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Falta de plano de drenagem expõe Campinas a riscos de alagamentos

Falta de plano de drenagem expõe Campinas a riscos de alagamentos

Estudo do IG analisou ocorrências registradas entre 1958 e 2007 na cidade

São cada vez mais frequentes as cenas de alagamentos em vias e imóveis em tempos de chuvas extremas no país. Estudo realizado no Instituto de Geociências (IG) da Unicamp pela geógrafa Marina Sória Castellano confirma que os alagamentos já ocorriam em Campinas no final da década de 1950. Ela traçou uma série histórica dos eventos extremos de chuvas, assim como seus respectivos impactos, no período compreendido entre 1958 a 2007. Ao longo do trabalho, a pesquisadora acabou descobrindo que a cidade não possui um Plano Diretor de Drenagem – uma ferramenta essencial, que dimensiona as áreas de risco de possíveis inundações e propõe diretrizes capazes de solucionar o problema.

Segundo a geógrafa, o estudo demonstra que os estragos causados pelas chuvas há muitos anos são recorrentes. Durante as cinco décadas analisadas, somou-se um total de 1.450 casos de alagamentos de imóveis e 862 casos em vias. O risco de desabamento de imóveis totalizou 1.320 ocorrências. Por isso, ela defende, entre outras ações, a elaboração de um Plano Diretor de Drenagem pela Prefeitura Municipal de Campinas. “O município encontra-se em um processo de crescimento acelerado e o plano seria um instrumento fundamental de gestão, que permitiria a solução de muitos problemas causados pelas chuvas”, destaca.

O banco de dados elaborado por Marina Castellano, inédito para a cidade de Campinas, permite analisar os impactos das chuvas e auxiliar na melhoria de ações para prevenção de inundações que tanto castigam a população. “Campinas é carente deste tipo de informação e os estudos sempre contemplam períodos curtos de análises. Neste caso, trata-se de 50 anos da história de chuvas e eventos extremos”, destaca Marina Castellano, que apresentou a dissertação de mestrado sobre o tema no semestre passado, sob orientação da professora Luci Hidalgo Nunes.

Outro ponto de destaque na pesquisa conduzida no IG mostra que muitas áreas de Campinas, independentemente do estrato social, registraram algum tipo de evento extremo. “O que nos leva a deduzir que a população, seja ela de classe alta ou baixa, está exposta ao risco. Nos casos mapeados, notou-se que em todos os tipos de impactos, áreas onde vivem populações de renda média apresentaram incidência grande de episódios. Em geral, a ideia que se tem é de que apenas as populações menos favorecidas sofrem com as chuvas”, destaca Marina.

Nas duas primeiras décadas de estudo, compreendidas entre 1958 e 1977, a classe média – segmento com renda entre cinco e dez salários mínimos – foi a mais atingida, em um total de 306 ocorrências de 16 tipos diferentes de eventos. “Também se observam muitas quedas de árvores e, por isso, a população de alta renda aparece com ocorrências significativas. Um motivo poderia ser a alta concentração de áreas mais arborizadas em bairros onde reside este estrato social”, avalia. Nas últimas décadas, as populações de baixa renda aparecem como as mais prejudicadas, uma vez que os alagamentos começam a elevar o número de desabrigados.

Os problemas de trânsito relacionados a congestionamentos sofrem um aumento brutal a partir da terceira década. Na primeira, apenas uma ocorrência, contra quatro na segunda. Mas, na terceira, o número salta para 69. Ainda no período entre 1978 e 1987, registra-se o primeiro caso de morte, que antes nem constava nos documentos analisados. Por outro lado, se na primeira década o número de ocorrências chegava a 129, na última década, entre 1998 a 2007, foram 3.837 ocorrências divididas em 31 tipos de impactos.

Para chegar a estes números no período de 50 anos, a geógrafa identificou, primeiramente, os dias de chuvas extremas por meio de método estatístico. Na sequência, Marina fez um levantamento dos impactos causados pela chuva, tomando como base os dados disponíveis na Defesa Civil do município e as notícias dos jornais da cidade. Ela dimensionou um total de 1.658 dias em que ocorreu algum tipo de evento. O levantamento de dados permitiu a produção de mapeamentos dos principais impactos e a divisão das regiões de acordo com as características socioeconômicas de determinadas áreas, denominadas UTBs (Unidades Territoriais Básicas).

Nos 50 anos analisados, os períodos de primavera-verão concentraram o maior número de episódios de chuvas extremas. O semestre foi responsável por 60,4% dos episódios. Na primavera foram registrados 493 eventos e, no verão, 510. Outono e inverno tiveram bem menos episódios – 370 e 285, respectivamente – mas, ainda assim, com números significativos. Um destaque é para os anos de 1970 e 1983, períodos em que ocorreu maior quantidade de episódios excepcionais.

Outro detalhe é o aumento dos tipos de ocorrências ao longo dos anos. Nas duas primeiras décadas foram 16 diferentes tipos de eventos, aumentando para 25 na terceira e 31 nas duas últimas. “O crescimento populacional acontece de maneira gradual, enquanto as ocorrências aumentam abruptamente da terceira para a quarta década”, analisa. Isto pode ser explicado, uma vez que a pesquisa das primeiras décadas teve como fonte exclusiva as notícias de jornais e, por isso, o descompasso entre o crescimento populacional e de ocorrências pode ter sido ocasionado pelo fato de os jornais, naquela época, priorizarem as notícias sobre o carnaval em fevereiro e as eleições em outubro. Ou seja, em determinadas épocas do ano as notícias de chuvas não ganhavam destaque na mídia.

Pelo levantamento realizado por Marina Castellano é possível observar a necessidade de um planejamento urbano que tenha como ponto-chave não só a proibição das ocupações de áreas de risco, mas também a fiscalização por parte do poder público. Isto porque, muitas vezes, a reocupação destes locais acontece com grande rapidez e, por isso, demandaria uma postura mais ativa das autoridades. Por outro lado, Marina não descarta o papel da população, que carece de uma educação ambiental sobre temas que vão desde a limpeza urbana, principalmente com referência ao lixo acumulado em bueiros, até a necessidade de conhecer os riscos e evitá-los.

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Publicação
Dissertação: “Inundações em Campinas (SP) entre 1958 e 2007: tendências socioespaciais e as ações do poder público”
Autor: Marina Sória Castellano
Orientador: Luci Hidalgo Nunes
Unidade: Instituto de Geociências (IG)
Financiamento: Capes e Fapesp

Reportagem de Raquel do Carmo Santos, no Jornal da Unicamp Nº 485

EcoDebate, 11/03/2011

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