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Premiê húngaro diz que vazamento de lama tóxica é um ‘desastre sem precedentes’

Vazamento inundou casas com lama tóxica e revirou carros na cidade de Devecser, uma das mais atingidas. Foto de: Sandor H. Szabo/Associated Press/Folha.com
Vazamento inundou casas com lama tóxica e revirou carros na cidade de Devecser, uma das mais atingidas. Foto de: Sandor H. Szabo/Associated Press/Folha.com

Em visita à região atingida pela lama vermelha que vazou de uma refinaria na segunda-feira, o premiê Viktor Orban descreveu o incidente como um desastre sem precedentes na Hungria. “Se tivesse acontecido à noite, todos teriam morrido”, disse ele à agência de notícias estatal MTI. “Isso é tão irresponsável que é impossível encontrar palavras.”

Um depósito de uma refinaria em Ajka (160 km a oeste de Budapeste) se rompeu por razões ainda desconhecidas, e cerca de 700 mil metros cúbicos de resíduos tóxicos foram espalhados pela região de Kolontar e outras duas vilas, deixando quatro mortos e cerca de 150 feridos. Reportagem da Associated Press.

O vazamento ainda carregou carros nas ruas, danificou casas e pontes, e levou cerca de 400 moradores a deixarem a região. O governo decretou estado de emergência em três Departamentos (Estados) –Veszprém, Gyor-Moson-Sopron e Vas.

Com a chuva dando lugar a um tempo seco e mais quente nos últimos dois dias, a lama vermelha começa a se transformar em poeira, que voa com o vento e pode causar problemas respiratórios, alertou o ministro de Ambiente da Hungria, Zoltan Illes.

A lama de cor avermelhada tem “uma alta concentração de metais pesados”, alguns dos quais podem causar câncer, disse Illes. “Se aquilo secar, o vento pode soprar…a contaminação de metais pesados [aconteceria] pelo sistema respiratório”, disse ele.

Ele também alertou para possíveis tragédias ambientais, particularmente se esses metais penetrarem no sistema de lençóis freáticos.

Os efeitos de longo prazo para a região agrícola também são devastadores. Cerca de 800 hectares de solo superficial terá de ser removido e substituído, porque a lama altamente alcalina destruiu todos os nutrientes e organismos necessários para manter o solo fértil, segundo o ministro do Ambiente.

Por outro lado, a Academia Húngara de Ciências manteve que o material continua perigoso, mas que sua concentração de metais pesados não é considerada perigosa para o ambiente.

“A academia pode dizer o que quiser”, discordou Barbara Szalai Szita, que vive em Devecser, uma das vilas mais atingidas. “Tudo o que sei é que se passo 30 minutos lá fora, fico com um gosto estranho na boca e sinto minha língua estranha.”

DANÚBIO E AFLUENTES

Em meio a informações desencontradas, pelo menos uma notícia animadora: o importante rio Danúbio, segundo maior da Europa, parece estar absorvendo a lama vermelha com pouco estrago, além de alguns poucos peixes mortos aqui e ali. A União Europeia e autoridades ambientais temem uma catástrofe ambiental afetando meia dúzia de países se a lama vermelha contaminar o Danúbio.

A esperança é que, com seu grande volume de água, o Danúbio consiga reduzir o impacto do vazamento. Equipes trabalhavam para reduzir a alcalinidade do vazamento, colocando centenas de toneladas de gesso e ácido acético (vinagre).

A lama vermelha chegou aos afluentes no oeste do Danúbio no começo desta quinta-feira, e fluiu até seu leito principal por volta do meio-dia local. Até a noite, seguia para o sul em direção à Sérvia e à Romênia.

Depois do local do acidente, o Danúbio passa dentro ou pelas margens do território da Croácia, Sérvia, Bulgária, Romênia, Moldova e Ucrânia, a caminho do Mar Negro. Em estações de monitoramento na Croácia, Sérvia e Romênia, autoridades retiravam amostras do rio de hora em hora para verificar a qualidade da água.

Já os afluentes do Danúbio na área do vazamento não tiveram tanta sorte. O rio Marcal, tingido de ocre e já sem peixes ou qualquer outro tipo de vida aquática, foi declarado uma área morta.

“A vida no rio Marcal foi extinta”, disse Tibor Dobson, porta-voz das equipes de emergência. “O esforço central agora está sendo concentrado no Raba e no Danúbio. É isso que resta a ser salvo.”

