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Subfinanciamento do SUS influi no crescimento dos planos de saúde

Embora o país tenha uma política pública de saúde universal destinada a toda população, o Sistema Único de Saúde (SUS), o número de usuários de planos de assistência médica com ou sem odontologia no Brasil cresceu três vezes mais que a população brasileira no período de 2000 a 2008 (33,29% contra 10,7%). Esse crescimento está relacionado ao subfinanciamento do SUS e com a renúncia fiscal feita pelo governo federal, que permite que pessoas e empresas abatam no Imposto de Renda os gastos com saúde privada.

Essa é uma das conclusões a qual chegou um estudo realizado no Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (CPqAM/Fiocruz Pernambuco) pela assistente social Débora Maltez, em seu mestrado em saúde pública, sob orientação do pesquisador Garibalde Gurgel.

Para ela, esse quadro revela a opção do governo pela assistência à saúde privada em desfavorecimento da assistência pública universal. “Essas questões estão relacionadas, mas não há casualidade entre elas. Essas são peças de um quebra cabeça que mostra opção pelo privado. Nunca houve prioridade ao SUS”, adverte Débora. Em 2008, 21,1% da população brasileira estava ligada a um plano de assistência médica, segundo dado da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Na pesquisa foi observado o crescimento do número de usuários de sete modalidades de planos de saúde no período de 2000 a 2008: medicina de grupo, cooperativa médica, odontologia de grupo, seguradoras especializadas em saúde, autogestão, cooperativa odontológica e filantropia. Dentre essas, a pesquisadora destacou que as cooperativas médicas cresceram 78,66%, enquanto as empresas de medicina de grupo e as seguradoras especializadas em saúde tiveram, respectivamente, 29,03% e 7,52% de crescimento. Já as autogestões tiveram crescimento negativo (0,94%) no quantitativo de usuários. No referente à receita/despesa, o setor de planos de saúde apresentou, no período de 2001 a 2008, um crescimento de receita menor que o crescimento da despesa total. Já as seguradoras especializadas em saúde, odontologia de grupo e cooperativas odontológicas constituíram-se exceções, pois o crescimento de suas receitas foi maior que o de suas despesas.

O financiamento da saúde pública também sofreu um incremento de 2000 a 2006, de acordo com o estudo, “porém esse aumento está aquém do necessário, apesar do SUS ser uma proposta universal”. A pesquisadora acredita que tal fato está relacionado com a aprovação da Emenda Constitucional 29, que estabeleceu o repasse de recursos das três esferas de governo (municípios, estados e União), possibilitando maior estabilidade ao financiamento.

Em 2006, o valor total dos repasses representou menos de 4% do Produto Interno Bruto (PIB). No mesmo ano, os gastos públicos do Brasil em saúde representaram 45,3%, contra 69,9% do Canadá, que também tem um sistema público universal. “Os nossos gastos públicos são semelhantes aos dos Estados Unidos (44,6%), onde a política de saúde tem caráter liberal”, completa Débora, que é fiscal da ANS.

Na pesquisa, além da análise de dados documentais e coleta em bases de dados oficiais, foram entrevistados representantes do governo, das instituições operadoras de planos de saúde, dos consumidores, dos prestadores de serviços, do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e dois pesquisadores da saúde pública. Alguns relacionaram ao financiamento do SUS outras questões, como o acesso, a gestão e a qualidade da assistência prestada.

Renúncia fiscal

Sobre a renúncia fiscal, dados da Receita Federal mostram que, de 1988 a 2003, os gastos declarados como despesas de saúde por pessoas físicas e jurídicas aumentaram 127,25% e 36,29%, respectivamente. Para muitos entrevistados, entre eles o representante da ANS, esses benefícios são incentivos governamentais ao mercado de planos de saúde e promovem a iniquidade por tirar recursos da coletividade e destinar a setores com melhores condições na sociedade. Os benefícios também favorecem à classe média.

Para os representantes de planos de saúde, a renúncia demonstra a incapacidade de o governo oferecer serviço de saúde satisfatório à população e desonera o SUS, já que segmentos populacionais são atendidos pelos serviços privados e não pelo sistema. Há também aqueles, como a Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), que acreditam que a renúncia favoreça à equidade uma vez que as pessoas que têm necessidades diferenciadas podem ser tratadas de tal forma.

A extinção da renúncia fiscal para alguns atores traria consequências negativas para o mercado por forçar a migração dos usuários para o SUS. Outros, no entanto, acreditam que não haveria abalos significativos para o setor de planos de saúde. Estudos internacionais observaram que o fim dos benefícios tributários relacionados às despesas com saúde, feitas por famílias e empresas, não gerou diminuição proporcional da demanda por serviços privados de saúde. No caso brasileiro, o estudo aponta que a extinção da renúncia fiscal poderia favorecer às operadoras líderes, que têm maior porte econômico e são capazes de suportar melhor esse impacto.

Reportagem de Fabíola Tavares, da Agência Fiocruz de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 01/02/2011


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