responsabilidade pela gravidez, no entanto não é responsabilizado socialmente.
    A mais, o método contraceptivo mais barato e disseminado é a camisinha, estando seu uso associado exclusivamente ao homem. Os métodos contraceptivos femininos são muito mais intrusivos, caros e menos disseminados.
    Portanto, frases como estas apresentam um posicionamento machista e unilateral em relação a condição da mulher e as responsabilidades, ao meu ver.

Fechado para comentários.