PH

Dobson disse que pH da lama vermelha chegando ao Danúbio foi reduzido ao ponto em que é improvável que cause mais estragos ambientais. Anteriormente, o pH tinha sido de 13, e agora estaria abaixo de 10, e nenhum peixe morto foi encontrado na área onde o material adentrou o Danúbio, disse ele.

O pH da substância ao chegar aos rios Raba, Mosoni-Danúbio e Danúbio estava ao redor de 9.

Dados recentes do órgão responsável pelas águas, informados pela agência de notícias MTI, mostrava os níveis de pH chegando a um máximo de 9,65 no rio Mosoni-Danúbio na cidade de Gyor. Eles foram medidos em 8,4 no Danúbio.

O pH neutro para a água é de 7, com leituras normais variando de 6,5 a 8,5 –sendo cada vez mais ácido em direção ao 0, e mais alcalino em direção ao 14. Cada valor de pH é dez vezes o valor anterior, então um pH de 13 é 1.000 vezes mais alcalino que um pH de 10.

ALERTA VERMELHO

A região do Danúbio é cercada por fábricas e refinarias remanescentes do período comunista, algumas já desativadas, mas outras ainda em operação –e com suas instalações ficando cada vez mais velhas e sujeitas a acidentes.

O reservatório de onde vazou a lama tóxica na Hungria esta semana já tinha aparecido em uma lista, em 2006, de 150 pontos industriais sob risco de acidentes que pudessem contaminar o rio Danúbio, segundo um grupo ambientalista citado pelo jornal “New York Times”.

O grupo Comissão Internacional para a Proteção do Rio Danúbio coordena atividades de conservação entre os 14 países por onde passa o Danúbio –segundo maior rio da Europa– ou seus afluentes.

“Países e empresas vêm tentando progressivamente lidar com esse problema, mas, claramente, quaisquer ações que tenham sido tomadas aqui não foram o suficiente”, disse ao “NYT” Philip Weller, secretário-executivo da comissão, com sede em Viena. “Isso reitera pra nós a necessidade de adotar medidas preventivas.”

LAMA TÓXICA

A lama vermelha é um resíduo do processo de transformação da bauxita em alumina, matéria-prima para a fabricação do alumínio. A produção de uma tonelada de alumínio gera quase três toneladas de lama vermelha.

“A substância espessa e altamente alcalina tem um efeito cáustico na pele. A lama contém metais pesados, como chumbo, e é levemente radioativa. Inalar sua poeira pode causa câncer de pulmão”, informa a Unidade de Desastres Naturais da Hungria em seu site. A unidade recomendou às pessoas limpar a lama com água para neutralizar a substância.

Representantes de organizações industriais em Londres e nos EUA não souberam explicar como as vítimas na Hungria foram queimadas com o material, alegando que, se apropriadamente armazenado, ele não é perigoso.

É comum estocar o resíduo em tanques onde a água, aos poucos, evapora, deixando para trás um resíduo vermelho como terra, disseram autoridades. Porém, o ambientalista húngaro Gergely Simon disse que o resíduo envolvido no desastre estava se acumulando no reservatório por décadas e estava extremamente alcalino, com um pH em torno de 13 –quase o mesmo que a soda cáustica– e isso causou as queimaduras.

Como queimaduras químicas podem levar dias para aparecer, ferimentos aparentemente superficiais podem vir a ser letais conforme penetram em tecidos mais profundos da pele, explicou o médico Peter Jakabor, do hospital Gyor, à TV estatal.

A empresa MAL Rt, dona da refinaria de Ajka, disse que a lama vermelha não é considerada um resíduo perigoso segundo os padrões da União Europeia. A empresa também negou que deveria ter sido mais cautelosa com o reservatório.

EXTENSÃO DO ESTRAGO

Especialistas afirmam que grandes danos para além das fronteiras da Hungria são improváveis, mas que a ameaça deve ser monitorada de perto.

“Está claro que as consequências disso são maiores na área local, e que as implicações no nível aléms das fronteiras, pelo que entendemos, não serão signficativas –o que não significa que não existam”, disse Philip Weller, secretário-executivo da Comissão Internacional para a Proteção do Rio Danúbio.

“Com base em nossas estimativas atuais, a poluição vai ficar contida na Hungria, e também confiamos que vá chegar a Budapeste com valores de pH aceitáveis”, disse Gabor Figeczky, diretora do grupo ambientalista WWF na Hungria.

Reportagem da Associated Press, na Folha.com.

EcoDebate, 08/10/2010

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