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A represa de Três Gargantas é hoje mais criticada do que nunca

Represa de Três Gargantas, em foto da Agência Chine Informations
Represa de Três Gargantas, em foto da Agência Chine Informations

Posicionadas a intervalos regulares nas margens do reservatório da represa de Três Gargantas, as demarcações indicam em vermelho o nível máximo: 175 metros. Quinze anos após o início dessa obra tão criticada, elas ainda não foram submersas. Motivo: uma estiagem rio abaixo.

Neste ano, o nível de água subiu 30 metros desde setembro (as barragens chinesas abrem suas comportas antes do verão, quando as chuvas são abundantes), mas desde meados de novembro o nível se mantém entre 170 e 172 metros. Na verdade foi necessário abrir as comportas, pois quase 2,5 milhões de pessoas foram privadas de água potável neste outono em sete províncias ao sul da região de Chongqing. Reportagem de Brice Pedroletti, no Le Monde.

De forma emergencial, entretanto, no mês passado a secretaria de controle de inundações e secas havia ordenado que as barragens de Três Gargantas situadas rio acima, efetuassem a liberação de água. Para que o reservatório fosse preenchido ao mesmo tempo em que permitisse vazão suficiente rio abaixo. “No ano passado eles não conseguiram atingir o nível de 175 metros, e também não vão conseguir neste ano”, explica um engenheiro de Chengdu, que milita em uma associação de defesa do meio ambiente. “Os lagos de Dongting e Poyang em direção à foz do Yangtzé, os maiores da China, nunca estiveram tão secos. As autoridades não querem admitir, mas a barragem de Três Gargantas tem um impacto sobre muitas variantes ambientais”, diz.

A obra, que retém a água por 660 km, amplifica os efeitos do aquecimento climático que já reduziu a vazão do Yangtzé. “Tudo indica que a retenção de água também tem um impacto que se volta para o próprio clima, pois os fenômenos climáticos extremos estão se multiplicando localmente”, continua.

As consequências ambientais da represa de Três Gargantas preocupam os ecologistas chineses. A maioria era contra sua construção. Mas se viram divididos e tiveram suas ações entravadas pela falta de estudos independentes e objetivos, pelo grande número de disciplinas envolvidas e pela reticência do governo e do lobby da energia elétrica em tolerar debates. Alguns, como os geólogos Fan Xiao e Yang Yong, ambos instalados em Chengdu, denunciam os riscos de instabilidade geológica: à medida que a água sobe, ela se infiltra, amolece a estrutura dos solos, favorece os deslizamentos de terra. A hipótese do meio científico de que o terremoto de Sichuan, em maio de 2008, foi provocado pelo esvaziamento da represa de Zipingpu, reforçou seus temores.

Outros chamam a atenção para os riscos de poluição. “Manter a qualidade da água do reservatório é um grande problema”, explica Wu Dengming, fundador da ONG Green Volunteer League.

Esse veterano da luta ecológica briga pela promulgação de uma lei que permitiria às ONGs prestarem queixa em nome do interesse geral quando os lagos e rios estivessem em perigo. Esse ex-policial e membro do Partido, desde o início contra a represa de Três Gargantas, usa de suas conexões para travar uma guerra contra os poluidores.

O governo de Chongqing, municipalidade de 32 milhões de habitantes (dos quais 70% são camponeses) que inclui o local da represa, garante que tem consciência do desafio: quarenta novas estações de tratamento devem ser construídas até 2015. Segundo ele, somente dezesseis estão concluídas. Atualmente, um máximo 65% das águas residuais são tratadas.

Contra todas as expectativas, Wu Dengming encontrou uma missão para si: convencer as zonas rurais a se equiparem com estações naturais de depuração por plantas. Com seus conjuntos habitacionais decadentes, seus terrenos escalvados até o último centímetro, Wangjia, no distrito de Yubei, no nordeste de Chongqing, é uma dessas comunidades “rurais” de infraestrutura deteriorada como tantas outras na China. Seus 15 mil habitantes produzem 800 toneladas de águas residuais por dia, não tratadas, que desembocam no Yangtzé, a 5 quilômetros. Wu Dengming instalou ali um local de tratamento biológico, em funcionamento há seis meses, com um membro de sua associação, Duan Qianglong, diretor de uma pequena empresa de engenharia ambiental, a Chongqing Luhe. Originalmente, o militante havia sido contatado pelos habitantes, furiosos com as autoridades do distrito pois o lago da cidade estava poluído demais.

As águas usadas, uma vez decantadas, transitam por culturas de plantas que se alimentam da poluição, como o pinheiro-d’água ou as canáceas. Elas são naturalmente tratadas no fim de 24 horas desse circuito. Essa técnica de depuração natural, praticada em outras partes do mundo, é muito bem adaptada às cidades rurais chinesas que não têm muitos recursos: “Não gasta energia, é bom para o clima, e custa 3 maos (0,3 centavos de euro) por tonelada de água a ser tratada”, diz, contra “27 centavos por uma estação tradicional”.

O investimento é avaliado em 1 milhão de yuans (R$ 249 mil). As autoridades do distrito aceitaram a aposta: outras doze estações desse tipo já foram estabelecidas em Yubei. E vinte outras estão em projeto em outros distritos de Chongqing. “O que queremos é promover essa tecnologia por todo o Yangtzé”, declara We Dengming. “Há 200 comunidades como Wangjia na municipalidade de Chongqing, o que chega a quase 5 milhões de pessoas”.

Tradução: Lana Lim

Reportagem [Le barrage des Trois-Gorges plus décrié que jamais] do Le Monde, no UOL Notícias.

EcoDebate, 06/01/2010

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